PRS pede demissão do primeiro-ministro da Guiné-Bissau
17 de maio de 2019
Partido da oposição anuncia medida depois de Aristides Gomes ter solicitado a exoneração dos ministros da Agricultura e do Interior. Indefinições no Parlamento guineense também aprofundam a crise política no país.
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O Partido da Renovação Social (PRS) da Guiné-Bissau, da oposição, anunciou esta sexta-feira (17.05) que irá pedir a demissão do primeiro-ministro guineense, Aristides Gomes. A decisão vem na sequência do pedido de exoneração feito pelo chefe do executivo dos ministros da Agricultura e do Interior no âmbito da operação "Arroz do Povo". O primeiro-ministro alega que os ministros estão envolvidos em "atos moral e juridicamente censuráveis".
Em carta ao Presidente da República, José Mário Vaz, Aristides Gomes justifica que o ministro da Agricultura e Desenvolvimento Rural, Nicolau dos Santos, que é do PRS, tem alegado envolvimento no desvio de arroz doado pela China. Além disso, acusa o ministro do Interior, Edmundo Mendes, de injúrias e de disponibilizar forças de intervenção rápida para impedir a ordem de prisão do ministro da Agricultura e de ajudar o Ministério Público a arrombar um armazém onde estava o arroz apreendido.
PRS pede demissão do primeiro-ministro da Guiné-Bissau
Em conferência de imprensa, Vítor Pereira, porta-voz do PRS, afirmou que, "à luz do Acordo de Conacri", Aristides Gomes não tem poderes de propôr ou demitir nenhum membro do executivo.
"Esta intenção de Aristides Gomes vem pôr a nu uma verdade escondida, ou seja, o ódio que o primeiro-ministro move aos dirigentes do PRS e que traduz, sempre que pode, em tentativas de humilhação e afronta. Tomar uma decisão desta natureza enquanto o inquérito corre os seus trâmites é no mínimo de uma extraordinária arrogância e não é compatível com as regras que regem o estado democrático de direito", declarou.
"Despachos não são feitos em praça pública"
O Presidente guineense confirmou o recebimento dos pedidos de exoneração, mas lamentou o facto de a carta de Aristides Gomes ter sido divulgada nas redes sociais. "Despachos não são feitos em praça pública. E a mim não cabe fazer nenhum tipo de julgamento", disse a jornalistas.
Mais de duas mil toneladas de arroz doadas pela China às populações carenciadas foram apreendidas pela Polícia Judiciária. Segundo as investigações, o arroz que chegou à Guiné-Bissau em janeiro estava a ser preparado para ser vendido ao público. O produto foi também encontrado numa quinta supostamente pertencente ao Ministério da Agricultura. Aristides Gomes ordenou esta semana o início da distribuição do alimento, apesar de o inquérito não ter sido concluído, e foi então acusado pelo Ministério Público de ocultação de provas.
Para o analista político Rui Borges, o primeiro-ministro pediu as exonerações por motivações políticas. "Isso é mais um ato político do que na verdade um procedimento administrativo do ponto de vista do cumprimento daquilo que são as normas legais", explica Rui Borges.
"Por um lado, o Presidente da República se posiciona do lado dos partidos minoritários no Parlamento, incluindo o PRS. Do outro lado, tem o PAIGC que também tem uma relação com o seu primeiro-ministro, que é membro do bureau político do partido. Então, tem essa situação de desconfiança mútua entre as partes e cada um está a tentar tirar o melhor ao partido sem levar em consideração que, além dos interesses pessoais, há de se colocar o interesse nacional", acrescenta.
Indefinição no Parlamento
Somado a esta situação, a crise no Parlamento guineense continua. Dois meses depois das eleições legislativas, um novo Governo ainda não foi nomeado devido às disputas entre os partidos. O Supremo Tribunal de Justiça da Guiné-Bissau rejeitou uma providência cautelar interposta pelo Movimento para a Alternância Democrática (Madem-G15) para anular a votação da mesa da Assembleia Nacional Popular. O partido, entretanto, alega que o acórdão é nulo e "não produz efeito".
O secretário nacional do Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC), Ali Hijazi, em nome da coligação que forma a maioria no Parlamento, criticou o posicionamento do Madem-G15.
"É inadmissível que um partido político que pretende governar o país se permita a não cumprir o texto de lei, o que demonstra falta de preparação para assumir os destinos da nação. É vergonhoso que um partido recorra ao tribunal e por que a decisão não lhe é favorável recuse o seu cumprimento", criticou.
O analista Rui Borges vê o episódio com preocupação: "É praticamente um indício para se declarar que o país deve entrar num estado de sítio. A situação nesse caso sinaliza para uma crise generalizada se o Presidente da República continuar no silêncio sem criar condições efetivas para permitir o desbloqueio do país e, consequentemente, permitir com que as coisas funcionem".
Para o analista político Luís Petit, José Mário Vaz precisa agir. O Presidente ainda aguarda a constituição da mesa da Assembleia Nacional Popular para marcar as eleições presidenciais. "O Presidente da República não tem razão quando diz que só nomeia o Governo se realmente a composição da mesa for concluída. Tudo está a andar mal, por isso, se calhar, tenha havido muitas greves por causa dessa situação", sublinhou.
Farpas e elogios: Frases das eleições na Guiné-Bissau
Principais partidos políticos, sociedade civil e comunidade internacional acompanham de perto contagem de votos na Guiné-Bissau. CNE só divulga resultados na quarta-feira (13.03), mas PAIGC já canta vitória.
