Qual o legado de Cesária Évora dez anos após sua morte?
16 de dezembro de 2021
No aniversário de morte de Cesária Évora, o produtor Djô da Silva, que trabalhou por mais de duas décadas ao lado da cantora, diz que Cabo Verde poderia aproveitar mais do legado de Évora, como um ícone da música.
Em entrevista à DW África, Djô da Silva, que trabalhou durante 27 anos com a "Cize", diz que a construção de Museu Cesária Évora seria rentável financeiramente para o setor do turismo e seria a melhor homenagem para aquela que colocou a cultura cabo-verdiana no mapa de mundo da música.
DW África: Cabo Verde fez o suficiente para homenagear a Cesária Évora?
Djô da Silva: Acho que não. Cabo Verde também não está a aproveitar como poderia. Temos muitos turistas e vir até a ilha de Cesária Évora justamente para saber mais sobre a história dela. Mas o que existe não é nada extraordinário. Há muito tempo estamos à espera do museu, onde as pessoas possam ter mais informações sobre a história dela. Mas isso ainda não se realizou.
DW África: O que está dificultar a concretização deste museu?
DS: Falta vontade. É claro que economicamente o museu traz retornos. Estamos a ver o número de turistas aumentar cada vez mais. Sabemos que em cerca de cinco anos o museu pode recuperar os investimentos. É por isso que, para mim, é apenas uma questão de vontade dos políticos. Economicamente é viável. Quem sabe o que se passa em Cabo Verde, e conhece a sua história, sabe que é viável.
DW África: Qual seria a melhor forma de homenagear a Cesária Évora em Cabo Verde?
5 Mornas de Cesária Évora
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DS: Primeiro, ter um lugar digno onde as pessoas possam encontrar a história da Cesária Évora, ouvir a sua música. E através dela descobrir a cultura de Cabo Verde. O país pode aproveitar o sucesso dela para mostrar a sua cultura, mas isso ainda não está feito.
DW África: Na sua opinião, enquanto produtor, qual é o maior legado que Cesária Évora deixou para o mundo e para os cabo-verdianos?
DS: Eu penso que ela deixou um forte repertório musical. Ela colocou em evidência a força dos nossos autores e compositores. Este repertório não deve ser perdido, porque o mundo inteiro gostou. É importante protegê-lo.
DW África: Acha que os músicos da nova geração estão a seguir os passos de Cesária Évora na promoção da música e da identidade cabo-verdianas?
DS: Sim, acho que alguns estão. Temos jovens cantores de morna que se referem sempre à Cesária Évora, e a cantora ícone é um exemplo para os mesmos. Há uma nova geração que produz mais música urbana, e que segue menos os seus passos, mas que também respeita o que Évora fez. Mas os músicos de Cabo Verde, em geral, admiram-na muito.
DW África: Trabalhou com a Cesária Évora durante 27 anos. Como era Cesária?
DS: Cesária Évora era uma pessoa excecional porque era uma mulher muito livre. Fazia o que lhe apetecia – quando e como queria. Uma mulher que nunca fez nada para agradar aos outros. Era a Cesária Évora, gostassem os outros, ou não. Isso era muito forte, porque é raro ver um artista que não tenta agradar. Ela fazia o que gostava, e pronto. No fim, as pessoas gostam disso também. E, depois, a simplicidade. Mesmo com o sucesso, ela nunca mudou. E sempre disse que não saberia mudar. Cesária não mudava a sua atitude ao cantar numa grande sala, de qualquer país, ou num bar de Mindelo. Cantava sempre com a mesma emoção.
Dez cantoras dos PALOP que fazem sucesso na Europa
Cada vez mais cantoras da África lusófona singram na Europa. Cultura, histórias das suas pátrias e o papel da mulher na sociedade são temas recorrentes nas músicas. Cabo Verde é um dos países mais bem representados.
