STP: Produção de chocolate estimula cultivo de cacau
Ramusel Graça
22 de abril de 2019
Investimento estrangeiro no cultivo e transformação do cacau ajudou a criar, no último ano, 250 postos de trabalho no país. Setor pretende obter uma certificação biológica para impulsionar as exportações.
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Em São Tomé e Príncipe, passados 43 anos desde a independência, o cacau, que na era colonial apenas era exportado para chocolateiras europeias, está agora a ser transformado nas ilhas.
O negócio rende dezenas de milhares de euros por mês a uma fábrica que, recentemente, abriu as portas no arquipélago. Criaram-se 250 postos de trabalho num país onde o desemprego afeta 12 por cento da população.
Num secador solar, Teresa Martins trata do cacau que vai ser em breve transformado em chocolate. Teresa, de 68 anos, lida com cacau há mais de duas décadas. Possui uma terra, com cacaueiros, mas o dinheiro da produção do cacau da sua parcela não chega para sobreviver. Por isso, trabalha há cinco anos na roça Diogo Vaz, no norte de São Tomé, com outras 14 mulheres.
Produção de chocolate estimula cultivo de cacau em São Tomé e Príncipe
"Agora estamos bem. Agora tem emprego cá na região. Quando não temos de comer, já podemos fiar (pagar no final do mês)".
A roça Diogo Vaz pertence ao grupo francês Kennyson. O grupo investiu cerca de 3 milhões de euros na roça com 400 hectares de cacauzal e na fábrica de chocolate.
A abertura da fábrica em maio de 2018 fomentou o emprego. Gilmar Mandiga é um dos 250 empregados na roça e da fábrica. "Para mim parecia impossível ter uma fábrica de chocolate em São Tomé. Tendo em conta que participo na transformação do cacau até ao produto final, que é o chocolate, para colocar no mercado para os consumidores, para mim é motivo de muita satisfação".
Cacau de qualidade
O cacau foi introduzido no século 17 pelos portugueses e foi, ao longo de muitos anos, o motor da economia do arquipélago. Passadas quatro décadas da independência, o produto volta a ser valorizado.
A roça Diogo Vaz produz uma tonelada de cacau por mês, destinada exclusivamente à produção de chocolate, segundo disse, Paulo Pichel, responsável pela exportação. "O nosso objetivo é exportar um contentor por mês, estamos a falar em 8 toneladas de chocolate".
O português Filipe Almeida, chocolateiro, prepara as primeiras encomendas de 2019, para serem enviadas para França - um contentor de chocolate avaliado em 100 mil euros. Foram cinco anos de preparação para o início da produção a sério do chocolate, que começou em maio de 2018.
"É simultaneamente um desafio e um prazer fazê-lo. É, para mim, uma oportunidade de fazer um produto que eu sempre gostei muito - o chocolate fez-me entrar no mundo da pastelaria - e é poder intervir em todo o processo na plantação e na embalagem do produto", conta.
Com os lucros das exportações para a Europa, a roça Diogo Vaz, que estava votada ao abandono, está a ser reconstruída aos poucos. E a comunidade em redor da fábrica de chocolate também beneficia. Foi instalada uma rede eléctrica e as principais infraestruturas foram reabilitadas.
Com a produção do chocolate, o cultivo do cacau (biológico) foi valorizado na região, como garante Paulo Pichel. "Estamos a trabalhar com eles para que possam ter a certificação biológica. Como as outras empresas que estão presentes nas ilhas, estamos a batalhar para que o cacau são-tomense seja conhecido mundial como cacau biológico. São Tomé e Príncipe já está a competir na qualidade, é isso que nós temos que fazer".
Cacau: semente do desenvolvimento de São Tomé
Após a nacionalização das fazendas de cacau, as roças, em 30 de setembro de 1975, a produção diminuiu. Hoje, as roças voltaram a ser privadas e há esperanças que contribuam novamente para o desenvolvimento do país.
