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ConflitosRepública Democrática do Congo

RDC: Ruanda por detrás dos ataques aos deslocados internos?

Isaac Mugabi
9 de maio de 2024

O Ruanda negou estar envolvido no bombardeamento mortal dos campos de deslocados internos no leste da República Democrática do Congo (RDC). Entretanto, os EUA apelaram a uma investigação.

RDC | Campo de refugiados após explosão
Combates entre o exército e os rebeldes do M23 aproximaram-se de Goma nos últimos meses, obrigando milhares de pessoas a procurar refúgioFoto: Moses Sawasawa/AP Photo/picture alliance

O governador militar da província de Kivu do Norte, na República Democrática do Congo (RDC), Peter Cirimwami, afirmou que 15 pessoas morreram e outras 35 ficaram gravemente feridas na sequência de explosões em quatro campos de deslocados na semana passada. 

A cidade oriental de Goma tem-se debatido com um fluxo de deslocados internos provenientes dos territórios de Masisi, Rutshuru e Nyiragongo no Kivu do Norte, onde a milícia M23 controla vastas áreas.

Um porta-voz das forças armadas congolesas no Kivu do Norte acusou os combatentes do M23 de terem disparado contra os campos de Lac Vert e Mugunga, nos arredores de Goma, na semana passada - alegações que foram rejeitadas pelo grupo.

O que aconteceu nos campos de deslocados internos?

De acordo com testemunhas dos bombardeamentos, as forças governamentais posicionadas perto dos campos tinham estado a bombardear os rebeldes nas colinas mais a oeste e, de acordo com um ativista, “o M23 retaliou atirando bombas indiscriminadamente”.

A República Democrática do Congo tem o maior número de pessoas deslocadas internamente em ÁfricaFoto: Aubin Mukoni/AFP/Getty Images

Kambale Kiyoma, um congolês deslocado, descreveu o que aconteceu quando o campo de deslocados onde vive com a  família foi atacado.

“Acordámos de manhã e descobrimos que estavam a ser disparados projécteis daqui para as posições do M23. Passado algum tempo, o M23 retaliou", disse Kambale, acrescentando que vários projécteis caíram em campos da zona. 

Kambale diz que se sente abandonado e pede que o Governo restabeleça a paz.

Safi Kasembe, outro deslocado interno, disse à agência noticiosa AFP que o Governo instalou armamento de artilharia no campo de deslocados, o que coloca as suas vidas em perigo.

“Estou aqui por causa da guerra. Fugimos das nossas aldeias e agora refugiamo-nos neste campo de deslocados, mas infelizmente, mesmo aqui, somos atingidos por bombas das posições rebeldes”, lamenta.

Leste da RDC tornou-se "inabitável"

Entretanto, numa cerimónia de homenagem às vítimas do bombardeamento, membros de vários movimentos de cidadãos denunciaram o recrudescimento da violência no leste da RDC e apelaram à justiça para as vítimas dos bombardeamentos dos campos de deslocados da semana passada.

Grupo M23 terá retaliado bombardeamos das forças governamentais da República Democrática do CongoFoto: Moses Sawasawa/AP/picture alliance

“As pessoas que fugiram da guerra, as pessoas que hoje se encontram em campos de deslocados, onde deveriam encontrar refúgio e segurança”, disse Christophe Muyisa, membro do Filimbi, um movimento político congolês que procura aumentar a participação dos jovens. 

“Eles não precisam de ajuda ou assistência. Precisam de paz e segurança para regressar às suas casas. Por isso, toda a ajuda atual, que é uma hipocrisia por parte da comunidade internacional, pedimos ao Governo que não dê importância", acrescentou Muyisa.

Josue Wallay, ativista da Fight for Change, um movimento da sociedade civil que defende a justiça social, afirma que o leste do país se tornou inabitável.

“As pessoas que fugiram das suas aldeias e procuraram refúgio estão infelizmente a morrer de fome e a ser infligidas com mais uma morte atroz, bombardeadas e mortas”, disse Wallay.

EUA exigem responsabilidade

Os EUA condenaram o ataque e apelaram ao Ruanda para que punisse as forças por detrás do mesmo, não recuando nas acusações de que Kigali se está a intrometer nos assuntos do país vizinho.

Questionado sobre se os EUA mantinham a sua reivindicação, o porta-voz do Departamento de Estado norte-americano, Matthew Miller, sublinhou: “absolutamente”.

“O governo do Ruanda deve investigar este ato hediondo e responsabilizar todos os culpados. E nós deixámos isso claro para eles”. 

"O governo do Ruanda deve investigar este ato hediondo e responsabilizar todos os culpados. E nós deixámos isso claro para eles", Matthew MillerFoto: Nathan Howard/AP/picture alliance

Ruanda nega envolvimento

O porta-voz do governo ruandês, Yolande Makolo, respondeu que a acusação dos EUA era “ridícula”. Na rede social X escreveu que o Ruanda tinha um “exército profissional” que “nunca atacaria” um campo para pessoas deslocadas. "Para este tipo de atrocidade, basta olhar para as FDLR e o Wazalendo, apoiados pelas FARDC”, acrescentou.

A publicação refere-se às Forças Democráticas para a Libertação do Ruanda (FDLR), um grupo hutu fundado por oficiais hutus que fugiram do Ruanda depois de orquestrarem o genocídio de 1994 contra os tutsis, enquanto Wazalendo é uma seita cristã.

Numa declaração no último domingo (05.05), o Ruanda afirmou que a tentativa do Departamento de Estado dos EUA de atribuir, imediatamente e sem qualquer investigação, a culpa ao Ruanda pela perda de vidas nos campos de refugiados era injustificada. 

Quais os objectivos do M23?

O grupo rebelde há muito que é acusado de querer assumir o controlo dos recursos minerais do Congo, que incluem grandes depósitos de cobre, ouro e diamantes.

O Congo possui também as maiores reservas mundiais de cobalto, um componente essencial das baterias para carros eléctricos e telemóveis.

As tensões aumentaram em março de 2022, quando o M23, após uma década de relativa calma, atacou posições do exército congolês perto da fronteira entre o Uganda e o Ruanda, levando a população local a fugir para a sua segurança.

Os Estados Unidos há muito que afirmam que existem provas que sustentam as acusações do Congo de que o Ruanda está a apoiar os rebeldes do M23.

Washington tem procurado mediar a situação entre os dois países, tendo o Secretário de Estado Antony Blinken se reunido com o Presidente do Ruanda, Paul Kagame, em janeiro, à margem do Fórum Económico Mundial em Davos, na Suíça,  e manifestado a esperança de que todas as partes tomassem as medidas diplomáticas necessárias para resolver a situação.  

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