Racismo e brutalidade são comuns na atuação da polícia alemã
Melina Grundmann
12 de novembro de 2020
Uma equipa de especialistas em criminologia da Universidade do Ruhr, em Bochum, esteve vários anos a investigar a atuação da polícia da Alemanha e concluiu que os estrangeiros são menosprezados pelas autoridades.
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O alemão de raízes libanesas Omar Ayoub estava a quebrar o jejum com a família durante o mês do Ramadão quando a polícia lhe bateu à porta para investigar uma alegada denúncia de desordem pública.
"Chamaram-nos ‘escumalha libanesa’, ‘estrangeiros sujos’ e assim por diante. Mais tarde, a minha irmã disse-me que, depois de me terem levado, um dos oficiais disse: ‘Este não é o vosso país e não se podem comportar como animais aqui’", recorda em declarações à DW África.
Segundo Omar Ayoub, ele e a sua família foram torturados pela polícia da Alemanha, o que o levou a apresentar queixa contra as autoridades. A polícia não quis comentar o caso de Omar Ayoub, escusando-se com o facto de a situação estar sob investigação.
Racismo é típico
Laila Abdul-Rahman é criminologista e faz parte de uma equipa de investigação da Universidade do Ruhr em Bochum que estudou a aplicação de violência por parte da polícia alemã com base na origem étnica. Para a investigadora, o racismo é uma "situação típica" detetada no comportamento das autoridades.
"O que ouvimos muitas vezes é que ninguém acredita neles... Tudo o que eles dizem é questionado. Enquanto que aos agentes da polícia é-lhes dada mais credibilidade", relata a criminologista.
Para o estudo "Uso excessivo da força policial na Alemanha", os investigadores da Universidade do Ruhr de Bochum entrevistaram mais de três mil pessoas e descobriram que não ser caucasiano ou pertencer a minorias étnicas estava associado a um tratamento mais severo por parte das autoridades.
Laila Abdul-Rahman diz que esse tipo de preconceito tem consequências graves: as vítimas de violência policial acabam muitas vezes por perder a fé no Estado e nas suas instituições. "As vítimas frequentemente não apresentam queixa porque simplesmente não confiam no sistema. Precisamos realmente de lançar luz sobre esta figura oculta", assevera.
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Mais supervisão
Para os criminologistas da Universidade do Ruhr em Bochum é necessária uma supervisão externa independente para melhorar a situação do racismo entre as forças policiais da Alemanha. No entanto, essa posição é rejeitada pelas representantes dos agentes de autoridade.
"Vivemos num país onde prevalece o Estado de Direito e como oficial da polícia tenho plena confiança neste Estado", diz Michael Mertens do Sindicato da Polícia Alemã.
"Temos mecanismos de controlo que funcionam. Pode apresentar uma reclamação formal ou apresentar queixa. Devemos apoiar-nos nestes métodos de confiança", frisou.
Segundo Michael Mertens, a maioria das pessoas na Alemanha tem grande confiança na polícia, mas reconhece que é necessário um diálogo mais aberto entre a polícia e os cidadãos.
Tobias Singelnstein, investigador que liderou o estudo, alerta que o tamanho da amostra não permite generalizar as conclusões da investigação a toda a Alemanha. No entanto, o criminologista está convencido de que os resultados do estudo são motivo de preocupação e exige uma investigação mais aprofundada na Alemanha.
Protesto contra o racismo nos cinco cantos do mundo
A morte de George Floyd move pessoas em todo o mundo. Apesar das restrições devido à pandemia da Covid-19, centenas de milhares de manifestantes decidiram sair às ruas e protestar contra o racismo sistémico.
Foto: picture-alliance/AP Photo/T. Hadebe
Lisboa: Agir agora!
Embora a manifestação não tenha sido autorizada, a polícia permitiu que os participantes avançassem. Em Portugal, também há violência policial contra a população negra. Em janeiro de 2019, quando centenas de pessoas se manifestaram espontaneamente, após um incidente no bairro da Jamaica, a polícia disparou balas de borracha.
