Tanzânia: Samia Hassan toma posse após eleições violentas
3 de novembro de 2025
Samia Suluhu Hassan foi hoje (03.11) empossada como Presidente da Tanzânia, após vencer as controversas eleições de 29 de outubro, marcadas por repressão e violência.
A cerimónia, realizada na base militar de Chamwino, em Dodoma, decorreu sem acesso ao público e contou com a presença de dezenas de membros do Partido da Revolução (CCM), representantes diplomáticos e vários chefes de Estado africanos, entre eles os presidentes Daniel Chapo (Moçambique), Évariste Ndayishimiye (Burundi), Hakainde Hichilema (Zâmbia) e Hassan Sheikh Mohamud (Somália), bem como o vice-presidente do Quénia, Kithure Kindiki.
Durante o evento, Hassan prestou juramento:
"Eu, Samia Suluhu Hassan, juro que cumprirei as minhas funções de Presidente da República (...) com diligência e um coração sincero."
A chefe de Estado passou em revista as tropas e assumiu oficialmente um novo mandato de cinco anos, depois de a Comissão Eleitoral Nacional Independente (INEC) a ter declarado vencedora com 97,66% dos votos, numa eleição em que os dois principais rivais foram excluídos.
Violência eleitoral e bloqueio da internet
As eleições foram acompanhadas por uma vaga de protestos violentos em várias cidades do país, incluindo Dar es Salaam, Arusha e Mbeya. A oposição e organizações de direitos humanos relatam centenas de mortes provocadas pela repressão policial.
O partido opositor Chadema denunciou que pelo menos 700 manifestantes foram mortos em três dias, número que subiu para 800 no sábado, segundo o porta-voz John Kitoka. Já fontes hospitalares citadas pela agência EFE confirmaram pelo menos 150 mortos. A imprensa internacional não conseguiu verificar de forma independente esses números.
Desde quarta-feira, dia da votação, o acesso à internet permanece bloqueado, dificultando a comunicação e a circulação de informações. O Chadema classificou as eleições como uma "farsa”, alegando que "não foram realizadas eleições legítimas na Tanzânia".
Reações internacionais
A comunidade internacional manifestou forte preocupação com a situação.
Na sexta-feira, o secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, pediu uma "investigação minuciosa e imparcial sobre o uso excessivo da força" e apelou à moderação de todas as partes. No mesmo dia, os ministros dos Negócios Estrangeiros do Reino Unido, Canadá e Noruega divulgaram uma declaração conjunta pedindo contenção às autoridades tanzanianas.
A União Africana (UA) felicitou Hassan pela reeleição, mas lamentou "profundamente as vidas perdidas". A União Europeia (UE) considerou "confiáveis" os relatos sobre o elevado número de mortes e denunciou a repressão das forças de segurança. O Papa Leão XIV também se pronunciou, dizendo rezar "pela Tanzânia” e pelas "numerosas vítimas” dos confrontos.
Governo nega repressão
As autoridades tanzanianas rejeitaram as denúncias de violência. O ministro dos Negócios Estrangeiros, Mahmoud Thabit Kombo, afirmou:
"Não houve qualquer uso excessivo da força. Não vimos esses 700 mortos de que falam."
Por sua vez, a Amnistia Internacional denunciou uma "onda de terror", marcada por desaparecimentos forçados, detenções arbitrárias, torturas e execuções extrajudiciais antes das eleições, um padrão que, segundo a organização, tem caracterizado os últimos actos eleitorais no país.
Ascensão de Hassan
Samia Suluhu Hassan, de 64 anos, tornou-se a primeira mulher a liderar a Tanzânia em 2021, após a morte do então presidente John Magufuli, de quem era vice-presidente. Inicialmente elogiada por flexibilizar as restrições autoritárias impostas pelo antecessor, acabou por ser acusada de reprimir opositores e de restringir a liberdade política.
Nesta eleição, concorreu com outros 16 candidatos, mas os dois principais adversários, Tundu Lissu, do Chadema, e Luhaga Mpina, da ACT-Wazalendo, foram impedidos de participar: o primeiro encontra-se detido desde Abril, acusado de traição, e o segundo teve a sua candidatura rejeitada.
País dividido
Enquanto a presidente tomava posse em Dodoma, a calma começava lentamente a regressar a algumas cidades. No entanto, a Tanzânia, com cerca de 68 milhões de habitantes, permanece profundamente dividida. As últimas quatro eleições no país têm sido marcadas por protestos e denúncias de fraude.
Apesar das críticas internas e internacionais, Hassan já foi felicitada por cerca de dez líderes africanos e pela União Africana. Ainda assim, as acusações de repressão, manipulação eleitoral e violações de direitos humanos deixam claro que o novo mandato começa sob forte contestação e desconfiança, dentro e fora da Tanzânia.