Portugal: O drama dos imigrantes à espera de um visto
5 de novembro de 2023Mais de um milhão de imigrantes já obtiveram visto de residência em Portugal, desde 2022. Só este ano foram concedidos 306 mil vistos desta natureza, segundo fontes oficiais. A estes números juntam-se as 154 mil autorizações atribuídas pelo Governo português depois de ter lançado os vistos CPLP.
Nelsi Gomes, natural de Cabo Verde a residir há nove meses em Portugal, está entre os cidadãos inquietos dos países africanos de língua portuguesa que ainda não conseguiram autorização de residência. Está à espera há mais de três meses.
"Já fiz tudo desde 28 de Julho. Eles me disseram para esperar três meses e que, se o documento não fosse enviado à casa, para eu passar por aqui. Tirei o dia de férias para não perder o dia de trabalho", relata a jovem à DW.
Sem sucesso, a imigrante tentou obter informações sobre o seu processo junto à Agência para a Integração, Migrações e Asilo (AIMA), que começou a funcionar no fim de outubro (30.10), após o encerramento do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF). Viu-se obrigada a faltar ao trabalho e terá de voltar na próxima semana, porque os serviços arrancaram com reduzida capacidade de atendimento.
Serviço demorado
O mesmo destino teve o jovem cabo-verdiano Gil Arnaldo, que veio tentar a renovação da sua autorização de residência permanente, caducada há quatro meses.
Segundo Arnaldo, o prazo limite venceu, mas não por sua culpa. "Até agora não tive uma resposta e então estou a andar sempre neste joguinho. Estão a demorar nesse processo há muito tempo sem eu ter acesso a nenhuma informação", reclama.
No arranque das suas atividades, a AIMA não tinha um site próprio com informação para acesso pelos interessados.
Os imigrantes querem menos burocracia e mais celeridade. É este o desejo do guineense Fernando Indi, estudante de Engenharia Informática, no Instituto Jean Piaget, que quer apenas pagar a renovação do seu cartão de residência.
De acordo com o jovem, os imigrantes guineenses têm "bastante dificuldade aqui, porque a Embaixada [da Guiné-Bissau] demora tanto para nos dar visto".
"No país estrangeiro sem documento é muito difícil. Mas acho que as coisas podem melhorar", tem esperanças Indi.
Descentralização dos serviços
O processo de legalização em Portugal é muito moroso e burocrático, considera Arlindo Ferreira, presidente da Associação Portuguesa para a Integração Social dos Imigrantes (APISI). O advogado não acredita que a AIMA reúna capacidade para atender todos os problemas.
Ele diz acompanhar a situação de vários imigrantes de perto. "As pessoas não se importam de ir para a Madeira, os Açores, Bragança, para tratar da legalização. E então as pessoas têm andado desesperadas", conta.
Arlindo Ferreira, cuja associação presta apoio a vários imigrantes desorientados, diz que mesmo com os vistos CPLP não estão a ser agilizados os procedimentos de legalização, por via da manifestação de interesse. E avisa que "se não houver uma descentralização maior, a situação manter-se-á na mesma".
Se for preciso, o advogado sugere até que sejam dadas competências às autarquias locais para que as juntas de freguesia possam ajudar as pessoas na tramitação dos processos de residência.
AIMA promete melhorias
Luís Goes Pinheiro, presidente da recém-criada Agência para a Integração, Migrações e Asilo (AIMA), promete dar resposta célere às ansiedades dos cidadãos imigrantes.
"Isso é um exemplo da necessidade, nesta fase inicial, de nos ajustarmos a todas as mudanças que ocorreram bem recentemente e criarmos condições para resolver os problemas das pessoas de forma mais célere e eficaz possível. Resolver problemas perante este nível de pressão de procura implica sempre reinventarmos dia a dia e tomarmos muitas vezes decisões de emergência”, afirma.
O novo organismo estatal prevê o prazo de ano e meio para resolver os cerca de 350 mil processos pendentes e 340 mil renovações de vistos de imigrantes a residirem no país. E, para dar resposta às solicitações, o Governo português vai contratar mais funcionários, criar outros dez postos de atendimento e um centro multidisciplinar para acolhimento e integração de refugiados.