Primeira audição nos EUA das "dívidas ocultas" de Moçambique
Lusa | ms
22 de janeiro de 2019
O Tribunal de Brooklyn começa esta terça-feira a julgar o caso das dívidas ocultas em Moçambique, envolvendo o ex-ministro das Finanças Manuel Chang. Entre os acusados, apenas o libanês Jean Boustani se encontra nos EUA.
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A data da primeira audição foi marcada pelo juiz William F. Kuntz, depois do pedido formal dos procuradores federais, que salientaram a complexidade do caso, que envolve um conjunto de protagonistas suspeitos de terem lesado o Estado moçambicano em 2.000 milhões de euros.
O principal suspeito, Jean Boustani, está em prisão preventiva num centro de detenção norte-americano desde o no início do ano. O libanês acusado de ter organizado um esquema de corrupção com governantes moçambicanos e intermediários de bancos, que financiaram empréstimos a projetos marítimos de fachada.
No caso está envolvido o antigo ministro das Finanças moçambicano Manuel Chang, que se encontra detido em Joanesburgo, na África do Sul, a aguardar extradição.
Três antigos banqueiros do Credit Suisse envolvidos nos empréstimos a empresas públicas moçambicanas também foram presos no início de janeiro pelas autoridades britânicas, a pedido da Justiça dos Estados Unidos. Andrew Pearse, Detelina Subeva e Surjan Singh aguardam pelo julgamento em liberdade condicional.
O processo tem ainda mais três acusados, com identidades que ainda não foram reveladas, mas pelo menos dois foram antigos funcionários do governo de Moçambique.
Defesa alega condições macroeconómicas
Os advogados de defesa de Jean Boustani, o único acusado do caso imposto pela justiça norte-americana que se encontra nos Estados Unidos da América, escreveram numa carta ao juiz, a que a Lusa teve acesso, onde se argumenta que "Moçambique não falhou o pagamento da sua dívida devido a pagamentos impróprios ou algo que Jean Boustani tenha feito. Moçambique entrou em 'default' devido a condições macroeconómicas que afetaram toda a região".
Em 16 de janeiro, a acusação divulgou um documento em que declarava que "as ações do acusado ajudaram a devastar a economia de um dos países mais pobres do mundo". A defesa, ainda a lutar pela mudança de Jean Boustani da prisão preventiva para prisão domiciliária em Nova Iorque, incluiu na carta vários documentos sobre as embarcações que o Proindicus terá recebido da empresa Privinvest, onde o libanês trabalhava.
"A evidência no julgamento mostrará que bens valiosos, incluindo embarcações de defesa, radares sofisticados e uma série de produtos relacionados foram construídos e entregues a Moçambique com a intenção de que sejam usados para patrulhar e proteger as águas, incluindo os campos de gás natural descobertos em alto mar em 2011", escreve a defesa, expondo assim alguns dos objetivos do Proindicus aquando da sua criação.
Por outro lado, a acusação defende que o projeto Proindicus, juntamente com as empresas públicas EMATUM e MAM, "eram simplesmente empresas de fachada usadas pelo réu e outros membros da conspiração para enriquecerem e pagar subornos e comissões".
Para a defesa do negociador libanês, os crimes de que o cliente é acusado não são verdadeiros e não prejudicaram investidores internacionais nem intervieram, em nenhuma relação direta, com a legislação dos Estados Unidos.
"As provas vão mostrar que os investidores não perderam nada", escreve a equipa de defesa, juntando uma notícia de 6 de novembro de 2018 pela agência financeira Bloomberg, sobre a iniciativa de Moçambique emitir eurobonds para reestruturação da dívida.
Da notícia, a defesa extrai que "a reestruturação do empréstimo [a Moçambique] oferecerá aos investidores o pagamento de juros fixos a uma taxa aproximada de 6%, bem como uma porção das receitas do governo dos poços offshore de , a ser desenvolvidos pela Anadarko e pela Eni, duas das maiores empresas de energia no mundo".
Pemba: degradação em tempos de boom
Apesar do crescimento económico causado pelas descobertas de gás no norte de Moçambique, os edifícios históricos de Pemba continuam degradados. Os investimentos vão à construção de novos edifícios e não à reabilitação.
