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Quénia quer proteção climática "made in" África

Philipp Sandner
4 de setembro de 2023

Com a Cimeira do Clima em África, o Presidente do Quénia, William Ruto pretende colocar o continente na vanguarda das energias renováveis e posicionar o país como um pioneiro na luta contra as alterações climáticas.

Estudante da Universidade de Strathmore, em Nairobi
Estudante da Universidade de Strathmore, em Nairobi, trabalha numa instalação solarFoto: Thomas Imo/photothek/IMAGO

Innocent Tshilombo percorreu um longo caminho como refugiado. Deixou a cidade de Goma, no leste da República Democrática do Congo (RDC), em 2009, e chegou ao campo de deslocados de Kakuma, no noroeste do Quénia, através do Uganda. Lá permaneceu por muitos anos - mas as condições precárias de vida em zonas remotas não lhe deram o que procurava.

"As pessoas nas zonas rurais têm maior probabilidade de ser mal servidas por recursos públicos, basicamente infraestruturas, quando se trata de estradas, redes de telecomunicações, incluindo Internet," relata.

Determinado a mudar as coisas, Innocent Tshilombo fundou a Kakuma Ventures e começou a instalar painéis solares e a configurar pontos de acesso à internet sem fio.

Ele argumenta que a sua empresa tem potencial para crescer "porque o modelo que construímos no campo de refugiados de Kakuma comprovadamente fornece apoio aos meios de subsistência dos refugiados e das comunidades anfitriãs".

E, uma vez que o campo está numa área rural, "também significa que a solução se aplica às pessoas que vivem em áreas rurais".

O projeto foi premiado e conseguiu arrecadar recursos internacionais. Tshilombo vive agora na capital do Quénia, Nairobi. Lá participará do programa-quadro da primeira Cimeira do Clima em África, que arrancou esta segunda-feira (04.09).

"De africanos para africanos"

O Presidente queniano, William Ruto, diz que será uma cimeira "de africanos para africanos". Vários chefes de Estado africanos confirmaram a presença no evento e também são esperados líderes de outras regiões, bem como mais de 13.000 participantes.

Niclas Svenningsen, que trabalha para a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas (UNFCCC, sigla em inglês), admite que o objetivo do evento é que se avance para a adoção e aplicação da "Declaração de Nairobi" que será divulgada na quarta-feira (06.09).

O Presidente do Quénia, William Ruto, quer assumir um papel de liderança na proteção do climaFoto: Ihsaan Haffejee/AA/picture alliance

Em busca de uma nova narrativa

O UNFCCC e outras organizações internacionais estão encarregues de organizar a Semana Africana do Clima, que deverá preparar o terreno para a Cimeira Mundial do Clima, a realizar-se no Dubai no final do ano.

A Declaração de Nairobi tem também como objetivo dar um impulso a esta iniciativa. "A declaração traça uma nova narrativa sobre a forma como África pretende enfrentar vários desafios em termos de natureza, energia, finanças, transportes e outras questões muito práticas num contexto africano", afirma Svenningsen.

"África é um continente muito verde e muito jovem", acrescenta. "A população irá duplicar nos próximos 30 anos e os desenvolvimentos e investimentos em infraestruturas irão ocorrer nos próximos dez a 20 anos."

Agora, diz Niclas Svenningsen, há um impulso para que África seja incluída nos esforços globais de combate às alterações climáticas. Além disso, a cimeira promete ser muito política devido à participação ativa dos chefes de Estado e de Governo – neste momento que é particularmente importante pôr finalmente em prática os objetivos climáticos de Paris.

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Liderança de Ruto criticada

Florence Gichoya também participará no programa-quadro da cimeira. Ela representa a aliança de organizações da sociedade civil para o acesso a energias limpas - a "Access Coalition" - com sede em Nairobi. Mas o seu tom é moderado: "Esperançosa, mas não otimista", é como descreve o seu estado de espírito antes da reunião.

"Estamos muito ansiosos por saber qual será o conteúdo da declaração. As organizações da sociedade civil não foram envolvidas nestas discussões", critica Gichoya e pergunta: "Será que vai refletir o que África quer? Será que dará resposta às necessidades de energia limpa em África?"

O Presidente Ruto e o seu ministro do Clima, Soipan Tuya, tiveram de ouvir previamente muitas críticas. O Quénia fez uma campanha intensa a favor dos investimentos e dos impostos sobre as energias fósseis, a aviação e o transporte marítimo.

A inclusão de locais remotos como o campo de refugiados de Kakuma faz parte da realidade africanaFoto: Laura Wagenknecht/DW

Alívio para os países industrializados?

"Nós queremos pagar. Não queremos que ninguém pague por nós", afirmou Ruto. Há quem receie que esta medida reduza a pressão sobre os países industrializados para que paguem pelas consequências das alterações climáticas, pelas quais são em grande parte responsáveis - o tema dominante da COP27, realizada em Sharm-el-Sheikh, em novembro passado.

Também o envolvimento pelo Quénia da empresa de consultoria norte-americana McKinsey, que se notabilizou no comércio de emissões e também ajudou a conceber a Iniciativa Africana para os Mercados de Carbono, tem sido uma fonte de ressentimento.

A McKinsey e outros actores dariam à cimeira uma agenda pró-ocidental, escreveram mais de 500 organizações da sociedade civil numa carta aberta. A liderança dos líderes e ministros africanos estaria, assim, a ficar para trás.

Alterações climáticas em contexto local

Apesar de todas as críticas à implementação, Florence Gichoya concorda com a pretensão de Ruto de organizar uma cimeira "de africanos para africanos". "Não podemos esperar que outros façam o que tem de ser feito em África", afirma a representante da Access Coalition.

As mensagens e também o financiamento têm de vir de África para encontrar soluções sustentáveis, diz ela: "Em África, sabemos onde estão os desafios e quais são as soluções."

Em entrevista à DW, Niclas Svenningsen, do UNFCCC, está convencido de que a cimeira e a Semana do Clima lançarão as bases para isso: "Quando nos sentarmos juntos, falaremos sobre as alterações climáticas no contexto das realidades locais em África".

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