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Porque é que o Estado deixa construir para depois demolir?

Manuel Luamba
2 de maio de 2022

As demolições voltaram à capital angolana, com a construção do novo aeroporto. O Estado revela incompetência e falta de capacidade de fiscalização ao demolir casas de cidadãos depois de construídas, dizem analistas.

Demolições no Zango 3, nos arredores de Luanda (foto de arquivo)
Demolições no Zango 3, nos arredores de Luanda (foto de arquivo)Foto: DW/A. Cascais

As demolições em Angola tinham registado um interregno por algum tempo, mas estão de volta com mais residências destruídas nos arredores do novo Aeroporto Internacional de Luanda.

O martelo demolidor estendeu-se aos bairros do quilómetro 33 a 38, em Luanda, onde centenas de famílias viram as suas casas demolidas no final da semana passada.

"A intenção era levar-nos até ao Kaculo Kahango onde há casas para nos dar em troca dos nossos terrenos que muitos generais estão a receber. Chegando ao local, aí no Bom Jesus, deram-nos um terreno de 5/5 e três folhas de chapa", conta João Domingos, uma das vítimas.

Falta competência e fiscalização

Em Angola, questiona-se por que motivo o Estado deixa construir para depois demolir?

"Penso que aqui estamos diante da falta de competência e falta de fiscalização e, acima de tudo, falta de ação por parte do Estado - aqui Estado entenda-se Governo na sua qualidade ou no seu poder administrativo", responde o  jurista angolano Agostinho Canando.

João Malavindele, da ONG Omunga, com sede em Benguela - província que também tem registado demolições - vai mais longe e acusa os os agentes da fiscalização de deixar construir porque são, muitas vezes, corrompidos pelos próprios cidadãos. 

João Malavindele: "O grande problema são os mecanismos de controlo e fiscalização"Foto: G. Correia da Silva/DW

"O grande problema são os mecanismos de controlo e fiscalização que não são eficazes, e facilmente os ditos fiscais se deixam corromper. E muitas vezes com o consentimento de altos funcionários da administração pública", diz.

A Constituição angolana prevê uma justa e pronta indeminização em casos de expropriação por utilidade pública, lembra o jurista Agostinho Canando. Mas nem isso é cumprido pelo Estado, acrescenta.

"É uma situação que deve ser revista. Situação esta que deve ser analisada por todos os atores sociais e de direito, no sentido de caminharmos o nosso país a bom porto e não para a masmorra que muita gente quer que ele se encontre", defende.

Entendimento é possível

Porém, há situações em que as vítimas e os representantes do Estado conseguem chegar a um entendimento. É o caso dos desalojados das Salinas em Benguela, que receberam terrenos e, neste momento, decorre o processo de loteamento segundo Malavindele. Mas há um senão, acrescenta o ativista da Omunga.

"Nós somos a favor da autoconstrução e o Estado também não pode dar tudo, mas na condição de que, por exemplo, as casas foram demolidas, eu acho que o Estado devia dar maior dignidade a essas pessoas se mesmo entregar as chaves e quando falo de chaves são chaves de casa para morar", explica.

Quando há demolições de residências, o Governo sempre alegou dois motivos: construção em zonas de risco e ocupação ilegal das reservas fundiárias do Estado por parte dos cidadãos. Mas mesmo apresentando toda a documentação, a justa e pronta indemnização não é feita, na maioria das vezes.

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