Opositores falam em "conspiração" e dizem não aceitar decisão da Comissão Eleitoral. Para analista, adiamento seria estratégia para influenciar resultados a favor do Governo. Manifestações continuam.
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O medo de muitos congoleses tornou-se real. As eleições presidenciais na República Democrática do Congo (RDC), já adiadas em uma semana para o dia 30 de dezembro foram adiadas mais uma vez em três regiões do país, para março de 2019. Entretanto, a Comissão Eleitoral ainda planeja empossar o novo Presidente a 18 de janeiro. Com isso, os votos de eleitores que forem às urnas apenas em março seriam inválidos.
Um novo surto do vírus ébola em Beni e Butembo, na província de Kivu do Norte, e problemas de segurança em Yumbi, no oeste do país, foram os motivos alegados pela Comissão Eleitoral para adiar as eleições nestas três zonas. Algo particularmente problemático do ponto de vista dos observadores, pois Beni e Butembo são considerados bastiões da oposição.
Gesine Ames, a coordenadora da Rede Ecuménica da África Central, defende que o recente adiamento das eleições é mais uma estratégia do Governo para influenciar os resultados a seu favor.
"Não será fácil realizar eleições na província de Kivu do Norte, principalmente por causa da violência que eclodiu nas últimas semanas e do novo surto do vírus ébola. Entretano, Kivu do Norte é um dos redutos da oposição e uma região de muitos eleitores. Penso que essa é uma das razões pelas quais o pleito foi adiado nestes locais," avalia.
Em entrevista à DW, a coordenadora disse que "falta bom senso" do Governo congolês para realizar estas eleições num ambiente justo, transparente e livre. "Mais uma vez, estão a tentar truques para manipular as eleições até o momento em que o candidato do Governo, Emmanuel Ramazani Shadary, tenha a melhor chance de ganhar", afirma.
Decisão repudiada
Os protestos contra o recente adiamento das eleições em três regiões da RDC não demoraram a chegar. Em Goma, capital da província de Kivu do Norte, manifestantes ergueram barricadas nos distritos Majengo e Katimbo. A polícia disparou gás lacrimogêneo e prendeu pelo menos meia dúzia pessoas.
Nesta quinta-feira (27.12), centenas de manifestantes reuniram-se nos arredores de Beni, uma das três regiões afetadas pela recente decisão da Comissão Eleitoral. A polícia congolesa também recorreu a disparos de munições reais e gás lacrimogéneo para dispersar mais de cem pessoas que protestavam nesta zona, localizada no leste RDC.
Eleições na RDC, protestos - MP3-Stereo
Políticos da oposição em Beni disseram não aceitar a decisão da Comissão Eleitoral. Philémon Ndambi wa Ndambi, candidato parlamentar do Movimento para a Libertação do Congo (MLC), disse, em entrevista à DW, que "há uma conspiração contra Beni e Butembo para que a população não possa votar contra o Governo. Iremos às ruas e insistiremos nas eleições!".
"O ébola é uma realidade, mas não deve ser um obstáculo. Isso é apenas uma desculpa que não se deve usar. Precisamos de eleições", acrescentou.
Blaise Musubao, do Movimento Social para a Renovação (MSR), também rejeita a decisão da Comissão Eleitoral congolesa.
"Em Beni, as eleições terão lugar no dia 30 de dezembro de 2018 e ponto final", enfatiza.
Retaliação à União Europeia
Nesta quinta-feira (2712), a três dias das eleições presidenciais, legislativas e provinciais, Kinshasa expulsou o embaixador da União Europeia (UE) na RDC. O Governo da RDC deu à UE um prazo de 48 horas para retirar o seu representante naquele país africano, como retaliação pela manutenção das sanções europeias contra 14 personalidades congolesas.
As sanções contemplam o congelamento de possíveis bens e a proibição de atribuição de vistos a 14 membros do regime do Presidente Kabila, acusados de violações dos direitos humanos. Por sua vez, a União Europeia lamentou a decisão das autoridades da RDC de expulsar o embaixador em Kinshasa, considerando essa medida "totalmente injustificada" a apenas três dias das eleições gerais.
Parte da oposição lançou um apelo para a realização de uma greve geral esta sexta-feira (28.12).
Presidentes a todo o custo
São derrotados nas eleições, mas contestam os resultados. Mesmo depois de esgotarem todos os recursos, estes candidatos à mais alta magistratura continuam a reivindicar a Presidência.
