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Quando termina a "sarna comunicacional" de Filipe Nyusi?

5 de novembro de 2021

Listar a sarna como doença respiratória foi a última falsidade proferida pelo Presidente de Moçambique no seu mais recente discurso à nação. Críticos analisam à lupa o discurso de Filipe Nyusi.

Foto: DW

Ouvir o Presidente de Moçambique, Filipe Nyusi, dizer coisas como "idiotos" ou mulheres "letantes" já deixou de chocar os moçambicanos. O que escandaliza agora são inverdades por ele proferidas, como, por exemplo, categorizar a sarna como doença respiratória. O facto aconteceu no seu último discurso à nação, a 24 de outubro, no contexto da pandemia da Covid-19.

Incrédula, a ativista social e política Quitéria Guirengane desabafa: "Temos muita vergonha que estejamos num país com falta de liderança. Este é o consenso nacional. Não sabemos como viemos parar aqui, mas sentimos que o buraco é muito mais fundo do que poderíamos imaginar."

Quitéria Guirengane: "O Presidente da República não pode continuar a brindar-nos com esta vergonha"Foto: privat

A ativista questiona inclusive como Filipe Nyusi pode representar o país em fóruns internacionais, diante de outros estadistas, "se quando está connosco mostra toda esta falta de direção".

"Entramos no consenso de estarmos a ser a sintonia mais desafinada no concerto das nações e o Presidente da República não pode continuar a brindar-nos com esta vergonha."

Guirengane recorda que não se trata apenas da questão da "sarna". Quando a situação da Covid-19 era crítica no país, "o Presidente apareceu publicamente a dizer que uma das provas de que a vacina era um meio de prevenção eficaz é que, das 14 pessoas que perderam a vida, em julho, 13 se haviam vacinado. Percebia-se que era o oposto do que estava escrito no documento. O Presidente da República quis fazer um improviso, que, mais uma vez, foi desastroso."

Alvo de chacota nas redes sociais

Por causa disso, Filipe Nyusi tem sido motivo de chacota nas redes sociais. É só fazer um discurso à nação que logo de seguida os "memes" da sua pessoa nascem como cogumelos. Mas há quem lamente a falta de tolerância para com o Presidente da República.

"Todo o ser humano é suscetível de cometer falhas", lembra o jornalista Gustavo Mavie, acrescentando que não se trata de ignorância, mas de lapsos linguísticos: "Isso até é estudado em algumas universidades. Na comunicação há momentos em que soltamos [palavras] que não são as que queríamos dizer. Às vezes, até pode ser um insulto, que é muito mais grave."

António Muchanga, deputado da RENAMOFoto: Roberto Paquete/DW

"Problemas de concentração"

Para António Muchanga, deputado da Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO), o maior partido da oposição, os discursos do chefe de Estado são uma oportunidade para expor as suas fragilidades, "para os parceiros de cooperação internacional avaliarem o tipo de pessoas com quem estão a cooperar".

"Acho que o Presidente da República tem problemas de concentração quando vai fazer os discursos. Não se prepara o suficiente, à altura do que vai dizer. Não assume a solenidade que as comunicações devem assumir. Para além desta questão, destes últimos incidentes, também disse uma vezes que, quando a população queimar a mata, os leões vão comer mandioca e maçaroca. É um discurso muito desfasado do contexto do leão", diz Muchanga.

Na página oficial do Presidente da República no Facebook, onde são transmitidos os discursos à nação, os internautas chegaram a sugerir que Nyusi estava embriagado, no dia 24 de outubro: "O Presidente bateu uns copos antes de vir à nação... Está a dar bandeira", lê-se num comentário. Outro afirmava: "Vou bazar, farto de ouvir este bêbado...vai mas é depor na tenda, bro, e traz o nosso dinheiro de volta".

"Não é por aí"

Gustavo Mavie condena estas reações, entendendo que se trata de um "julgamento à revelia".

"As pessoas nem imaginam que há vezes em que um chefe de Estado passa dias sem dormir. Sei disso porque trabalhei como jornalista durante muitos anos e já acompanhei casos de presidentes sem dormir", afirma.

Há muito que se questiona sobre a eficácia da assessoria do Presidente da República, mas também sobre a obediência de Nyusi a ela. Sobre estes constrangimentos Quitéria Guirengane não imputa a culpa apenas ao chefe de Estado.

"Na verdade, isso mostra uma falha sistemática do nosso Estado", comenta a ativista e política. "É uma falha do Presidente, mas também de todo o protocolo de Estado, que tem o dever e uma responsabilidade de fazer cumprir não só a lei, mas também a imagem que queremos projetar do nosso país dentro e além fronteiras."

As expetativas em relação à atuação de um Presidente da República são naturalmente grandes. Por isso é escrutinado incessantemente, o que é também um direito do eleitor. Porém, Gustavo Mavie sai em defesa de Filipe Nyusi.

"Passam a vida a vigiar os outros, a vigiar as coisas mais pequenas, em vez de tomar as coisas mais sérias. Penso que não é por aí que temos de avaliar este Presidente como estando a ser um mau Presidente, não é por aí", afirma o jornalista.

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