O Presidente moçambicano, Filipe Nyusi criticou duramente os guardas florestais e as autoridades locais na Zambézia por não protegerem devidamente as florestas. Mas o problema está em Maputo, dizem ativistas locais.
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As declarações do Presidente da República, Filipe Nyusi aquando da deslocação à Zambézia no início do mês, causaram alguma surpresa entre os populares. Nyusi criticou severamente os guardas florestais e outras autoridades locais, acusando-os de fechar os olhos à pilhagem da madeira em curso.
O Presidente disse mesmo suspeitar que as entidades responsáveis pela proteção do património florestal estão envolvidas diretamente no contrabando de madeira: "Vocês não veem o que estão a fazer? Ou os vossos olhos estão fechados com o dinheiro? Como é que a madeira é roubada da floresta e chega ao porto de Quelimane sem que seja intercetada?", disse Nyusi.
O Presidente lembrou os populares que Moçambique perde milhões com o contrabando de madeira. É preciso evitar que um pequeno grupo fique rico em detrimento da maioria dos moçambicanos, acrescentou: "Eu até sinto vergonha, quando vou visitar estes países e me perguntam: 'Como é a situação no seu país? Esta madeira, nós compramos lá a dez mil meticais (140 euros), mas aqui custa milhões de dólares'. Eu finjo que não sei de nada."
Ordens "vêm de cima"
A Direção Provincial da Agricultura da Zambézia, responsável pelos guardas florestais, não comenta as declarações de Filipe Nyusi. Remete apenas para os resultados da "Operação Tronco": no início do ano, as autoridades moçambicanas apreenderam mais de 150 mil metros cúbicos de madeira ilegal em seis províncias, incluindo na Zambézia.
Moçambique /Madeira (Novo) - MP3-Mono
Já Ângelo Amaro, diretor-executivo da organização não-governamental, Kukumbe, diz que a pilhagem dos recursos naturais não é culpa dos guardas florestais, ao contrário do que o Presidente moçambicano dá a entender. As ordens vêm de cima, acusa Amaro: "O Presidente não deveria dizer isso. O ministro dá ordens por telefonemas para a madeira passar até ao porto da Beira, por exemplo. Será que o guarda ou régulo comunitário tem autonomia de impedir? O Presidente sabe exatamente o que está a acontecer." Sucesso no combate do abate clandestinoAmade Naleia, representante do Fórum das Organizações Não-Governamentais da Zambézia (FONGZA), acrescenta que houve melhorias nos últimos meses: o corte e venda ilegal da madeira diminuíram significativamente com a intervenção das organizações da sociedade civil.
Ainda assim continua a haver obstáculos, denuncia Naleia: "Nós, muitas vezes, ficamos surpreendidos! Intercetamos na estrada um traficante com muita madeira no seu camião. Quando vamos avisar as autoridades, dois ou três dias depois, vemos que a madeira junto com o camião já não esta lá no local e o dono foi-se embora. Nós ficamos sem perceber o que se passa."
Os ciclistas do carvão de Sofala
Produzem-se diariamente mais de 15 toneladas de carvão vegetal em Sofala. Este é transportado de bicicleta para os clientes, percorrendo longas distâncias. O abate descontrolado de madeira está a causar desertificação.
Foto: Gerald Henzinger
Um ciclista de carvão
De distâncias que perfazem até cem quilómetros é transportado carvão de madeira, do interior, para segunda maior cidade moçambicana, a Beira. Este ciclista transporta cerca de 120 quilos de carvão que poderá vender por 650 Meticais (20 Euros).
Foto: Gerald Henzinger
A caminho
Os cerca de meio milhão de habitantes da Beira queimam diariamente 15 toneladas de carvão de madeira. O carvão vegetal é produzido no interior da província de Sofala e transportado de bicicleta até os clientes, o que representa um enorme esforço físico.
Foto: Gerald Henzinger
Bicicletas sobrecarregadas
Normalmente as bicicletas não oferecem lugar para mais de três sacos, se se quiser pedalar. Este transportador colocou seis sacos, ou seja cerca de 300 quilos de carvão, e empurra a bicicleta por detrás, guiando-a com duas cordas amarradas ao volante.
Foto: Gerald Henzinger
Pequenas reparações
As bicicletas usadas em Moçambique vêm habitualmente da Índia e têm uma qualidade duvidosa. Sob o peso do carvão as varetas das rodas partem com facilidade. As distâncias são muitas vezes tão grandes que dificilmente se fazem num dia, os ciclistas dormem por isso na berma da estrada.
Foto: Gerald Henzinger
Paisagem devastada
Não existe um verdadeiro controlo do desmatamento. No interior da Beira já quase não existem árvores. Quase todas elas foram abatidas e transformadas em carvão vegetal. O Governo, em colaboração com as autarquias, tenta travar a destruição ambiental. Agora cada aldeia tem uma cooperativa que distribui concessões aos produtores.
Foto: Gerald Henzinger
Desmatamento avança
Poucos produtores respeitam no entanto as normas. A erosão dos solos e a desertificação são as consequências do abate descontrolado.Torna-se cada vez mais difícil obter madeira para a produção. Não apenas devido aos pequenos produtores do negócio do carvão. Grandes empresas nacionais e internacionais, sobretudo chinesas, derrubam árvores e exportam os troncos.
Foto: Gerald Henzinger
Padre Emílio em Chissunguwe
O padre brasileiro Emílio Moreira defende os interesses dos produtores de carvão vegetal. A sua paróquia abrange as comunidades de Chissunguwe, Njangulo, Nhangau e Casa Partida. Estas comunidades situam-se entre 30 a 40 quilómetros da Beira. A imagem mostra uma visita do sacerdote à comunidade de Chissunguwe, na qual ele procura introduzir a plantação de legumes como alternativa ao carvão.
Foto: Gerald Henzinger
Lenha para carvão
Em lugares como Chissunguwe produz-se o carvão utilizado na Beira. Este monte de lenha arde já há alguns dias e deverá produzir três a quatro sacos de carvão, pesando 50 quilos. A lenha é recolhida a grande distância porque em Chissunguwe há anos que deixou de existir.
Foto: Gerald Henzinger
Nando - Produtor de carvão
Na localidade vizinha Njangulo ainda existe um pouco de floresta. Ali Nando produz o seu carvão vegetal. Desta pilha de lenha poderão resultar cerca de dez sacos de carvão.
Foto: Gerald Henzinger
Pilhas de lenha ardidas
Estas pilhas já arderam na totalidade e o proprietário aperta o último saco de carvão, que de imediato transportará de bicicleta para a Beira. A capital da província de Sofala é a maior cidade do centro de Moçambique e o maior mercado regional para o carvão vegetal.
Foto: Gerald Henzinger
A caminho dos clientes
Fontes de energia alternativas como gás ou electricidade não são acessíveis à maioria dos moçambicanos e, por isso, os produtores de carvão continuam a ter muita procura. Botijas de gás para cozinhar têm de ser importadas da África do Sul, isto apesar de Moçambique exportar gás para o país vizinho.
Foto: Gerald Henzinger
Pilhas de lenha nas serrarias chinesas
Desde o escândalo em torno da exportação de troncos inteiros por empresas chinesas, as mesmas começaram a trabalhar a matéria-prima em Moçambique. Desta forma, podem continuar a abater árvores e a exportar madeira. Os restos das serrarias são aproveitados pelos locais para a produção de carvão.