RDC: Manifestantes invadem campos da missão de paz da ONU
John Kanyunyu | tms | com agências
26 de novembro de 2019
Residentes de Beni acusam MONUSCO de não fazer nada para travar ataques de rebeldes no leste do país. Exército da República Democrática do Congo e missão das Nações Unidas prometem operação conjunta para garantir a paz.
Publicidade
Manifestantes em cólera incendiaram esta segunda-feira (25.11) a prefeitura de Beni e atacaram dois campos das Nações Unidas para denunciar a inação após um novo massacre de oito civis durante a noite. Pelo menos quatro civis morreram no protesto, segundo as autoridades congolesas.
O exército congolês, a polícia e as forças de manutenção da paz da ONU – a MONUSCO – tentaram dispersar os manifestantes que exigiam a saída da missão da ONU na RDC, acusada de inação contra os rebeldes das Forças Demoráticas Aliadas (ADF, sigla em inglês). Nos últimos cinco anos, este grupo matou centenas de pessoas na região.
A ira dos cidadãos foi provocada por um novo massacre que começou na noite de domingo e resultou na morte de oito pessoas no bairro de Masiani, localizado a oeste da cidade e onde as Forças Decmoráticas Aliadas nunca tinham operado até agora. O grupo rebelde do Uganda é mais ativo na parte nordeste da cidade de Beni.
Um total de 77 civis foram mortos desde 5 de novembro em Beni e arredores (Kivu do Norte), de acordo com as últimas estatísticas do barómetro de segurança de Kivu, o Grupo de Estudo do Congo (GEC).
"Operações conjuntas" em resposta
Os manifestantes incendiaram a prefeitura de Beni antes de atacar uma das bases da MONUSCO em Boikene, onde haveria dois mortos, incluindo um civil e um soldado congolês. Mais tarde, as autoridades confirmaram haver pelo menos quatro civis mortos.
"Todo a gente sabe que a MONUSCO não está a fazer o seu trabalho. Não somos totalmente contra a MONUSCO, mas, se pelo menos estivesse a fazer o seu trabalho, as coisas seriam diferentes. A Monusco não nos está a ajudar”, afirma um dos manifestantes.
RDC: Manifestantes invadem campos da missão de paz da ONU
Após o saque a uma das bases da Monusco em Beni, os manifestantes avançaram para outra base, a maior, no norte da cidade, para exigir novamente a retirada dos capacetes azuis.
A Presidência da República Democrática do Congo anunciou, entretanto, a realização de "operações conjuntas" entre o exército nacional e a MONUSCO para "assegurar a paz e a segurança da população civil" naquela região.
Num comunicado, a Presidência congolesa anunciou também a "instalação de um quartel-general avançado das forças armadas em Beni", em resultado de uma reunião urgente de um "conselho de segurança", em Kinshasa, que, no entanto, não especificou nenhuma data para o início das operações.
MONUSCO causa "mal-estar"
Ao mesmo tempo, a presidente do Parlamento da RDC, Jeanine Mabunda, afirma que a missão das Nações Unidas na República Democrática do Congo "não pode permanecer interminável".
"Há um mal-estar entre a presença, o custo da MONUSCO na República Democrática do Congo, e os resultados obtidos", referiu Jeanine Mabunda, em declarações à agência France-Presse, considerando que "é legítimo que as populações questionem porque é que esta força persiste na RDC".
"Faz 20 anos que a MONUSCO está na RDC, deve ser uma das missões mais longas e mais antigas do mundo, são gastos quase mil milhões de dólares por ano", apontou Mabunda, em visita a Paris. Mas, "são uma força de manutenção de paz e as características do seu mandato são limitadas na sua capacidade de resposta", acrescentou.
Entretanto, a igreja católica na RDC denunciou esta segunda-feira o massacre de mais de 80 civis neste mês na cidade de Beni. A Conferência Episcopal Nacional do Congo diz ter observado também que "tropas estrangeiras estão a alimentar" confrontos na província de Kivu do Sul. De acordo com a organização eclesiástica, estas tropas "usam conflitos comunitários para combater em território congolês".
Congoleses em fuga de Angola: RDC promete retaliação
Mais de 270 mil congoleses foram obrigados a abandonar Angola. Em retaliação, o ministro dos Negócios Estrangeiros congolês deu dois meses aos angolanos ilegais para abandonarem a RDC. ACNUR teme nova crise humanitária.