Foto: Getty Images/AFP/SEYLLOU
PAIGC
O PAIGC declarou-se, na segunda-feira (11.03), vencedor das eleições legislativas de 10 de março na Guiné-Bissau. O porta-voz do partido João Bernardo Vieira garantiu que o povo conferiu ao PAIGC os destinos do país. No domingo, após votar, o líder do PAIGC, Domingos Simões Pereira, disse que estas eleições representam "um momento de viragem" para que, na Guiné-Bissau, "o império da lei vingue".
Foto: DW/F. Tchumá
MADEM-G15
Após o anúncio do PAIGC, o Movimento para a Alternância Democrática frisou que ninguém ganhou as eleições com maioria absoluta e que também fará parte do próximo Governo do país. As declarações de Braima Camará no domingo, dia das eleições, foram das mais críticas, pois o líder do MADEM-G15 acusou o primeiro-ministro de "usar dinheiro público para corromper líderes de opinião no dia de reflexão".
Foto: DW/J. Carlos
PRS
O Partido da Renovação Social disse, esta terça-feira, que "é falsa a informação da maioria folgada que o PAIGC sustenta para semear a confusão"."Nenhuma das forças políticas atingiu sequer a barra dos 40 deputados", disse Vítor Pereira. No domingo, depois de votar, Alberto Nambeia, líder do PRS, disse que esta votação constitui um "balão de oxigénio" para o povo, que quer mudanças no país.
Foto: DW/B. Darame
FREPASNA
Baciro Djá considera que era o candidato com mais experiência nestas eleições e, por isso, o justo vencedor. No entanto, esta segunda-feira, o líder do partido Frente Patriótica para a Salvação Nacional (FREPASNA) foi o primeiro a reconhecer a derrota no pleito. "Consideramos que o nosso resultado foi péssimo e a responsabilidade máxima é minha, enquanto presidente do partido", disse.
Foto: Presidency of Guinea-Bissau
Comissão Nacional de Eleições (CNE)
Pouco depois do arranque do pleito, no domingo, José Pedro Sambú, presidente da CNE, disse aos jornalistas que o processo estava a decorrer num "clima de transparência e sem sobressaltos". O mesmo cenário foi reportado pela porta-voz da comissão, ao final do dia. Felizberta Vaz garantiu ainda que os "pequenos problemas" que surgiram foram resolvidos. A CNE divulga os resultados esta quarta-feira.
Foto: CNE
Presidente da República
Em declarações aos jornalistas, depois de votar, no domingo, José Mário Vaz garantiu que os observadores estavam "surpresos" pela positiva com a Guiné-Bissau. O Presidente guineense pediu à imprensa para que passasse lá para fora essa "grande imagem" da Guiné-Bissau como um país onde "não há problemas". "Considero a Guiné-Bissau hoje campeã da liberdade", disse.
Foto: Getty Images/AFP/Seyllou
Primeiro-ministro guineense
Também no domingo, o primeiro-ministro guineense disse estar emocionado com a concretização de um processo eleitoral "difícil e intenso", no qual foi "necessária a intervenção da comunidade internacional". Aristides Gomes acrescentou ainda que, apesar das dificuldades, este foi um processo cheio de "pedagogia".
Foto: Präsidentschaft von Guinea-Bissau
Organização das Nações Unidas
David McLachlan-Karr, enviado das Nações Unidas à Guiné-Bissau, tem estado a reportar, com frequência, o ambiente vivido no país nestas eleições, nas redes sociais. Esta segunda-feira, o representante da ONU deu os parabéns à população guineense que, "em todo o país, saiu [às ruas] para votar pacificamente e com muito orgulho cívico".
Foto: DW/B. Darame
Comunidade dos Países de Língua Portuguesa
Também a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), na pessoa de Luiz Villarinho Pedroso, acompanhou de perto a votação. No domingo, dia da eleição, o chefe da missão da CPLP disse que estas eleições foram um "exercício cívico exemplar", que decorreu com a "maior tranquilidade e normalidade". O balanço preliminar do escrutínio será feito ao longo desta terça-feira (12.03).
Foto: DW/N. dos Santos
CEDEAO
À semelhança da ONU e da CPLP, também a CEDEAO deu nota positiva às eleições guineenses. Numa conferência de imprensa, esta segunda-feira (11.03), Kadré Désiré Ouedraogo, chefe da Missão de Observação da CEDEAO, disse que as legislativas no país decorreram "de forma pacífica e transparente". Acrescentou ainda que espera que "todos [os partidos] aceitem os resultados".
Foto: DW/B. Darame
União Africana
Após o encerramento das urnas na Guiné-Bissau, Rafael Branco, chefe da Missão de Observação Eleitoral da União Africana destacou a forma tranquila com que decorreu o processo e salientou a "participação cívica notável".
Foto: DW/Nélio dos Santos
Liga Guineense dos Direitos Humanos
Também as organizações locais fizeram chegar elogios. À semelhança do que foi dito pela CNE, Augusto Mário da Silva, presidente da Liga Guineense dos Direitos Humanos, disse ter havido registo de "algumas falhas", mas "que foram imediatamente supridas". Tirando os atrasos na abertura das urnas em algumas mesas e trocas de cadernos eleitorais, "o processo decorreu de forma regular", disse.
Foto: DW/B. Darame
Sociedade Civil
Por último, a Célula de Monitorização do Processo Eleitoral salientou, esta segunda-feira, que "os eleitores compareceram em massa para exercer o seu direito de voto". Este grupo de monitorização das eleições, composto por 420 pessoas, espalhadas por todo o país, saudou também "a boa presença das forças de segurança nos centros de votação observados".