Quénia: Juízes criticam "ameaças veladas" de Uhuru Kenyatta
AFP | tms
3 de setembro de 2017
Associação de Magistrados e Juízes do Quénia classifica delcarações do Presidente como "um ataque ao Judiciário". Após reeleição anulada, Kenyatta diz que pretende resolver "problema" do Supremo Tribunal.
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Juízes quenianos criticaram as "ameaças veladas" feitas pelo Presidente Uhuru Kenyatta depois que o Supremo Tribunal anulou sua reeleição, alegando irregularidades no processo eleitoral.
Classificando as declarações do Presidente como "um ataque ao Judiciário", a Associação de Magistrados e Juízes do Quénia (KMJA, sigla em inglês) na noite deste sábado pediu às pessoas que ignorassem a "retórica política". "O Presidente deste país referiu-se ao presidente do Supremo Tribunal e aos outros juízes como 'wakora'", ou criminosos, em swahili, disse.
"Ele fez ameaças veladas contra os mesmos juízes após a decisão do Supremo Tribunal. As mesmas ameaças contra o Judiciário foram repetidas na Casa do Estado", disse o chefe Bryan Khaemba, referindo-se ao palácio presidencial. "Condenamos esse ataque à independência dos juízes", afirmou Khaemba.
Decisão inédita em África
O juiz presidente do Supremo Tribunal do Quénia, David Maraga, declarou na sexta-feira (01.09) que a vitória de Kenyatta nas eleições de 8 de agosto era "inválida" e estava anulada, apontando para irregularidades na transmissão eletrónica dos resultados da votação.
Kenyatta diz respeitar a decisão, mas atacou os juízes dizendo: "Toda vez que fazemos algo, um juiz sai e faz uma liminar. Não pode continuar assim. Há um problema e nós devemos consertá-lo".
Raila Odinga questiona eleições no Quénia
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"Eu acho que essas roupas que eles usam fazem com que eles pensem que são mais inteligentes do que o resto de nós quenianos", disse Kenyatta sobre os juízes do Suprema Tribunal, referindo-se ao juiz Maraga. "Maraga pensa que pode derrubar a vontade das pessoas. Devemos mostrar-lhe que a vontade do povo não pode ser derrubada".
Esta é a primeira vez que o resultado de eleições presidenciais foi revogado em África. A decisão foi bem-vinda pelo opositor de Kenyatta, Raila Odinga, que perdeu as eleições em 1997, 2007 e 2013. No entanto, Odinga diz que não confia na Comissão Eleitoral, que está encarregada de organizar eleições nos próximos 60 dias.
Os meios de comunicação quenianos apontaram a decisão do Supremo como uma vitória para o estado de direito e um sinal de uma democracia amadurecida.
Política e controvérsia nas eleições do Quénia
A campanha eleitoral no Quénia acaba de se tornar ainda mais complicada do que já era com a formação da Super Aliança Nacional (National Super Alliance – NASA), que almeja derrotar o partido no Governo.
Foto: Reuters/M. Eshiwani
NASA tenta derrotar o partido no poder
A aliança da oposição, NASA, nomeou o ex-primeiro ministro Raila Odinga candidato à presidência. Trata-se, com grande probabilidade, da última tentativa de Odinga, um opositor veterano de 72 anos, de ser eleito Presidente, após três candidaturas falhadas. A NASA esforçou-se por nomear um candidato passível de angariar votos dos principais grupos étnicos.
Foto: Reuters/M. Eshiwani
A recruta de novos membros de áreas chave
A NASA quer derrotar o Presidente em exercício, Uhuru Kenyatta, que concorre pela segunda e última vez pela sua formação política, Jubilee Party. Recentemente, a aliança ganhou um novo co-presidente na pessoa do governador de Bomet, Isaac Ruto. O dirigente do sudoeste do país garante à NASA o apoio do Vale de Rift, a maior província do país.
Foto: Reuters/T. Mukoya
Eleições no décimo aniversário de violência política
As eleições gerais quenianas realizam-se em 18 de agosto de 2017. Este ano, cerca de 19 milhões de quenianos recensearam-se para votar, embora ainda decorra um inquérito para eliminar da lista os eleitores entretanto falecidos. As eleições realizam-se dez anos após um sufrágio que desencadeou uma onda de violência, que resultou em mais de mil mortos e centenas de milhares de deslocados.
Foto: Reuters/M. Eshiwani
Número inesperado de eleitores
O número elevado de eleitores que se apresentou nas mesas de voto para eleger o candidato à presidência do partido governamental, obrigou ao adiamento do voto. O Jubilee Party não estava preparado para tantos eleitores, e teve que providenciar mais boletins de votos, antes de continuar a votação poucos dias mais tarde.
Foto: Reuters/M. Eshiwani
Violência eleitoral
As eleições deste ano para os governos e parlamentos regionais já foram marcadas pela violência. Dezenas de pessoas foram feridas no início do mês de Maio em Nairobi na central do partido de oposição Movimento Laranja Democrático, quando apoiantes de um candidato ao senado atacaram os adeptos da candidata desta formação política.
Foto: Reuters/M. Eshiwani
Alegações de fraude
Já há alegações de fraude. O líder da oposição, Raila Odinga, afirmou que o seu cartão de identidade foi usado para recensear outras pessoas. Em 2013, o equipamento electrónico para a contagem de votos falhou, alimentando suspeitas de fraude eleitoral. Em janeiro, o Presidente Kenyatta aprovou uma lei que impõe um recurso à contagem manual de votos caso o equipamento electrónico não funcione.
Foto: Reuters/M. Eshiwani
O problema das etnias
No Quénia, o voto geralmente é determinado pela etnia. O critério para as alianças políticas é a capacidade de angariar votos dos cinco principais grupos étnicos do país. Kenyatta e o seu vice, William Ruto, formaram uma aliança entre dois grupos étnicos: a maioria kikuyu, da qual origina o Presidente, e os kalenjin de Ruto. Estas duas etnias protagonizaram os confrontos violentos de 2007.