Foto: picture-alliance/NurPhoto/J. Mantilla
Paris: Protesto no "Champ de Mars"
Nos últimos dias a polícia francesa tem dispersado manifestantes com gás lacrimogéneo nas manifestações nas proximidades da Torre Eiffel e em frente à embaixada dos EUA. No entanto, milhares de pessoas saíram à rua - mesmo para além de Paris - contra o racismo. A violência policial contra a população negra é particularmente generalizada nos subúrbios.
Foto: picture-alliance/Photoshot/A. Morissard
Manifestação apesar da proibição
A Bélgica, assim como a maioria dos países europeus, tem uma quota-parte na exploração e subjugação colonial de outros continentes. A atual República Democrática do Congo foi, em tempos, propriedade privada do Rei Leopoldo II, que estabeleceu um regime racista. Em Bruxelas, Antuérpia e Liège, houve manifestações contra o racismo, apesar das proibições impostas devido à Covid-19.
Foto: picture-alliance/abaca/B. Arnaud
Munique: Baviera colorida
Uma das maiores manifestações da Alemanha teve lugar em Munique, onde se reuniram 30.000 pessoas. Colónia, Frankfurt e Hamburgo também foram palcos de grandes manifestações. Em Berlim, a polícia teve de bloquear temporariamente as estradas de acesso à Alexanderplatz, porque havia demasiadas pessoas.
Foto: picture-alliance/Zumapress/S. Babbar
Viena: 50 mil contra o racismo
Na capital austríaca de Viena, reuniram-se 50 mil pessoas, segundo a polícia local. Esta foi uma das maiores manifestações dos últimos anos, incluindo o escândalo de Ibiza e a espetacular implosão da coligação de governo de direita em 2019.
Foto: picture-alliance/H. Punz
Sófia: Oposição ao racismo
Como a maioria dos países europeus, a Bulgária proíbe a realização de agrupamentos com mais de dez participantes. No entanto, centenas reuniram-se na capital da Bulgária, Sófia. Juntas, gritaram as últimas palavras de George Floyd antes de morrer: "Não consigo respirar", mas também chamaram a atenção para o racismo na sociedade búlgara.
Foto: picture-alliance/AA
Turim: Protesto com máscara
Esta mulher em Turim agrafou a sua preocupação política à mascára necessária num dos países mais afetados pela Covid-19: "As vidas negras também contam em Itália". As manifestações, incluindo em Roma e Milão, serão os maiores aglomerados registados desde o início das medidas de combate ao coronavírus. A Itália é um dos principais países de acolhimento de emigrantes africanos da União Europeia.
Foto: picture-alliance/NurPhoto/M. Ujetto
Cidade do México: Floyd e Lopez
No México, não é apenas a morte de George Floyd que está a perturbar o país, mas também o destino semelhante do pedreiro Giovanni Lopez. Foi detido em maio, no estado ocidental de Jalisco, porque não estava a usar máscara. Presume-se que morreu vítima de violência policial. Após a publicação de um vídeo da operação, os manifestantes mexicanos intensificaram os protestos.
Foto: picture-alliance/Zumapress
Sydney: Racismo contra os aborígenes
O rali em Sydney começou com uma cerimónia tradicional de fumo. Aqui, a solidariedade dos pelo menos 20.000 participantes foi dirigida não só a George Floyd, mas também aos australianos da população aborígene, que também foram vítimas de violência policial racista. Os manifestantes exigem que ninguém continue a morrer sob custódia policial.
Foto: picture-alliance/NurPhoto/I. Khan
Pretória: Com o punho levantado
O punho levantado no ar é um símbolo do movimento "Black Lives Matter". Mas o gesto é muito mais antigo. Quando o regime do apartheid na África do Sul libertou Nelson Mandela da prisão, em fevereiro de 1990, ele levantou o punho no seu caminho para a liberdade, tal como este manifestante em Pretória. Na África do Sul, os brancos continuam a ser frequentemente favorecidos.