RDC: O impacto silencioso da exploração de cobalto
Jonas Gerding | kg
28 de junho de 2019
Veículos movidos à energia elétrica são anunciados como sustentáveis. Mas a principal matéria-prima para produção das baterias de eletricidade vem de áreas negativamente impactadas pela exploração do metal.
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Christophe Kabwita atravessa o solo argiloso da sua propriedade. O congolês de 59 anos vive com a sua mulher e os seus oito filhos. Ninguém é rico em Ruashi, um distrito à beira da metrópole Lubumbashi, no sul da República Democrática do Congo. Aqui, fica uma mina de cobalto a céu aberto. A matéria-prima é usada em baterias comuns de carros elétricos, smartphones e laptops.
Kabwita trabalha num centro comunitário e se considera um ativista. Em seu tempo livre, documenta as queixas da população sobre a mina. "As empresas de mineração e as montadoras cometem sérias violações de direitos humanos com as quais não se importam. Eu gostaria de enfrentá-las e mostrar o que essas empresas estão a fazer", diz.
RDC: O impacto silencioso da exploração de cobalto
A reputação sustentável do transporte movido à eletricidade foi abalada com a publicação de relatórios sobre o trabalho infantil na mineração de cobalto na RDC. As montadoras alegam que nada têm a ver com isso, pois obrigam os fornecedores a comprar cobalto apenas de minas industriais movidas a máquinas.
De facto, não existe trabalho infantil em grandes minas, como Ruashi, mas ainda assim a população é afetada. Práticas imprudentes de detonação de rochas chegam a ter consequências mortais aos moradores. "Aqui ao redor da minha casa, há um total de 12 rachaduras devido às detonações. É muito visível, estamos a pelo menos 400 metros da mina. Basta observar cada propriedade", sublinha Christophe Kabwita.
Mortes
Stéphanie Kayambi perdeu a filha de 11 anos em 2017, quando a rapariga voltava da escola para casa. Como de costume, uma sirene soou antes da detonação, mas a mãe suspeita que, quando o barulho parou, a menina provavelmente continuou no caminho de casa.
"No momento em que ela estava prestes a chegar em casa, a sirene recomeçou silenciosamente, mas a minha filha não teve tempo de ir para um local seguro. Quando a sirene tocou pela segunda vez, ela foi atingida por uma rocha", conta. A empresa que administra a mina não se responsabilizou pelo incidente e pagou uma pequena quantia de indemnização para a família.
Outro problema é a exploração ilegal de cobalto por cidadãos que depois vendem o metal no mercado negro. Eles escavam poços profundos que podem provocar colapsos na mina. Remi Tshanda, de 19 anos, é um deles. "Nós não roubamos. Nós só tomamos o que é nosso por direito. Então, os seguranças atiram contra nós", afirma.
O rio Lwano, que abastece Ruashi, está poluído devido à mineração. Os peixes morrem e a colheita nos campos é miserável. Para Christophe Kabwita, Ruashi caminha, assim, para a morte. "O rio Lwano é a fonte da vida, porque há aldeias ao longo dele, e essas aldeias dependem da água potável do rio. Então, Ruashi está semeando a morte", afirma.
A maioria dos cerca de 230.000 habitantes de Ruashi vive sem água corrente, faz bicos ou está desempregada. Em 2018, mais de 4 mil toneladas do metal foram extraídas neste local. A República Democrática do Congo concentra 58% da produção mundial de cobalto.
Solução?
Centenas de milhares de pessoas buscam a sorte em grandes minas ou escavam o solo no próprio quintal, segundo um relatório da Amnistia Internacional de 2016. A referência às minas industriais supostamente limpas tornou-se uma estratégia de defesa para as montadoras.
Em março, a BMW anunciou que abandonaria completamente o cobalto do Congo a partir de 2020/21. Entretanto, Matthias Buchert, chefe de Recursos e Mobilidade do Ökoinstitut em Freiburg, na Alemanha, diz que essa não é uma solução sustentável. "Se o exemplo faz escola e nenhum quilograma de cobalto fosse originário do Congo, não tenho certeza se a oferta ainda estaria garantida", sublinha.
De acordo com um estudo do instituto, a demanda de cobalto, que foi de 20.000 toneladas em 2016, poderia aumentar vinte vezes até 2030. Um embargo completo, portanto, só levaria ao contrabando em massa, teme Buchert. Em vez disso, o analista pede a implementação de padrões mínimos. "Os maiores compradores da indústria automotiva terão que unir forças o máximo possível", diz.