Foto: Wikipedia/Lindaines1995
Aline Frazão
Cantora e compositora de Luanda, detentora de uma voz doce e poética que contrasta com o caráter interventivo e político da sua música. Foi uma das vozes pela libertação dos 15 ativistas detidos em Angola em 2015. Perto de completar 30 anos, conta já com três discos no portfólio e inúmeras passagens por palcos internacionais.
Foto: P. Szymanski
Elida Almeida
Com 25 anos, Elida Almeida pertence à nova geração de músicos de Cabo Verde. Interpreta os ritmos da sua ilha natal, Santiago, como o batuco, funaná e tabanka. Na sua música, é frequente encontrar tópicos que visam a situação das mulheres em Cabo Verde, como a educação e a gravidez na adolescência.
Foto: DW/A. Gensbittel
Cesária Évora
Ícone maior da música cabo-verdiana, levou a história do seu país a todo o mundo. Fonte de inspiração e figura incontornável para as novas gerações conterrâneas. Faleceu em 2011, aos 70 anos. Em março, vai ser homenageada pela ONU no festival "Over the Border" que se realizará em Bona.
Foto: Over the Border Festival
Lura
Nascida em Portugal, só conheceu Cabo Verde na adolescência. A música é a forma de se aproximar das suas origens e dar a conhecer a história do país e do seu povo. Vê na mulher cabo-verdiana uma fonte de inspiração. Entre os reconhecimentos internacionais, destaca-se o álbum "Herança", que, em 2015, foi distinguido entre os dez melhores em todo o mundo, pela revista britânica "Songlines".
Foto: DW/A. Gensbittel
Mayra Andrade
É uma verdadeira cidadã do mundo, mas não esquece as origens cabo-verdianas. Canta em várias línguas, incluindo crioulo. Ao longo da carreira já colaborou com diversos artistas, como a conterrânea Cesária Évora. Chega a ser vista por alguns como a sua sucessora. Em 2008, foi considerada a artista revelação para a BBC3.
Foto: Sony Music
Sara Tavares
Portuguesa mas com as raízes cabo-verdianas bem presentes, a "terra mãe", como canta num dos seus temas. Conta com uma longa e sólida carreira que inclui colaborações com diversos artistas e projetos musicais e até uma participação no Festival Eurovisão da Canção. Depois de um hiato, voltou ao ativo e continua a reinventar-se como artista.
Foto: Günther Klebinger
Karyna Gomes
Em 2016, Karyna Gomes foi a primeira artista guineense a subir ao palco do Africa Festival, o maior e mais antigo festival de música africana na Europa, que se realiza anualmente na Alemanha. Misturando sons tradicionais e modernos, da sua voz saem as histórias da sua terra, com particular destaque para a força feminina.
Foto: DW/A. Gensbittel
Eneida Marta
Sonhadora e otimista que canta a Liberdade. Aliás, esta guineense nasceu quando o seu país caminhava para a independência. Além da música, abraça também as questões sociais: é embaixadora da boa vontade da UNICEF na Guiné-Bissau, focando-se no problema do casamentos infantis. Em 2017, passou pelo palco do Africa Festival, na Alemanha.
Foto: DW/J. Carlos
Mariza
Mariza nasceu em Moçambique, filha de mãe moçambicana pai português. Apesar de se destacar no fado, estilo tipicamente português, é uma artista versátil e não é difícil encontrar ritmos africanos no seu trabalho. Mundialmente reconhecida, esgota as salas de concertos por onde passa. Já foi por duas vezes nomeada para os reconhecidos prémios Grammy.
Foto: q-rious music
Deolinda Kinzimba
Pode ainda não andar pela ribalta internacional, mas, aos 20 anos, a angolana Deolinda Kinzimba fez história ao sagrar-se vencedora da terceira edição do programa "The Voice Portugal", em 2015. A poderosa interpretação de "I will always love you" de Whitney Houston conta com mais de 1 milhão de visualizações no YouTube. Em 2017, lançou o primeiro álbum.