Foto: DW/E. Silvestre
Casas históricas em ruínas
Apesar do crescimento económico causado pelas descobertas de gás no norte de Moçambique, os edifícios do centro histórico de Pemba continuam degradados. Os investimentos vão à construção de novos edifícios e não à reabilitação. A degradação não poupa prédios com elevado valor histórico como esta casa, que foi na era colonial e até 1979 a residência do governador da província de Cabo Delgado.
Foto: Eleutério Silvestre
Mercado central de Pemba
O mercado localiza-se na cidade baixa da cidade desde 1940. Foi uma atração turística de Pemba, que em tempos coloniais era chamada Porto Amélia. Os números e as letras na placa por cima da fachada da entrada, resistem as intempéries naturais e ainda testemunham o quanto foi importante o mercado para os colonos portugueses.
Foto: Eleutério Silvestre
Negócio parado: as bancas do mercado
Nestas bancas simples eram expostos cereais, leguminosas e outros produtos alimentares. Antes do total abandono nos anos 2000, o mercado era frequentado por cidadãos da classe média de diferentes bairros de Pemba, atraídos pelo nível de higiene que caraterizava na exposição dos produtos. Vendia-se o melhor peixe e a melhor carne da cidade de Pemba.
Foto: Eleutério Silvestre
Abandono total: o cinema de Pemba
O cinema de Pemba, localizado na periferia da cidade baixa, era o único da cidade. Até 1990, eram projetados filmes na sala: das 14 às 16 horas os filmes para menores e das 17 às 21 horas as longas metragens para maiores de 18 anos. O cinema era ponto de encontro de cidadãos de diferentes idades de Pemba. O edifício funcionou também como ginásio de 2008 a 2012.
Foto: Eleutério Silvestre
Novas construções na vizinhança
Em vez de renovar e adaptar edifícios históricos já existentes, constroem-se novos prédios em Pemba, a capital da província moçambicana de Cabo Delgado. Este projeto do anfiteatro de Pemba é fruto de uma parceria público privada, entre o Hotel Wimbe Sun e o Conselho Municipal de Pemba. Mais um exemplo de que os investimentos vão para a construção e não para a reabilitação.
Foto: DW/E. Silvestre
Construir de raiz em vez de reabilitar
Mesmo para escritórios, que facilmente poderiam ser instalados em prédios históricos renovados, a opção preferida é construir de raiz. Assim sendo, o "boom" económico causado pela descoberta de grandes quantidades de gás na Bacia do Rovuma na província de Cabo Delgado não beneficia o centro histórico da cidade de Pemba. Este edifício é destinado para albergar uma filial bancária.
Foto: DW/E. Silvestre
Antiga delegação da Cruz Vermelha
Esta casa localiza-se na principal via de acesso à cidade baixa de Pemba. Serviu em regime de arrendamento como primeira delegação da Cruz Vermelha na província. A partir deste edifício, a Cruz Vermelha desencadeou ações humanitárias durante a guerra civil de Moçambique. Em 1999, a Cruz Vermelha de Moçambique abandonou a casa e mudou para infraestruturas próprias modernas.
Foto: Eleutério Silvestre
Armazém histórico de Pemba
Este armazém na cidade baixa faz parte dos edifícios históricos abandonados. Durante a guerra civil, serviu para o armazenamento de alimentos. Foi aqui que os residentes do bairro mais antigo de Pemba, Paquitequete, compravam produtos de primeira necessidade. Teve um papel muito importante durante a emergência de fome que assolou a população de Pemba durante a guerra civil no ano de 1980.
Foto: Eleutério Silvestre
Porto de Pemba
Quando o centro histórico está em degradação, uma das zonas mais dinámicas de Pemba é o porto. Do lado direito, as antigas instalações, do lado esquerdo a zona de ampliação destinada a carga do material da exploração do gás. O cais flutuante foi construído pela empresa francesa Bolloré. A esperança é que o boom do gás ajuda a reabilitar para além do porto também os edifícios históricos de Pemba.