Alguns titulares de cargos públicos ainda não declararam bens desde a tomada de posse do novo Governo, em setembro de 2017. PGR promete apertar cerco aos infratores e analistas pedem revisão da lei de Probidade Pública.
Publicidade
Em Angola, os titulares de cargos públicos são obrigados a declarar os seus bens. Entretanto, desde a tomada de posse do novo Governo, em setembro de 2017, nem todos o fizeram. A Procuradoria Geral da República de Angola (PGR) promete apertar o cerco aos infratores.
A obrigação da declaração de bens por parte dos governantes está prevista no artigo 27 da Lei de Probidade Pública, em vigor desde 2010. Os titulares do Governo tinham 30 dias para declarar os seus pertences, a partir da data da posse. Volvidos seis meses, a PGR diz agora que nem todos cumpriram o que estipula a lei.
"O que é que estão a esconder? É uma falta de respeito autêntica ao Presidente da República. Estão a demonstrar claramente que estão a desrespeitá-lo", questiona Agostinho Sicato, do Centro de Debates e Estudos Académicos.
Quem ainda não fez a declaração de bens em Angola?
André Kivuandinga, jornalista da Nova Gazeta, aponta uma das causas da violação da lei. "Podemos enquadrar isso em falta de cultura para declaração de bens. Nós, os africanos, e em particular os angolanos não estamos acostumados nem em fazer um testamento. Também em questão da governação falta-lhes essa prática", diz.
Segundo Kivuandinga, outra razão pode estar ligada com a aquisição fraudulenta dos bens que devem ser declarados. "É que muitos desses bens foram conseguidos de uma forma ilícita. Então, declarar esses bens vai pressupor dizer como a pessoa os conseguiu", explica.
A PGR já avisou que a "impunidade tem dias contados". Para o politólogo Agostinho Sicato, a punição deve ser imediata. "Acho que podiam ser despoletados alguns mecanismos aqui. E a primeira medida seria que fossem exonerados das suas funções", sublinha.
Falta de clareza
Há muito que se defende que os bens declarados devem ser de domínio público, tendo em conta o princípio da transparência na gestão da coisa pública. No entanto, a lei não é clara em relação a esta matéria. Por isso, Sicato defende uma revisão da Lei de Probidade Pública.
"É imperativo que a lei seja revista, porque essa tal declaração de bens não tem sentido nenhum. Não tem sentido por uma razão: como é que alguém declara bens num envelope e apresenta à procuradoria ou às entidades com competência para o efeito e essas entidades não o podem abrir? É igual não declarar", explica.
Nos últimos dias, a PGR tem estado a constituir arguidos muitos cidadãos implicados em alegados atos de corrupção. É o caso de José Filomeno dos Santos, filho do ex-chefe de Estado, José Eduardo dos Santos, e Geraldo Sachipengo Nunda, atual Chefe de Estado Maior do Exército de Angola.
Agostinho Sicato quer que a PGR angolana vá ainda mais longe. Para o analista, é necessário investigar os vários outros atos de corrupção cometidos desde 2002, altura em que Angola alcançou a paz.
"Devem investigar todos, ainda que os implicados sejam antigos procuradores ou juízes. Eu não considero os que estão a ser investigados agora como os tais muito importantes como se está a publicizar. Nós estamos a investigar qual dinheiro? Nós estamos a investigar o dinheiro de agora. O dinheiro que precisamos investigar é o que vem desde 2002", opina.
Mesmo sem a Sonangol, Isabel dos Santos ainda tem um império empresarial
A mulher mais rica de África, filha do ex-Presidente José Eduardo dos Santos, foi exonerada da liderança da petrolífera estatal angolana. Mas continua a ter uma grande influência económica em Angola e Portugal.
Foto: DW/P. Borralho
Bilionária angolana diz adeus à Sonangol
A 15 de novembro, Isabel dos Santos teve de renunciar à presidência do conselho de administração da Sonangol. Em meados de 2016, o seu pai, o então Presidente José Eduardo dos Santos, nomeou-a para liderar a companhia petrolífera estatal. A nomeação era ilegal aos olhos da lei angolana. O novo Presidente angolano, João Lourenço, estava, por isso, sob pressão para demitir Isabel dos Santos.