Maurice Kamto: o auto-proclamado "presidente"
O candidato da oposição às presidenciais de 7 de outubro nos Camarões, Maurice Kamto, reivindica a vitória frente a Paul Biya. "Convido o Presidente da República a criar as condições para uma transição pacífica para proteger os Camarões de uma crise eleitoral desnecessária", declarou o líder do MRC - Movimento para o Renascimento dos Camarões.
Foto: AFP/Getty Images
Nelson Chamisa, o "presidente legítimo" do Zimbabué
O líder da oposição zimbabueana contesta a vitória do Presidente Emmerson Mnangagwa nas eleições de 30 de julho de 2018. Considera-se vencedor e reclama a cadeira presidencial numa cerimónia simbólica de tomada de posse, a 15 de setembro.
Foto: Reuters/P. Bulawayo
Cissé rejeita a tomada de posse de Keïta
Soumaïla Cissé não marca presença na cerimónia e fala num vazio de poder no Mali depois da tomada de posse "nula e de efeito nulo" do seu rival, Ibrahim Boubacar Keïta, a 4 de setembro de 2018. A 20 de agosto, o Tribunal Constitucional do Mali declarou Keïta vencedor das presidenciais com 67,16% dos votos na segunda volta de 12 de agosto contra os 32,84% de Soumaïla Cissé.
Foto: DW/K. Gänsler
Raila Odinga, efémero "presidente do povo"
A 30 de janeiro de 2018, o opositor que tinha boicotado as presidenciais de outubro de 2017 contra Uhuru Kenyatta autoproclama-se "presidente do povo" perante milhares de apoiantes, numa cerimónia simbólica em Nairobi. O país é palco de violência pós-eleitoral, mas, a 9 de março, Odinga e Kenyatta surpreendem ao anunciar a sua reconciliação.
Foto: picture-alliance/Anadolu Agency/B. Jaybee
Jean Ping : "Exercerei o poder que me confiaram"
Dois anos após as presidenciais de agosto de 2016, o líder da oposição gabonesa continua determinado. A 31 de agosto, numa cerimónia de "homenagem aos mártires" da violência pós-eleitoral, em Libreville, diz que quer continuar a sua "luta" para "libertar" o Gabão. Jean Ping deposita esperanças nomeadamente no inquérito preliminar do Tribunal Penal Internacional sobre a crise pós-eleitoral no país.
Foto: DW/A. Kriesch
Kizza Besigye, o eterno rejeitado
Em fevereiro de 2016, o opositor histórico enfrenta Yoweri Museveni pela quarta vez no Uganda. Quando Museveni é declarado vencedor e se prepara para prestar juramento para um quinto mandato, Kizza Besigye toma posse como presidente numa cerimónia alternativa. Afirma "ter provas" da sua vitória. Detido e condenado por alta traição, é libertado algumas semanas depois.
Foto: DW/E.Lubega
André Mba Obame, o outro adversário de Ali Bongo
Inspirado pelos acontecimentos na Costa do Marfim, o antigo ministro "AMO" autoproclama-se presidente do Gabão, em janeiro de 2011, 17 meses depois de perder as presidenciais frente a Ali Bongo. Acusado de alta traição, refugia-se numa agência da ONU. Os problemas de saúde põem fim às suas ambições presidenciais. A sua morte, em abrir de 2015, aos 57 anos, leva a confrontos em Libreville.
Foto: cc-by-sa Ernest A. TEWELYO
Étienne Tshisekedi, duas vezes "presidente"
Em 2006 e 2011, o líder do principal partido da oposição congolesa (UDPS) declara-se vencedor frente a Joseph Kabila e "presidente eleito". Toma posse na sua residência em Limete, arredores de Kinshasa. O seu estado de saúde deteriora-se em 2014 e em 2017 morre com o eterno opositor o desejo de ocupar a cadeira presidencial.
Foto: picture-alliance/dpa/T. Roge
Laurent Gbagbo, opositor histórico
No ano 2000, o líder do FPI declara-se vencedor frente a Robert Gueï e pede aos costa-marfinenses que saiam à rua para fazer cair o general. Os manifestantes atacam os agentes de segurança do chefe da junta militar. Os protestos continuam até que a polícia e, mais tarde, o exército, começam a passar para o lado de Laurent Gbagbo.
Foto: AP
John Fru Ndi às portas do palácio presidencial
John Fru Ndi autoproclama-se presidente a 21 de outubro de 1992. Dois dias depois, o Supremo Tribunal declara Paul Biya vencedor do escrutínio presidencial. O fundador do SDF contesta estes resultados nas ruas. É declarado o estado de emergência no nordeste do país e John Fru Ndi fica em prisão domiciliária.