Centenas de refugiados do Centro de Maratane, na província nortenha de Nampula, manifestaram-se contra a falta de sabão e óleo, que não são distribuídos há sete meses. Governo reconhece o problema e apela ao diálogo.
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Cada família tem direito a receber, por mês, nove quilos de milho e feijão, meio litro de óleo alimentar e uma barra de sabão. Mas estes dois últimos produtos já não são distribuídos há sete meses, queixam-se os refugiados do Centro de Maratane.
A situação gerou revolta e levou centenas de refugiados, na sua maioria mulheres, a protestar, esta quarta-feira (01.11), em frente ao edifício da administração do centro para exigir esclarecimentos das autoridades governamentais e também dos representantes do Programa Alimentar Mundial (PAM) e do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR).
"Só recebemos milho e feijão boer, que na nossa terra nunca comemos", conta Bahaate Antuany. A presidente da Associação da Mulher Refugiada de Maratane sublinha ainda que as crianças estão a contrair muitas doenças.
Protestos de refugiados no norte de Moçambique
Segundo a responsável, as organizações internacionais que apoiam o centro já disseram que não dispõem de verbas para adquirir os produtos mais exigidos pelos refugiados. "O PAM e o ACNUR falaram que não têm dinheiro. Mas é possível comer seis meses sem óleo? Ficar sem lavar roupa?", pergunta Bahaate Antuany.
Os refugiados já informaram que se recusam a receber donativos enquanto não chegar óleo e sabão. "O ACNUR disponibiliza fundos de um ano, de janeiro a dezembro, e esse dinheiro onde foi [aplicado]? ", questiona Bahaate Antuany.
Fatuma Rixaza, refugiada no Centro de Maratane, queixa-se de outro problema. "Há crianças nas escolas e já há cinco meses que não recebem pensos", lamenta.
"Sem diálogo não há consenso"
O Governo moçambicano, através do administrador do Centro de Refugiados de Maratane, António Luís Gonzaga, reconhece o problema e apela ao diálogo. "Vamos chamar novamente o chefe do escritório do ACNUR, com o chefe do PAM vamos ter uma conversa pacífica e vamos entender-nos. Sem diálogo não há nenhum consenso", lembra.
Os protestos dos refugiados foram pacíficos e sem espaço para tumultos, mas a polícia esteve presente e foi solicitado um reforço para garantir a ordem e evitar possíveis focos de violência.
Localizado a 25 quilómetros da cidade nortenha de Nampula, o Centro de Refugiados de Maratane é o primeiro e o maior centro de refugiados de Moçambique e acolhe cidadãos estrangeiros que fugiram de países em conflito.
Aqui vivem mais de 12 mil requerentes de asilo e refugiados, oriundos sobretudo da região dos Grandes Lagos, nomeadamente Republica Democrática de Congo (RDC), Burundi, Ruanda, Somália e Etiópia.
Angola: Congoleses denunciam horrores vividos
A província da Lunda Norte, em Angola, está a acolher diariamente centenas de congoleses que continuam a fugir à violência na região do Kasai, na República Democrática do Congo.
Foto: DW/N. Sul d'Angloa
Mais de um milhão de deslocados
Estima-se que, pelo menos, 3.300 pessoas tenham já morrido na sequência do conflito que, desde agosto de 2016, se tem desenrolado nas região do Kasai e Kasai Central, na República Democrática do Congo, (RDC). 1,3 milhões de congoleses foram obrigados a fugir da região devido à violência da milícia Kamuina Nsapu.
Foto: DW/N. Sul d'Angola
Millhares no Campo de Kakanda
Germaine Alomba tem 29 anos e é uma das congolesas que conseguiu atravessar a fronteira rumo a Angola, estando abrigada, atualmente, no centro provisório de Kakanda. Como ela, cerca de 30 mil congoleses estão refugiados em Angola. A este campo chegam, todos os dias, cerca de 500 pessoas, muitas delas transportadas em camiões e autocarros cedidos pela Organização das Nações Unidas (ONU).
Foto: DW/N. Sul d'Angloa
Acusações a Kabila
Segundo as autoridades católicas no Congo, já foram encontradas mais de 40 valas comuns na região do Kasai. Congoleses em Angola ouvidos pela DW África, revelam que a violência contínua tem sido alimentada pelo Governo de Kabila. "[Ele] está a organizar uma guerra, está a entregar armas aos civis para matar a população. O sofrimento neste momento é muito", denuncia Jimba Kuna, um dos refugiados.
Foto: DW/N. Sul d'Angola
Familiares desaparecidos
Odia Rose é outra das vítimas deste conflito. A sua filha adolescente, de 15 anos, desapareceu quando ambas tentavam fugir à violência no seu país. Hoje, conta à DW, "reza todos os dias para a reencontrar com vida".
Foto: DW/N. Sul d'Angloa
Repetem-se as atrocidades
Mbumba-Ntumba é o espelho das atrocidades que sucedem na região do Kasai. "Estava em minha casa e um grupo de pessoas entrou e começou a bater-me. Cortaram o meu braço com uma catana e bateram-me na cabeça", contou em entrevista à DW África o congolês de 65 anos. Ntumba foi resgatado inconsciente por voluntários da Cruz Vermelha que o levaram até à fronteira com Angola.
Foto: DW/N. Sul d'Angloa
Violência sem fim
As atrocidades não ficam por aqui. Recentemente, o Conselho de Direitos Humanos da ONU voltou a enviar peritos para a região para investigar as denúncias de abusos, incluindo decapitações. Há relatos de refugiados que contam que foram forçados a enterrar vítimas em valas comuns e que afirmam que as milícias terão atacado e mutilado bebés e crianças.
Foto: DW/N. Sul d'Angloa
Crianças sozinhas
Dados da Agência das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) indicam que mais da metade dos deslocados são menores e que, em muitas ocasiões, foram separados dos seus pais e familiares - como é o caso das quatro crianças na fotografia, atualmente refugiadas no Campo em Kakanda, Angola.
Foto: DW/N. Sul d'Angloa
Aulas de Língua Portuguesa
Tanto no Campo de Mussunga, onde se encontram alguns refugiados, como em Kakanda, onde está a maioria, foram criadas escolas improvisadas onde é ensinada às crianças a língua portuguesa.
Foto: DW/N. Sul d'Angloa
Necessária mais ajuda
Em Angola, os centros de acolhimento improvisados estão já sobrelotados. Em entrevista à DW África, o bispo da diocese da Lunda Norte, Estanislau Chindecasse, explicou que é necessária “mais ajuda para que as pessoas possam ter, pelo menos, duas ou três refeições. O que estamos a fazer é o mínimo, porque não há outras possibilidades”, deu conta.