RDC: Futuro de Joseph Kabila pode passar pela Presidência
9 de dezembro de 2018O Presidente da República Democrática do Congo, Joseph Kabila, vai deixar o cargo após as eleições deste mês, mas espera continuar ativo na resolução dos problemas que esta "complicada nação" enfrenta. Em entrevista à agência de notícias Associated Press, o chefe de Estado congolês não descarta totalmente uma nova candidatura: e será elegível para as presidenciais em 2023.
"Não vou descartar nada na vida", disse Joseph Kabila. "Desde que se esteja vivo e se tenha ideias fortes, uma visão, nunca se deve descartar nada".
Kabila afirma que fez o que podia em benefício da RDC desde que chegou ao poder, em 2001, depois do assassinato do seu pai, Laurent Kabila. Mas admite que ainda há mais a fazer.
Memórias de Mobutu
Declarações deste género preocupam a oposição congolesa, que teme que Joseph Kabila governe nos bastidores após abandonar a Presidência, caso o seu potencial sucessor favorito e antigo ministro do Interior, Emmanuel Ramazani Shadary, vença a 23 de dezembro.
Jospeh Kabila, de 47 anos, desvaloriza estas preocupações, afirmando que a Constituição deixa claro que este tipo de esquema não é possível. Ainda assim, serve de autoridade moral para a recém-criada coligação política Frente Comum para o Congo, mantendo-se perto do poder.
O actual chefe de Estado poderá concorrer novamente à Presidência em 2023, já que a Constituição da RDC proíbe apenas três mandatos sucessivos. Para já, afirma que deverá manter-se no papel de conselheiro: "Se alguém quiser os meus conselhos, espero que venham ter comigo e perguntem".
A perspectiva de mais Kabila nos próximos anos traz à memória de muitos congoleses o longo regime de Mobutu Sese Seko, que liderou o país durante mais de três décadas. Kabila, por sua vez, defende o seu legado, apontando para vitórias eleitorais anteriores, e parece estar a ponderar o futuro – qualquer que seja o seu papel. "O trabalho neste país nunca chegará ao fim", considera.
Uma transição problemática
A RDC poderá estar perante aquela que será a primeira transferência de poder democrática e pacífica desde a sua independência da Bélgica, em 1960. Em causa está um vasto país abençoado com triliões de dólares em recursos naturais, mas há muito desestabilizado por dezenas de grupos rebeldes.
Agora, uma nova epidemia de ébola, a segunda maior da história, representa uma nova ameaça à eleição, cujos adiamentos desde 2016 levaram a protestos, muitas vezes mortíferos, contra a permanência de Joseph Kabila no poder além do fim do seu mandato. O Governo justificou os atrasos com as dificuldades na organização das eleições perante o surgimento de uma nova onda de insurgência violenta.
Os críticos dos adiamentos " deviam ser humildes o suficiente para perceberem que o Congo é, em si, um desafio e que o processo eleitoral é um desafio ainda maior", diz Kabila. Qualquer país, sejam os Estados Unidos ou a França, dariam prioridade à segurança e não às eleições, acrescenta.
Indignados com a pressão em casa e na comunidade internacional – incluindo sanções da União Europeia contra Shadary por obstrução ao processo eleitoral congolês e repressão de manifestantes – Kabila e a sua administração têm vindo a rejeitar o que classificam como interferência nos assuntos internos da RDC e prometeram financiar esta eleição sozinhos, sem fundos externos.
Kabila considera que as sanções contra aquele que é considerado o seu delfim são "injustas e ilegais". Shadary ou quem quer que seja eleito "será Presidente deste país e não presidente da Europa. Deus nos livre", diz Kabila, entre risos. A cooperação com a Europa, ainda assim, continuará, "para que um dia eles vejam a luz, porque estão na completa escuridão. Ou talvez deva dizer que estão num estado de negação".
Numa aposta ambiciosa – e, para muitos, preocupante – o país vai também utilizar máquinas de voto pela primeira vez nesta eleição, levantando questões entre especialistas, diplomatas e organizações de defesa dos direitos humanos sobre a forma como este país de 40 milhões de eleitores e fracas infraestuturas poderá ter sucesso.
Os dois principais partidos da oposição congolesa uniram forças depois de abandonarem um pacto mais abrangente para apoiar um único candidato. Félix Tshisekedi representa o seu partido – o mais proeminente do país – e também o de Vital Kamerhe. Fayulu Madidi é o outro candidato da oposição. Muitos temem que esta divisão possa diminuir as hipóteses de derrotar Shadary.