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Quem trava abusos da FRELIMO contra funcionários públicos?

11 de setembro de 2024

Funcionários do Estado são autorizados a faltar ao trabalho para receber a esposa do candidato presidencial da FRELIMO em Tete. Um ato que contradiz o discurso de Daniel Chapo. Interessará ao partido estancar desmandos?

Campanha eleitoral de Daniel Chapo, candidato presidencial da FRELIMO
Daniel Chapo, candidato presidencial da FRELIMO, durante campanha eleitoral em Quelimane, na ZambéziaFoto: Marcelino Mueia/DW

Uma carta a circular na redes sociais, atribuída ao Serviço Provincial de Assuntos Sociais de Tete e assinada pelo diretor Lourenço Mesa, solicita a todas direções provinciais que autorizem os funcionários públicos a faltarem ao serviço para receberem hoje, no aeroporto de Chingodzi, a denominada "mamã Gueta Chapo", esposa do candidato Daniel Chapo, que está em Tete para ações de campanha eleitoral.

Uma velha prática ilegal cometida pelo partido no poder, a Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO), que é tratada com indiferença pela justiça. Desta vez contradiz todo o discurso eleitoralista do candidato presidencial Daniel Chapo, que se afirma contra ilícitos.

O analista político Ricardo Raboco relativiza o caso, considerando que se pode tratar de uma iniciativa de membros da base, sem a anuência do topo do partido. Mas interessaria à FRELIMO estancar esses desmandos? A DW falou com o politólogo sobre o caso, que começa por comentar a aparente demonstração de abuso de poder por parte do Executivo da FRELIMO.

Politólogo Ricardo Raboco em entrevista à DW

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DW África: Trata-se de mais uma demonstração do abuso do poder do Governo da FRELIMO?

Ricardo Raboco (RR): A avaliar pelo histórico parece-me um bocado complicado dizer que é uma ação deliberada e intencional de abuso de poder, mas provavelmente o partido FRELIMO está naturalmente a aproveitar-se aqui das circunstâncias, porque há-de haver aqui uma responsabilidade moral do próprio partido. É que muitas vezes esses comandos não vêm da estrutura de topo do partido FRELIMO, é uma questão de base, porque muitos desses indivíduos que emitem esses comandos, como forma de retribuir essas confianças, emitem comunicados, emitem ordens que até certo ponto são ilegais, ofendem a moral e os bons costumes da administração em função pública, mas que não encontram uma espécie de repressão, uma espécie de condenação, nem que nem seja pública, mas dentro do próprio partido FRELIMO.

DW África: Estamos a falar de uma reforma que deveria ser promovida ao nível mais alto do partido para eliminar estes comportamentos desviantes?

RR: Naturalmente, porque quer me parecer que isto vai em contramão ao discurso que o próprio candidato presidencial do partido FRELIMO está a emitir nestes dias, quando diz claramente que quer combater a corrupção. A corrupção é um conjunto de práticas. Neste sentido, se um dirigente superior está a emitir um comunicado claramente a apelar que os funcionários da administração pública, que são funcionários pagos pelo Estado, a paralisar as suas ações, a paralisar as suas atividades, para se fazerem presentes na recepção de qualquer figura que seja, ou para fazerem campanha, isto pode roçar a questão do tráfico de influências, pode roçar o nepotismo, um conjunto de práticas que no final dão lugar à corrupção.

DW África: Esta é uma postura recorrente que, entretanto, nunca foi corrigida. Teria o partido, de facto, interesse em reverter esta anarquia?

RR: Vem daí a minha dúvida, volto a dizer. O candidato está a dizer que quer combater a corrupção. Mas nenhum partido que almeja conquistar o poder do Estado, implementar a democracia, combater a corrupção dentro do Estado, há-de ser bem sucedido se na sua estrutura interna não há esse sinal, não há esta prática.

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DW África: A esposa do candidato da FRELIMO às presidenciais também tem de merecer essas honrarias? Afinal, ela não é candidata, mas gente do governo convida ou obriga esses funcionários a receberem a "mamã Gueta Chapo", como eles próprios designam, no aeroporto de Tete...

RR: É muito complicado que um funcionário público, alguém que se quer íntegro, chame "mamã" a uma figura, qualquer que seja. Em segundo lugar, se de facto o candidato Daniel Chapo quer ganhar a mente e o coração dos moçambicanos, tem de o mais rapidamente possível distanciar-se abertamente destas práticas, porque estas práticas vão manchar a sua imagem, vão manchar o seu discurso.

DW África: Daniel Chapo, numa entrevista, garantiu ter uma imagem imaculada e até convidou a sociedade a apontar sombras no seu comportamento enquanto político. Mas hoje ele próprio permite abusos dessa natureza. Não deveria ter sido ele o primeiro, desde o início da campanha, a apelar para posturas mais transparentes e idóneas no seio do seu próprio partido?

RR: Permita-me fazer uma comparação: quando o Presidente de Angola, João Lourenço, foi questionado logo nos primórdios do seu primeiro mandato, sobre porque só agora ele se dizia um combatente ferrenho da corrupção, enquanto ele próprio fazia parte do governo do seu antecessor. Ele disse que era tão pequeno na altura para, a partir do sistema, ele [poder] combater. Então, enquanto Presidente, tem condições de fazer isso. E provavelmente pode ser isto o que está a acontecer com Daniel Chapo.

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