Foto: DW/R. Graça
Trabalho na roça começa cedo
Antes do sol penetrar na mata da Roça Olivais Marim, na zona sul de São Tomé, os poucos agricultores já trabalham nas plantações de cacau - principal produto de exportação do país. Após a nacionalização das roças, em 30 de setembro de 1975, a produção diminuiu. A exportação do cacau não passou de 12.000 toneladas/ano. Nos anos 80, a exportação baixou ainda mais, para 3.000 toneladas.
Foto: DW/R. Graça
Má gestão levou a êxodo rural
A nacionalização das fazendas em 1975 deu origem à formação de 15 grandes empresas estatais, que entraram em declínio. A queda da produção do cacau abriu o caminho às privatizações nos anos 90. Porém, muitas terras continuaram improdutivas e iniciou-se um êxodo rural das populações nas zonas das roças. Agora, 2.500 hectares de terras estão a ser desbravadas e reaproveitadas.
Foto: DW/R. Graça
Clima ideal
Agricultora prepara viveiros para reabilitar as plantações abandonadas da Roça Granja. São Tomé e Príncipe possui as condições climáticas favoráveis ao cultivo do cacau: terras de origem vulcânica, solo fértil e boa temperatura. Estatísticas do período colonial revelam que, com apenas 15 unidades agroindustriais numa área de 60 mil hectares, os portugueses chegaram a produzir 36.000 toneladas/ano.
Foto: DW/R. Graça
Raízes brasileiras
Em São Tomé e Príncipe, a cultura do cacau começou na Ilha do Príncipe. Os primeiros cacaueiros, plantados pelos colonos portugueses em 1822, vieram do Brasil. No século XIX, durante o "Ciclo do Cacau", por falta de mão de obra local, os portugueses contrataram trabalhadores de outras colónias africanas – como Angola, Cabo Verde e Moçambique. Muitos tiveram que trabalhar sob condições desumanas.
Foto: DW/R. Graça
Produção biológica de cacau
No interior da Roça Santa Luzia, na Ilha de São Tomé, os tratores adquiridos pela Cooperativa de Exportação do Cacau Biológico (CECAB) regam os viveiros nas parcelas dos agricultores. O cacau é ideal para a produção biológica, pois cresce sob árvores de outras espécies – o que conserva uma maior biodiversidade em comparação com monoculturas de outras plantas como a soja.
Foto: DW/R. Graça
De olho no mercado internacional
O cacau amelonado, variedade proveniente da Amazônia, foi o primeiro a chegar ao arquipélago de São Tomé e Príncipe. Este tipo de cacau é muito procurado no mercado internacional por ter características genéticas de qualidade superior a outras variantes de cacau.
Foto: DW/R. Graça
Recuperação de outras variedades
Produtores de cacau tipo exportação estão a recuperar outras variedades, como o cacau híbrido. O cacaueiro tem folhas longas que nascem avermelhadas e logo ficam de um verde intenso, medindo até 30 centímetros. Seus frutos também podem medir até 30 centímetros de comprimento, apresentando coloração verde, vermelha ou amarronzada e que tendem ao amarelo quando amadurecido o fruto.
Foto: DW/R. Graça
Secagem depois da colheita
A seguir à colheita da fruta dos cacaueiros, é preciso secá-la. No caso da Roça Morro Peixe, a secagem é feita com uso da energia solar natural. Um secador solar construído de madeira e coberto de plástico garante uma boa temperatura para a secagem do cacau, antes de ser embalado.
Foto: DW/R. Graça
Trabalho minucioso
Descendentes de cabo-verdianos, no interior do secador da Roça Santa Margarida, separam o cacau na peneira. Um trabalho minucioso que antecede a embalagem. Estas trabalhadoras fazem parte dos poucos agricultores que resistiram ao êxodo rural em São Tomé e Príncipe. Já no período colonial, uma boa parte da mão de obra das roças veio de Cabo Verde, outra colónia portuguesa.
Foto: DW/R. Graça
Embalar e despachar para a Europa
O último passo antes do processamento e da exportação do cacau é a sua embalagem em sacos. Uma boa parte da produção de cacau de São Tome e Príncipe é exportada para a Europa – principalmente para a França e a Suíça, os dois principais mercados consumidores do cacau de excelência e de fama internacional reconhecida.