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Protestos e tensão marcam ambiente pós-eleitoral no Brasil

1 de novembro de 2022

Um dia após a vitória de Lula na segunda volta das presidenciais, ambiente pós-eleitoral é cada vez mais conturbado. Apoiantes de Bolsonaro bloqueiam centenas de estradas. Analista alerta para "retrocesso" na democracia.

Brasilien | Straßenblockaden nach Präsidentschaftswahl
Foto: Diego Vara/REUTERS

Centenas de rodovias no Brasil, incluindo as principais vias dos grandes centros urbanos, estão bloqueadas por motoristas que apoiam o Presidente Jair Bolsonaro, que foi derrotado nas urnas. 

Em entrevista à DW África, o cientista político Leonardo Paz, da Fundação Getúlio Vargas (FGV), lembra a invasão do Capitólio nos Estados Unidos e diz que os bloqueios nas estradas brasileiras são um "processo antidemocrático em reação ao processo eleitoral", uma vez que os manifestantes estão a pedir uma intervenção militar contra o resultado das eleições. 

Não bastasse a tensão criada por estes protestos, o silêncio de Jair Bolsonaro sobre o resultado da votação também tem gerado preocupações. Para o cientista político, a demora do Presidente em reconhecer a sua derrota é um "retrocesso" para a democracia brasileira. 

Segundo Paz, esse movimento de Bolsonaro faz parte de "um conjunto de ações do Governo", que no período de campanha colocou em causa o processo eleitoral do país – o que foi amplamente rejeitado pelas instituições e pela sociedade civil.

Grupos bolsonaristas descontentes apelam a golpe das Forças ArmadasFoto: Sergio Lima/AFP

DW África (DW): O resultado das eleições foi divulgado há mais de 24 horas e até agora não há nenhuma reação do Presidente. Porquê a demora de Jair Bolsonaro?   

Lenardo Paz (LP): Nossa primeira perceção, de momento, é que ele está frustrado com a perda da eleição. Ele não sabe o que dizer, porque ainda não se articulou com os seus aliados mais próximos. Ele não falou com o público, ele não falou com as pessoas. Ele possivelmente estará a preparar-se para qualquer tipo de ação.

Há quem pense que ele está a participar de alguma maneira nos protestos [que estão a bloquear centenas de rodovias]. Outros dizem que ele está simplesmente em negação e, por não saber o que fazer, não se manifesta. Resta saber se se trata de um silêncio absoluto, ou se ele está a preparar-se para fazer algo, por exemplo esperar pela situação dos camionistas e dos seus seguidores. Possivelmente ele esteja à espera de uma escalada do conflito para que ele possa atuar, por exemplo, colocando as forças armadas para começar a ocupar pouco a pouco esse terreno.

DW: É uma situação inédita o Presidente em exercício não aparecer em público e não reconhecer o resultado oficial de uma eleição. O que o silêncio de Bolsonaro representa para a democracia brasileira?

LP: É um retrocesso muito ruim. Lamentavelmente, isso faz parte de um conjunto de ações do Governo, que desde a campanha eleitoral já questionava [a eficácia] das urnas eletrónicas sem ter provas, pedia o envolvimento dos militares, argumentava que não ia reconhecer o resultado se não houvesse votação através de cédulas de papel. Isso já era um retrocesso por si só. Este não reconhecimento agora é um exemplo de como uma democracia não devia funcionar... 

DW: Aliados e membros do Governo dizem que Bolsonaro está a preparar um discurso para reconhecer o resultado das eleições, mas que não deve parabenizar o Presidente eleito Lula. Como avalia essa postura?

LP: Não é uma boa prática. Mas isto não constitui um golpe ou uma ameaça à democracia. É só uma falta de respeito pelo cargo.

Bloqueios de apoiantes de Bolsonaro começaram a ser desmantelados pela políciaFoto: Anderson Coelho/AFP

DW: Centenas de rodovias do Brasil estão bloqueadas por motoristas que apoiam o Presidente Bolsonaro. Como avalia esse tipo de manifestação pós-eleitoral no Brasil?

LP: Eu acho que é gravíssimo. É muito grave. Os trabalhadores brasileiros têm o direito constitucional de protestar. Mas que tipo de protesto, previsto na lei , é que eles têm o direito de fazer? É o direito ao protesto por melhores condições de trabalho, por exemplo. Estes protestos não são nada disso. Isto são protestos de um grupo de pessoas que está a pedir uma intervenção militar, que está a pedir a não completação do processo eleitoral. Isso é golpe. Boa parte do país está travada. O aeroporto interncional de Guarulhos [em São Paulo], por exemplo, que é a maior porta de entrada internacional do país, está travado. Isto é muito, muito sério. 

DW: Este episódio assemelha-se à invasão do Capitólio que ocorreu depois das eleições nos Estados Unidos?

LP: Este caso, aqui no Brasil, é mais sério ainda, porque ele dana ainda mais a economia do país. Este episódio é muito menos simbólico. A invasão do Capitólio foi uma ação muito mais simbólica, onde pessoas mortas, mas, para o país como um todo, este episódio, aqui no Brasil, é muito mais grave. Ambas as ações são comparáveis, na medida em que são formas de protesto antidemocráticas, como reação a um processo eleitoral.

DW: Acha que essa situação pode sofrer uma escalada a partir do pronunciamento do Presidente? Qual será a reação dos camionistas, em ambos os cenários, ou seja caso Bolsonaro aceite o resultado da eleição ou caso recuse aceitar?

LP: Se Bolsonaro aceitar que perdeu, eu penso que isso vai reduzir e acalmar os ânimos das pessoas responsáveis por esses atos. Se o Presidente falar que teve fraude, ou coisa parecida, eu acho que ele vai animar esse pessoal, e aí, pessoas que já estavam mais ou menos frustradas poderão vir a juntar-se àqueles atos.   

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