RDC apresenta queixa contra a Apple por uso de minerais
Sandrine Blanchard | Zanem Zaidi
20 de dezembro de 2024
A República Democrática do Congo (RDC) apresentou uma queixa contra a Apple, acusando a tecnológica de se abastecer de minerais de minas congolesas ilegais. A ação foi movida nos tribunais de França e Bélgica.
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De acordo com as autoridades da RDC, as filiais da Apple na Europa são acusadas de práticas graves, como ocultação de crimes de guerra, branqueamento de minerais de conflito, receção de bens roubados e promoção de práticas comerciais enganosas. Os advogados do país alegam que a empresa utiliza uma retórica enganadora para assegurar aos consumidores que a sua cadeia de abastecimento é ética e sustentável.
Hypocrate Marume, representante da sociedade civil no Kivu Sul, elogiou a iniciativa do Governo congolês e destacou a urgência de proteger as populações afetadas pelo tráfico de minerais. "É um grande alívio para nós, a população do Leste", afirmou. Marume apelou ainda ao apoio de organizações da sociedade civil para garantir que os advogados da RDC consigam obter indemnizações pelos danos causados.
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Falta de resposta da Apple
Esta queixa surge após uma notificação formal enviada em abril passado, à qual a Apple não terá respondido. Na altura, a empresa negou as acusações de envolvimento no uso de "minerais de sangue" – recursos extraídos em condições de exploração ou sob controlo de grupos armados. Agora, a RDC alega ter obtido novas provas, incluindo testemunhos de denunciantes, que reforçam as acusações.
Um comunicado divulgado pelos advogados congoleses afirma que o objetivo do processo judicial é confrontar empresas e indivíduos envolvidos na extração e comercialização de minerais saqueados na RDC.
Expulsão de congoleses de Angola vitima crianças
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Situação crítica nas minas congolesas
A exploração mineral nas províncias de Kivu e Katanga permanece amplamente desregulada. Empresas e grupos armados controlam concessões mineiras sem supervisão das autoridades, que muitas vezes não conseguem cobrar impostos ou proteger as populações locais.
Ativistas ambientais também apontam falhas no Governo congolês, acusando-o de não cumprir o seu dever de salvaguardar os recursos naturais do país. Um ativista, que pediu anonimato, afirmou que as autoridades "vendem" zonas mineiras sem assegurar benefícios às comunidades circundantes, estabelecendo paralelos com a exploração de hidrocarbonetos.
Embora muitos cidadãos apoiem a queixa apresentada contra a Apple, outros consideram que o Governo deveria primeiro focar-se na repressão dos operadores ilegais que facilitam a exportação de minerais para países vizinhos como o Ruandae o Uganda.
O caso, agora nos tribunais europeus, poderá determinar um novo capítulo na luta pela transparência e justiça na exploração dos recursos naturais da RDC.
A "maldição dos recursos" na República Democrática do Congo
O cobalto e o coltan são minérios abundantes na República Democrática do Congo. Mas, a par com a instabilidade regional, estes recursos atraem milícias, exploração e violência.
Foto: picture-alliance/dpa/J. Bätz
Recursos atraem violência e oportunistas
Nas províncias da região oriental da República Democrática do Congo (RDC), tesouros como ouro e estanho atraem milícias oportunistas. Estes grupos violentos exploram pessoas, incluindo crianças, na extração dos chamados "minerais de conflito" – como são o ouro, o cobalto e o coltan. Com as receitas angariadas, os grupos compram armas para conquistar mais territórios e assim, perpetuam o conflito.
Foto: picture alliance / Jürgen Bätz/dpa
Proteger os cidadãos e a exploração legal
A Missão das Nações Unidas na República Democrática do Congo (MONUSCO), a maior e mais cara missão de paz da ONU, tem vindo a trabalhar na estabilização da situação nas províncias do norte e do sul de Kivu, que estão no centro da violência do país. As forças de segurança patrulham aldeias mineiras como Nzibira, localizada na margem da Zola Zola, uma mina legal de exploração de cassiterita.
Foto: picture-alliance/dpa/J. Bätz
Pagar “o preço humano” por telemóveis
A cassiterita é apenas um dos minerais usados na fabricação de telemovéis. Metade da produção mundial destes minerais vem da África Central. A exportação de estanho, ouro e outros minérios da RDC tem estado sob vigilância desde 2010, altura em que entrou em vigor, nos Estados Unidos da América, a lei que exige que as empresas americanas assegurem que não trabalham com "minerais de conflito".
Foto: picture-alliance/dpa/D. Karmann
Comprovar a legalidade dos minerais
Um cartaz em Nzibira explica como os sacos de minerais precisam de ser devidamente selados e rotulados por um inspetor de minas para que a sua origem legal possa ser provada às empresas dos EUA. No entanto, o sistema apresenta muitas falhas. As minas ilícitas podem simplesmente vender os seus "produtos" no mercado negro ou contrabande-á-los numa mina legal, embalando-os lá.
Foto: picture-alliance/dpa/J. Bätz
Exploração de crianças
Apesar dos esforços levados a cabo por organizações, as violações de direitos humanos continuam a existir na exploração de minérios na RDC. Crianças como Esperance Furahaare, que foi raptada e violada por uma milícia quando tinha 14 anos, são vítimas comuns da exploração e violência.
Foto: picture-alliance/dpa/J. Bätz
Impacto ambiental
As minas, que são difíceis de controlar, também podem prejudicar o meio ambiente e as comunidades vizinhas. Nas minas ilegais, acontece frequentemente, os esgotos misturarem-se com as águas locais, poluindo o abastecimento.
Foto: picture-alliance/dpa/J. Bätz
Futuro pouco claro para a legislação
Os responsáveis pelas leis nos EUA estão a tentar avançar com um projeto de lei que poderá eliminar a reforma de 2010 - que exige que as empresas assegurem que não trabalham com "minerais de conflito". Os legisladores argumentam que a Lei Dodd-Frank tem reprimido o desenvolvimento económico do país e não teve efeito prático na exploração na África Central.