Foto: picture-alliance/dpa
Carreira brilhante à sombra do pai
Isabel dos Santos, filha de José Eduardo dos Santos e da sua primeira mulher, a jogadora de xadrez russa Tatiana Kunakova, nasceu em 1973, em Baku. Durante o regime do seu pai, no poder entre 1979 e 2017, Isabel dos Santos conseguiu construir um império empresarial. Em meados de 2016, a liderança da Sonangol, a maior empresa de Angola, entrou para o seu currículo.
Foto: picture-alliance/dpa
Conversão aos princípios "dos Santos"
Isabel dos Santos converteu o grupo Sonangol, sediado em Luanda (foto), às suas ideias. Nomeou cidadãos portugueses da sua confiança para importantes cargos de gestão e foi muito criticada pela ausência de angolanos em posições-chave na empresa.
Foto: DW/N. Sul d'Angola
Presença firme nas telecomunicações
Mesmo após o fim da sua carreira na Sonangol, Isabel dos Santos continua forte no meio empresarial: possui 25% da UNITEL desde o seu lançamento, em 2001, a empresa tornou-se a principal fornecedora de serviços móveis e de internet em Angola. Através da UNITEL, dos Santos conseguiu estabelecer vários contactos comerciais e parcerias com outras empresas internacionais, como a Portugal Telecom.
Foto: DW/P. Borralho
Redes móveis em Portugal e Cabo Verde
Isabel dos Santos detém a participação maioritária na ZON, a terceira maior empresa de telecomunicações de Portugal, através de uma sociedade com o grupo português Sonae. Também em Cabo Verde, dos Santos - com uma fortuna estimada em 3,1 mil milhões de dólares, segundo a revista Forbes - está presente nas telecomunicações com a subsidiária UNITEL T+.
Foto: DW/J. Carlos
Expansão com a televisão por satélite
Lançada em 2010 por Isabel dos Santos, a ZAP Angola apresenta-se como o maior fornecedor de televisão por satélite no país. Desde 2011, a ZAP está presente também em Moçambique, onde conquistou uma parcela importante do setor. Em Moçambique, a empresa compete com o antigo líder de mercado, a Multichoice (DSTV), da África do Sul.
Foto: DW/P. Borralho
Bancos: o segundo pilar do império
Atrás das telecomunicações, o setor financeiro é o segundo pilar do império empresarial de Isabel dos Santos. A empresária detém o banco BIC juntamente com o grupo português Américo Amorim - o empresário português conhecido como "o rei da cortiça" que morreu em julho de 2017. É um dos maiores bancos de Angola, com cerca de 200 agências. É também o único banco angolano com agências em Portugal.
Foto: DW/P. Borralho
Com a GALP no negócio do petróleo
Também no petróleo, dos Santos fez parceria com Américo Amorim. Através da empresa Esperanza Holding B.V., sedeada em Amesterdão, a empresária angolana está envolvida na Amorim Energia que, por sua vez, é a maior acionista da petrolífera portuguesa GALP. A GALP também administra os postos de gasolina em Moçambique (na foto) e em Angola onde, curiosamente, compete com a Sonangol.
Foto: DW/B.Jequete
Supermercado em Luanda
Em 2016, abriu em Luanda o Avennida Shopping, um dos maiores centros comerciais da capital angolana. Várias empresas do império dos Santos operam neste centro comercial, como o Banco BIC, a ZAP e a UNITEL. Assim, a empresária beneficia em várias frentes do crescente mercado de bens de consumo em Luanda.
Foto: DW/P. Borralho
350 milhões de dólares em supermercados
Uma das maiores lojas do Avennida Shopping é o hipermercado Candando. É operado pelo grupo Contidis, controlado por Isabel dos Santos. Nos próximos anos, deverão ser construídos em Angola vários Candando. No total, a Contidis quer investir mais de 350 milhões de dólares nas filiais.