Os resultados provisórios das eleições presidenciais no Burundi, que dão a vitória a Evariste Ndayishimiye, o candidato do partido no poder, CNDD-FDD, não convenceram a oposição, que fala em "fraudes" e "golpes".
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Com 68,7% dos votos, Evariste Ndayishimiye, o candidato do partido no poder no Burundi, o Conselho Nacional para a Defesa da Democracia (CNDD-FDD), foi declarado o vencedor das eleições de 20 de maio. Agathon Rwasa, líder do Congresso Nacional para a Liberdade (CNL) foi o segundo dos sete candidatos mais votado e obteve 24,19% dos votos. Os resultados provisórios foram anunciados pela Comissão Eleitoral Nacional Independente, na segunda-feira (25.05).
O porta-voz do Congresso Nacional para a Liberdade, Thérence Manirambona, já afirmou que o seu partido deverá apresentar entre hoje e amanhã um recurso no Tribunal Constitutional, denunciando as "fraudes maciças" que marcaram o ato eleitoral. O Tribunal Constitucional tem depois oito dias para se pronunciar.
À DW, Pancrace Cimpaye, um opositor burundês que se encontra exilado em Bruxelas, fala num "golpe de Estado contra a vontade das pessoas que se mobilizaram atrás da caravana da mudança liderada por Agathon Rwasa. É um golpe de força e não há muitas palavras para o dizer."
Acusações que Albert Shingiro, representante permanente do Burundi nas Nações Unidas, rejeita. "O candidato em questão sempre rejeitou o veredito das urnas desde 2010. Penso que ele vai cair em si porque tudo foi feito com transparência e os resultados foram publicados online em tempo real e em mais de 30 meios de comunicação, incluindo os próximos da oposição", alega.
Grandes desafios
O representante permanente do Burundi nas Nações Unidas mostra-se tranquilo com a chegada ao poder de Evariste Ndayishimiye. "O general Evariste Ndayishimiye é um homem que reúne e une as pessoas. É inclusivo. A sua vitória é a vitória de todo o povo do Burundi, um povo digno, orgulhoso e soberano. Aqueles que se sentem derrotados também serão incluídos na gestão do país", considera.
Um gestão que não se adivinha fácil. Muitos doadores internacionais suspenderam a ajuda ao país após as eleições de 2015, o que conduziu a uma escassez de moeda estrangeira. Os níveis de desemprego e pobreza no país são por isso, neste momento, muito elevados. os desafios para o novo governo são grandes.
"Desde 2015, temos visto como o Burundi tem estado a lutar pela sua economia. Este pode ser um dos principais desafios que o novo governo tem pela frente", afirma o jornalista burundês Moses Havyarimana.
Quem é Evariste Ndayishimiye?
Conhecido pelo seu apelido "Neva", o antigo general do exército Ndayishimiye é secretário do partido governamental CNDD-FDD desde 2016. Antes de se tornar presidente, foi chefe do Departamento de Assuntos Militares sob o comando do ex-presidente Pierre Nkurunziza. Foi também Ministro do Interior de 2006 a 2007.
Evariste Ndayishimiye era um jovem estudante na Universidade do Burundi quando a guerra civil começou, em 1993, e escapou por pouco a um ataque das milícias Tutsi ao campus de Direito que matou dezenas de estudantes. À medida que a guerra avançava, Ndayishimiye, que acabou por se juntar à milícia Hutu, foi subindo gradualmente nas fileiras do CNDD-FDD.
Mais tarde, em 2003, o partido deu-lhe a missão de principal negociador nas conversações de cessar-fogo que puseram fim ao conflito em 2006.
Tomada de posse em agosto
Os eleitores do Burundi foram às urnas a 20 de maio para eleger o seu Presidente, deputados e presidentes de câmara, num ato eleitoral que contou com uma participação de 87,7% dos 5,11 milhões de eleitores recenseados. Os resultados anunciados esta segunda-feira dão a Evariste Ndayishimiye uma maioria absoluta e evitam uma segunda volta.
O sucessor de Pierre Nkurunziza, no poder desde 2005, deverá tomar posse em agosto para um mandato de sete anos, caso o Tribunal Constitucional confirme estes resultados a 4 de junho.
Burundi: Cronologia de uma longa crise
Os burundeses vão esta quinta-feira às urnas para um referendo contestado, que poderá permitir que o Presidente Nkurunziza fique no poder até 2034. Uma pretensão que resultou numa crise política que já dura há três anos.
Foto: picture-alliance/D. Kurokawa
Clima tenso na véspera do referendo
A 17 de maio de 2018, os burundeses vão às urnas para decidir se o Presidente Pierre Nkurunziza poderá permanecer no cargo até 2034. O clima no país é tenso. Em 2015, houve protestos quando Nkurunziza anunciou que iria concorrer a mais um mandato. Segundo a ONU, pelo menos 1.200 pessoas morreram durante os distúrbios.
Foto: picture-alliance/D. Kurokawa
Mais um mandato para Nkurunziza?