Foto: Reuters/G. Paravicini
Ao ritmo de 1.000 imigrantes por hora
Imigrantes congoleses chegam à localidade fronteiriça de Kamako, já do lado da República Democrática do Congo (RDC), ao ritmo de 1.000 pessoas por hora. Mais de 270 mil imigrantes ilegais congoleses foram obrigados a abandonar Angola, após um decreto do Presidente João Lourenço que visa acabar com a imigração ilegal no país, sobretudo nas regiões diamantíferas das Lundas.
Foto: Reuters/G. Paravicini
RDC promete retaliação
O Governo em Kinshasa utiliza o termo "expulsos" quando se refere aos imigrantes que Angola diz estarem a "sair de forma voluntária" do país. Como represália, o ministro dos Negócios Estrangeiros congolês definiu um prazo de dois meses para que todos os angolanos em situação irregular saiam da RDC. A tensão levou os Governos e representações diplomáticas dos dois países a iniciarem conversações.
Foto: Reuters/G. Paravicini
Detidos com documentos angolanos falsos
Em colaboração com o ACNUR e com organizações não-governamentais, as autoridades congolesas estão a vigiar a pente fino as entradas no país. Entre os cidadãos obrigados a abandonar Angola, há portadores de documentação da nação vizinha. Porém, o porta-voz da "Operação Transparência" anunciou a detenção de imigrantes com "documentos angolanos falsos" que serão julgados em Luanda.
Foto: Reuters/G. Paravicini
Congoleses dedicavam-se ao garimpo ilegal
O comandante da Polícia Nacional de Angola, António Bernardo, garante que os imigrantes que estão a abandonar o país "não se coíbem de dizer" que se deslocaram para Angola "para ganhar dinheiro na exploração ilegal de diamantes". Com o encerramento das cooperativas e casas ilegais de venda e compra de pedras preciosas, "os imigrantes decidiram voluntariamente sair do país", diz o responsável.
Foto: Reuters/G. Paravicini
ACNUR não confirma mortes
Apesar das denúncias de mortes e maus-tratos perpetrados por agentes da Polícia Nacional de Angola, no âmbito da "Operação Transparência", o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) não confirma essas informações "por falta de dados". Philippa Candler, representante do ACNUR em Angola, diz que os imigrantes estão a sair de Angola pelo próprio pé, mas sob pressão do Governo.
Foto: Omotola Akindipe
Cerca de 35 mil refugiados legais em Angola
Dados do ACNUR indicam que há 35 mil refugiados legais em Angola. Estão, sobretudo, na Lunda Norte, inseridos num assentamento em Lóvua ou distribuídos pelas povoações. No entanto, a ONU denunciou a expulsão de 50 migrantes com estatuto de refugiados. O ACNUR está a verificar a informação. A escalada do conflito tribal no Kasai levou milhares de congoleses a procurar refúgio fora de portas.
Foto: Reuters/G. Paravicini
A pé ou à boleia de motorizadas e bicicletas
Os migrantes congoleses que estão em viagem de regresso ao país de origem escolheram vários meios para fazê-lo. Alguns aceitaram a ajuda do Governo angolano que disponibilizou camiões para transportar os congoleses até à fonteira. Outros preferem fazê-lo pelo próprio pé ou socorrendo-se de bicicletas e motorizadas. Consigo carregam os seus pertences.
Foto: Reuters/G. Paravicini
De regresso às antigas rotinas
Ainda em viagem, mulheres e crianças lavam roupas nas margens do rio junto à localidade de Kamako, na província de Kasai. O objetivo é regressarem às suas povoações outrora ameaçadas ou reiniciarem uma nova vida longe da sua última morada na RDC. No entanto, a situação nesta província congolesa é instável. A falta de infraestruturas está também a preocupar as Nações Unidas.
Foto: Reuters/G. Paravicini
Nova crise humanitária iminente
A ONU expressou preocupação sobre a saída forçada de Angola nas últimas semanas de centenas de milhares de cidadãos. Para as Nações Unidas, as "expulsões em massa" são "contrárias às obrigações" da Carta Africana e, por isso, exortou os Governos em Luanda e em Kinshasa a trabalharem juntos para garantirem um "movimento populacional" seguro e evitarem uma nova crise humanitária.