Angola celebra esta terça-feira (04.04) 15 anos de paz, de Cabinda ao Cunene. Mas Cabinda é a região angolana onde há mais tensão militar, sublinha o padre Jorge Congo. Diz que faz tudo parte da estratégia do Governo.
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Cabinda nada ganhou com esta paz, considera Jorge Casimiro Congo. Segundo o defensor da auto-determinação do povo cabindês, com o calar das armas em Angola, a tensão militar aumentou no território.
Daí o incremento de dificuldades de todo nível, apesar da riqueza da região. "São 15 anos de nulidade, 15 anos de sofrimento e 15 anos de bulldozer, isto é, o desaparecimento de quase tudo.", explica o sacerdote em entrevista à DW África.
"O Governo angolano joga com o tempo, o tempo das gerações mais lúcidas acabar, o tempo do cansaço político das pessoas e sobretudo o tempo do desespero das esperanças da população de Cabinda acabar", afirma. "É o que temos agora e o que vamos viver agora", conclui o docente universitário.
Quinze anos de "paz militarizada" em Cabinda
Embora se fala de paz, Cabinda é o território angolano onde a presença militar é maior. Casimiro Congo diz que faz tudo parte da estratégia do Governo angolano.
"Ficaram só alguns líderes, uns estão no quartel general da região militar e outros continuam a resistir e vão sofrendo as traições até dos seus próprios", conta o sacerdote.
Ao mesmo tempo, denuncia ainda Jorge Congo, debilita-se também o espaço de expressão no território.
Desertificação
O docente mostra-se ainda indignado com o que chama de "desertificação de Cabinda", isto é, a saída dos jovens da província por falta de emprego e de oportunidades.
"Estamos a ver toda a juventude na flor da idade a partir", lamenta.
O campo petrolífero do Malongo "deu o tom", em 2015, com despedimentos de trabalhadores de empresas prestadoras de serviços à Chevron, exemplifica Jorge Congo, "tirando todas as instituições e todos os departamentos que podiam eventualmente ter cabindas e obrigou-os a todos a irem para Luanda".
"O Malongo deu esse mote e o Governo vai continuando", critica. "Sem investimentos aqui, evidentemente que não há empregos".
Dez anos de paz em Angola
No dia 4 de Abril de a 2002 foi assinado o acordo de paz entre o governo do MPLA – Movimento Popular de Libertação de Angola - e a UNITA - União Nacional para a Independência Total de Angola - , as duas formações políticas que mais influência tinham e têm no país. Dez anos depois, o que como está o país em termos de democracia, desenvolvimento humano, económico e social?
Foto: AP
À terceira foi de vez
A 4 de abril de 2002, o chefe das forças armadas do governo do MPLA, General Armando da Cruz Neto (esq.), e o chefe do estado-maior da UNITA, General Abreu Muengo Ukwachitembo Kamorteiro, trocam o acordo de paz assinado na Assembleia Nacional, em Luanda. Foi o terceiro acordo entre estas duas frações da guerra civil em Angola depois de Bicesse (Portugal) em 1991 e Lusaka (Zâmbia) em 1994.
Foto: picture-alliance/dpa/dpaweb
Como tudo começou
A guerra começou com a luta contra o poder colonial. Em 1961 vários grupos lutaram contra os portugueses. O MPLA, apoiado pela ex-União Soviética e por Cuba foi um desses grupos, assim como a UNITA que, inicialmente, teve o apoio da China, e a FNLA que teve o apoio de Mobuto Sese Seko, na altura presidente do então Zaire. Na foto: soldados portugueses em Angola no ano de 1961.
Foto: AP
Guerra entre iguais
Após a saída dos portugueses e a independência formal, a 11 de novembro de 1975, os três movimentos de libertação MPLA, UNITA e FNLA entraram em conflito. O MPLA de orientação marxista contou com apoio soviético e cubano. A UNITA recebeu apoio dos Estados Unidos da América e de tropas sul-africanas.
Foto: picture-alliance/dpa
Refugiados de guerra
Segundo dados do ACNUR, o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados, mais de 600 mil angolanos refugiaram-se no estrangeiro e cerca de 4 milhões dispersaram-se pelas regiões do próprio país. Na fotografia: refugiados angolanos num acampamento próximo do Huambo no ano de 1999.
Foto: picture-alliance / dpa
Retirada dos soldados cubanos
O general cubano Samuel Rodiles, o general brasileiro Péricles Ferreira Gomes, chefe de um grupo de observadores da ONU e o general angolano Ciel Conceição, a 10 de janeiro de 1989 (da esq. a dt.). Dia em que os primeiros três mil soldados cubanos sairam do país. A retirada foi fixada num acordo assinado em 1988, entre a África do Sul, Cuba e Angola. Cuba orientava o MPLA militarmente desde 1975.
Foto: picture-alliance/dpa
Apoio da ex-República Democrática da Alemanha ao governo do MPLA
O Presidente de Angola, José Eduardo dos Santos, visitou no dia 14 de outubro de 1981 o Muro de Berlim do lado da Alemanha Oriental (RDA). Na Porta de Brandemburgo, recebeu as saudações das tropas de fronteira da República Democrática da Alemanha do Tenente-General Karl-Heinz Drews.
Foto: Bundesarchiv
Primeira tentativa falhada em 1991 e 1992
Depois do acordo de paz de Bicesse (Estoril, Portugal) de 1991, realizaram-se as primeiras eleições presidências do país em 1992. O candidato do MPLA, José Eduardo dos Santos, saiu vencedor, mas sem maioria absoluta na primeira volta. Jonas Savimbi, o líder da UNITA, não aceitou o resultado e nunca chegou a haver uma segunda volta das eleições. A guerra continuou.
Foto: dapd
Segunda tentativa falhada em 1994
Depois do acordo falhado de Bicesse (Portugal) de 1991, houve uma segunda tentativa em Lusaka, na Zâmbia, no ano de 1994. O presidente da Zâmbia, Frederick Chiluba (centro), levanta as mãos do presidente angolano, José Eduardo dos Santos (esq.), e do chefe do movimento de guerrilha UNITA, Jonas Savimbi. Eles celebram o protocolo de Lusaka, mas o país acabou por entrar novamente em guerra.
Foto: picture-alliance/dpa
A morte de Jonas Savimbi
Fevereiro de 2002: Jonas Savimbi, o líder da UNITA, é morto pelos soldados governamentais no leste de Angola. Com a morte da pessoa, que era considerada a mais carismática da oposição em Angola, abriu-se uma nova oportunidade para a paz.
Foto: AP
Paz sem satisfação
Desde 2011 jovens saem às ruas, um pouco por todo o país, para protestar contra os 32 anos de governo do MPLA. Exigem eleições livres e transparentes e o fim do governo de José Eduardo dos Santos. Na imagem: manifestantes em Benguela.
Foto: DW
Petróleo e pobreza
Após 10 anos de paz, petróleo e pobreza abundam no país. De acordo com as Nações Unidas, o petróleo representa 96% das exportações do país. No entanto, de acordo com o Banco Mundial, em 2010, uma em seis crianças morria nos primeiros cinco anos de vida e grande parte da população angolana continua a viver na pobreza. (Autora: Carla Fernandes; Edição: Johannes Beck)