Em abril de 2015, o Presidente Pierre Nkurunziza ocupava o cargo há apenas alguns meses. A lei do Burundi estipula que um Presidente pode exercer funções durante dois mandatos, o que significa que Nkurunziza teria de deixar o poder. O chefe de Estado, no entanto, anunciou que iria voltar a concorrer.
Foto: Getty Images/AFP/F.Guillot
Violência antes das eleições de 2015
Em resposta, as ruas de Bujumbura encheram-se de protestos. Em maio de 2015, as manifestações transformaram-se em crise política. Uma tentativa de golpe militar foi rapidamente anulada. A polícia e as forças de segurança reprimiram os manifestantes e, em resposta, opositores ao governo atacaram as autoridades. Surgiram relatos de brutalidade e tortura por parte de vários detidos.
Foto: Reuters/T. Mukoya
Presidenciais controversas
Os burundeses foram às urnas a 21 de julho de 2015. Poucos dias depois, Pierre Nkurunziza foi declarado vencedor. Os resultados foram os esperados, já que a oposição boicotou a votação. Agathon Rwasa, líder da oposição, inicialmente recusou-se a aceitar os resultados. Porém, pouco tempo depois, pediu um governo de unidade nacional, para desilusão de outros críticos do governo.
Foto: DW/K. Tiassou
Críticos do governo sob ameaça
Nos meses seguintes, foram recorrentes as ameaças de morte e tentativas de assassinato de membros da oposição, críticos, mas também funcionários do governo. O chefe de segurança de Nkurunziza, Adolphe Nshimirimana, e o ativista de direitos humanos Pierre-Claver Mbonimpa (na foto) foram dois dos casos. Mbonimpa sobreviveu após ser baleado pelo menos quatro vezes, mas perdeu o filho e o genro.
Foto: DW/D. Kiramvu
Situação agudiza-se
A 11 de dezembro de 2015, opositores atacaram quatro bases militares em Bujumbura. Um dia depois, as tropas do exército invadiram redutos de opositores na capital. Mais de 100 pessoas terão morrido durante os confrontos. Moradores falam em dezenas de mortes. A União Africana ofereceu-se para enviar tropas de paz para o país, mas Nkurunziza recusou qualquer intervenção.
Foto: Reuters/J.P. Aime Harerimana
Fugir à crise
"Não podemos ignorar uma crise desta dimensão", declarou em finais de 2015 Adama Dieng, o conselheiro especial das Nações Unidas para a prevenção do genocídio. Nessa altura, a crise humanitária atingia níveis alarmantes. Atualmente, quase 400 mil refugiados do Burundi vivem ainda fora do país.
Foto: DW/M. El Dorado
Conversações falham
Em janeiro de 2016, a União Africana tentou mediar as conversações entre o governo e a oposição. No entanto, a conferência em Arusha, na vizinha Tanzânia, foi adiada repetidas vezes. Quando as negociações começaram em maio, uma grande coaligação de oposição, a CNARED, foi excluída e as negociações foram consideradas uma farsa desde o início.
Foto: DW/C. Ngereza
Uma paz frágil
Com o passar do tempo, a vida voltou à normalidade nas ruas de Bujumbura, mas as queixas políticas continuaram a ser as mesmas. Em setembro de 2016, investigadores da ONU anunciaram provas de graves violações dos direitos humanos, incluindo tortura e assassinatos por parte de membros do Estado. Os investigadores também alertaram para a crescente tensão étnica.
Foto: Getty Images/AFP
Reformas constitucionais
Entretanto, o governo de Nkurunziza planeava mudancas constitucionais. Em agosto de 2016, uma comissão governamental propôs mudanças na Constituição para eliminar os limites do mandato presidencial. O próprio Pierre Nkurunziza deu a entender que estava a considerar concorrer a um quarto mandato em 2020.
Foto: DW/A. Niragira
Milícia aterroriza população
No início de 2017, a situação política continuava tensa. A ala juvenil da milícia pró-governamental Imbonerakure continuou a espalhar o medo entre o povo. Apesar da pressão internacional e das sanções da União Europeia, a postura de Nkurunziza continuou inalterada.
Foto: Getty Images/AFP/C. de Souza
Um caso para o TPI?
Em novembro de 2017, o Tribunal Penal Internacional (TPI), em Haia, Holanda, iniciou uma investigação sobre supostos crimes contra a humanidade no Burundi. O governo foi acusado de perpetrar um ataque generalizado e sistemático contra civis. Um mês antes, o Burundi foi o primeiro país africano a retirar-se do TPI e do Estatuto de Roma.
Foto: picture-alliance/AP Photo/J. Delay
Massacre antes do referendo
A 11 de maio de 2018, homens armados desconhecidos atacaram residentes na província de Cibitoke. Pelo menos 26 pessoas morreram. O governo acusou "terroristas" da vizinha República Democrática do Congo pelo ataque. O incidente ocorreu poucos dias antes do referendo constitucional de 17 de maio, que poderá permitir que Nkurunziza continue no cargo até 2034.