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HistóriaAlemanha

Porque lutam ainda os africanos por causa das fronteiras?

Cai Nebe
6 de março de 2024

Os últimos administradores coloniais alemães deixaram África há mais de 100 anos. Mas as fronteiras africanas desenhadas em Berlim no final do século XIX continuam intactas até hoje - e tiveram consequências drásticas.

Sombras do Colonialismo Alemão | Episódio 10
Foto: Comic Republic

Por que motivo a Faixa de Caprivi é um símbolo da cartografia da era colonial?

É um dos territórios mais estranhos do mapa e faz parte da Namíbia. Parece um cabo de frigideira, tem linhas retas paralelas separadas por 30 km e atravessa savanas e sistemas fluviais. O maior é o Rio Zambeze. Foi criado por diplomatas estrangeiros desesperados em ganhar territórios para os seus países sem causar conflitos com os vizinhos europeus concorrentes. Muito poucos visitaram o território que estavam a dividir, mas queriam evitar que outras potências coloniais formassem eixos terrestres contínuos no sentido Este-Oeste ou Norte-Sul.

Como foi formada a Faixa de Caprivi?

Após a Conferência de Berlim, em 1884, o Sudoeste Africano ocupado pela Alemanha foi isolado da África Oriental ocupada pela Alemanha. A separá-los estavam os protetorados da Bechuana, do Botsuana, da Rodésia do Norte e da Rodésia do Sul (hoje Zâmbia e Zimbabué). Assim, em 1890, o chanceler alemão Leo von Caprivi negociou com os britânicos por uma faixa de terra que permitisse aos alemães o acesso, através do Sudoeste de África, ao Rio Zambeze, que a Alemanha sabia que desaguava na África Oriental.

Foi na Conferência de Berlim, em 1884, que as potências europeias dividiram o continente africano entre si, traçando fronteiras consoante os seus interessesFoto: picture-alliance/akg-images

Para esta potencial rota alemã, a Alemanha aceitou reconhecer a influência britânica sobre Zanzibar e Pemba, perto da costa oriental ocupada pela Alemanha, e a Alemanha ficaria com uma pequena base naval de Heligoland no Mar do Norte, na costa alemã. Ficou conhecido como o Tratado Heligoland-Zanzibar, de 1890, entre a Grã-Bretanha e a Alemanha.

Qual era o problema? 

A Alemanha tinha agora o quarto maior império colonial. Mas apenas 40 km a leste de onde a Faixa de Caprivi terminava, erguia-se o poderoso Mosi-oa-Tunya, mais conhecido como Cataratas Vitória.

Leo von Caprivi, chanceler do Império Alemão de 1890-1894Foto: picture alliance/akg

Esta magnífica maravilha natural tornou o Zambeze inavegável e o plano alemão foi por água abaixo.

Quais foram as consequências desta estranha geografia?

Mais de uma dúzia de grupos étnicos, que falavam mais de doze línguas, de repente encontraram-se em quatro territórios coloniais diferentes.

Embora a Faixa de Caprivi se tenha mantido relativamente em paz durante o colonialismo, principalmente porque a Alemanha tinha interesse limitado na área, isso viria a mudar quando a Alemanha perdeu as suas colónias em 1919, com o Tratado de Versalhes. A Namíbia, no Sudeste Africano, tornou-se um mandato da África do Sul, com vista à sua futura independência. Mas isso nunca aconteceu. Em vez disso, a África do Sul introduziou as suas políticas de apartheid e fez dos governantes de Caprivi um regime fantoche.

Cataratas VitóriaFoto: Reuters/Staff

A partir da década de 1960, a localização geopolítica da Faixa de Caprivi significou que era um foco de guerra e incursões entre as forças militares sul-africanas e combatentes da libertação que faziam ataques transfronteiriços relacionados à guerra civil em Angola, à guerra das fronteiras e à guerra na Rodésia.

Eram três conflitos distintos, que pouco tinham a ver com as pessoas que lá viviam, e tudo a ver com as potências estrangeiras que tentavam afirmar o seu domínio na região. As armas só se calaram nos finais dos anos 1990, depois de uma breve tentativa dos caprivinos locais de se separarem da recém-independente Namíbia em 1997 ter falhado.

Que outros conflitos fronteiriços da era colonial ainda existem nas ex-colónias alemãs?

Nos Camarões, o conflito Bakassi eclodiu nos anos 2000 entre a Nigéria e os Camarões por causa da península de Bakassi. Aqui, os nigerianos viveram durante gerações em terras reivindicadas pelos Camarões com base em acordos do tempo colonial. Ainda ocorrem confrontos esporádicos, apesar de uma decisão do Tribunal Internacional de Justiça a favor dos Camarões.

Uma família que reside perto da aldeia Lizauli, Faixa de CapriviFoto: picture-alliance/dpa/T. Schulze

O Togo, que faz fronteira com o atual Gana, também foi dividido entre a França e a Grã- Bretanha em 1919, depois da Alemanha perder todas as suas colónias, ao longo de uma fronteira artificial. Isso foi rejeitado pelo povo local Ewe, que agora se encontra em dois países separados. A "Togolândia Britânica" ou Togolândia Ocidental depois foi incorporada no Gana, em 1956, após uma votação. Porém, as regiões maioritariamente Ewe votaram a favor da permanência de um mandato da ONU. Até hoje, alguns grupos Ewe defendem a autonomia e o Governo ganês aumentou a pressão sobre os ativistas através de detenções e presença militar na região.

Na Tanzânia, graças ao Tratado Heligoland-Zanzibar de 1890, o mesmo que criou a Faixa de Caprivi, há uma longa disputa com o Malawi pelo controlo do Lago Malawi ou Niassa, como os tanzanianos lhe chamam. Muito basicamente, de acordo com o Tratado, as fronteiras correm ao longo da costa tanzaniana. A Tanzânia argumenta que a fronteira tem de estar em linha com muitas outras fronteiras e acordos relativos ao lago e passar pelo meio. São duas posições inconciliáveis que permaneceram adormecidas, até 2011, quando o Malawi permitiu a exploração de petróleo na áera reivindicada pela Tanzânia.

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