Cobalto no Congo: O preço da ganância
O Congo é o maior fornecedor mundial de cobalto, metal necessário para fabricar smartphones e carros elétricos. Mas o solo e a água já estão contaminados. A população está a adoecer e há casos de abortos e malformações.
Foto: Lena Mucha
O deserto contaminado de Kipushi
Perto da cidade de Kipushi, no sul do Congo, há um deserto artificial. Até à década de 1990 funcionava aqui uma mina. Vários quilómetros quadrados de solo estão contaminados: não cresce aqui nada há décadas. O rio também está poluído. Mas a mineradora canadiana Ivanhoe Kipushi quer explorar cobalto na região. Há casos frequentes de malformações congénitas em recém-nascidos, dizem médicos locais.
Foto: Lena Mucha
Malformações e nados-mortos
Nos hospitais locais, há cada vez mais casos de crianças que nascem com malformações, como lábio leporino e pé boto. Só no Hospital St. Charles Lwanga, em Kipushi, houve três casos de anencefalia em março. O feto não desenvolve o cérebro e geralmente o bebé morre logo após o nascimento. "Algo não está bem aqui, mas não temos dinheiro para pesquisas", conta Alain, que é ginecologista.
Foto: Lena Mucha
"É preciso educar as pessoas"
Um grupo de pesquisa interdisciplinar da Universidade congolesa de Lubumbashi está a trabalhar com a Universidade de Lovaina, na Bélgica, num projeto de investigação sobre a relação entre a exploração de cobalto e a saúde. "É preciso educar as pessoas para o que está a acontecer aqui. As toxinas tornam-nos doentes", diz Tony Kayembe, um dos membros do grupo de investigadores.
Foto: Lena Mucha
Partos prematuros
Dois bebés prematuros estão numa incubadora no Hospital St. Charles Lwanga, em Kipushi. "Suspeitamos que o elevado número de nascimentos prematuros nesta região está relacionado com a contaminação por metais como o cobalto," diz Tony Kayembe, investigador da Universidade de Lubumbashi e membro do grupo de pesquisa internacional. A maioria dos moradores de Kipushi trabalha nas minas de cobalto.
Foto: Lena Mucha
Crianças doentes
Adele Masengo tem cinco filhos. O marido trabalha numa mina de cobalto. A filha mais velha ficou cega aos 12 anos. Além de um aborto espontâneo, Adele teve um bebé com malformações, que morreu logo após o nascimento. Ainda não sabe se foi por causa do cobalto. "Quando os meus bebés nasceram, tiraram-lhes sangue, mas nunca conseguimos saber os resultados", diz.
Foto: Lena Mucha
Procura cada vez maior
O Congo é responsável por 60% da produção mundial de cobalto. Este metal raro é necessário para as baterias de lítio usadas em smartphones, computadores portáteis e carros elétricos. Por causa do rápido aumento da procura, os preços triplicaram nos últimos dois anos. Crianças, mulheres e homens que trabalham nas minas estão expostos a várias toxinas.
Foto: Lena Mucha
Em pleno "cinturão de cobre" africano
A GECAMINES é a maior empresa de mineração do Congo. Está localizada em Lubumbashi, a segunda maior cidade do país, no centro do chamado "cinturão de cobre" africano. Muitas grandes empresas internacionais instalaram-se aqui, na fronteira com a Zâmbia. Anualmente são produzidas 5000 toneladas de cobalto.
Foto: Lena Mucha
Água tóxica
Estes trabalhadores procuram cobalto e outras substâncias num rio contaminado. Para muitos, esta é a única fonte de rendimento. "Nós aqui quase não usamos a nossa água", diz um residente local. "A água deixa uma película estranha na pele. Quando lavo a minha roupa com esta água, ela depois desfaz-se. E até as batatas, que regamos com água, têm um sabor estranho."
Foto: Lena Mucha
Viver ao lado de uma refinaria
Mesmo ao lado da Congo Dongfang Mining (MDL) foi construída uma área residencial. A empresa chinesa está entre os maiores compradores de cobalto no Congo. Quando chove, os resíduos da refinaria da MDL em Lubumbashi chegam ao bairro vizinho de Kasapa. Os residentes queixam-se de graves problemas respiratórios e de pele, mas até agora a MDL ainda não respondeu às suas queixas.
Foto: Lena Mucha
Sem proteção
Um dermatologista examina um paciente no Hospital Universitário de Lubumbashi. A maioria dos mineiros no Congo trabalha sem roupas de proteção. Além de metais como cobalto, cobre e níquel, muitas vezes também há urânio nas rochas. E os moradores estão igualmente expostos ao pó.