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Recolher obrigatório em Maputo: "Será um grande transtorno"

5 de fevereiro de 2021

Cidadãos abrangidos pelo recolher obrigatório que visa travar a Covid-19 na capital de Moçambique acreditam que a medida pode não funcionar, devido à falta de transportes. E temem novos abusos da polícia.

Foto: Roberto Paquete/DW

Cidadãos que residem na periferia de Maputo afirmam que não vão conseguir cumprir o recolher obrigatório, das 21h00 as 04h00 horas, decretado pelo Presidente da República, Filipe Nyusi, na quinta-feira (04.02), para conter o avanço da Covid-19. A medida  abrange a zona metropolitana de Maputo, que corresponde às cidades de Maputo e Matola, o município de Boane e a vila de Marracuene.

Alguns citadinos afirmam que a rotina diária os obriga a chegar às suas residências depois das 21h00, tempo limite determinado pelo recolher obrigatório, devido aos problemas de transporte. Muitos destes cidadãos saem entre as 17h00 e 20h00 dos seus postos de trabalho e têm de se deslocar aos terminais rodoviários, onde permanecem uma ou mesmo duas horas à espera de transporte.

"Temos que ir à baixa e lá ficamos à espera dos TPM [Transportes Públicos de Maputo] que muitas vezes não aparecem a tempo", diz João Uambo, residente no bairro Patrice Lumumba, a cerca de 25 km do centro da capital. E o problema não acaba aqui, conta: "Depois de conseguir o transporte, temos o problema dos engarrafamentos e acabamos levando muito tempo".

Uma eventual solução poderá estar nas mãos do Governo, "se melhorar os transportes e os 'chapas' levarem quatro pessoas em cada assento", sugere.

Fila para o 'chapa' em MaputoFoto: Romeu da Silva/DW

Os bairros de expansão em Maputo e Matola, onde muitos jovens residem, estão a mais de 25 km do centro da cidade, local onde trabalham.

Cidadãos temem abusos

Jorge Banze, residente na cidade da Matola, acredita que o recolher obrigatório será uma oportunidade para a polícia moçambicana extorquir os cidadãos ou mesmo violar os seus direitos.

"Chego a casa por volta das 22h00, dependendo do transporte. Na hora de ponta, de fazer ligações, chegamos às 22h00, 23h00, às vezes meia-noite. Acho que vamos levar porrada, porque a polícia vai fazer o seu papel e vão-se aproveitar, isso já é sabido", afirma. "Há-de ser difícil justificar que eu venho do serviço, não temos esses comprovativos".

Filimone Cossa, residente no município de Boane, a mais de 30km de Maputo, também não tem dúvidas de que este recolher obrigatório das 21h00 às 04h00 vai criar transtornos aos cidadãos: "Não há como essa pessoa ir à sua casa, quando chega ao terminal às 20h50 e tem de caminhar 10 minutos. Se for interpelado pela polícia às 21h05 será um transtorno muito grande".

Crise dos transportes em Maputo aproxima estranhos

08:31

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"Talvez pudéssemos voltar ao passado, quando era exigido o cartão de trabalho para se confirmar se o indivíduo em causa está mesmo a voltar do local de trabalho", afirma.

Uma medida impraticável?

O jurista e jornalista Ericino de Salema acredita que o recolher obrigatório pode mesmo não ser praticável, uma vez que os trabalhadores dos restaurantes - que devem fechar às 20h00 - não terão tempo para chegar às suas residências.

"Por um lado, podem legalmente encerrar às 20h00; por outro, têm de estar em casa até às 21h00... Todos conhecemos o nosso sistema de transporte, quem estiver na baixa da cidade dificilmente chegará, em tempo útil, à Matola, Zimpeto, Albazine. Será um desafio de maior", considera.

Salema lamenta que o Presidente da República não tenha falado muito, na sua comunicação à nação, sobre a responsabilidade da polícia, que muitas vezes atropela o estado de calamidade. Na opinião do analista, faltou "uma mensagem aos agentes da polícia, que muitas vezes têm atuado de forma desproprocional e sem respeitar os direitos fundamentais do cidadão".

"Eu acho que, depois do que verificámos nos últimos 21 dias, era de esperar que ele se dirigisse em particular a este grupo alvo que tem o hábito de violar os direitos fundamentais e de agir sempre com excesso de zelo", afirma.

Entretanto, já esta sexta-feira, o Presidente moçambicano dirigiu-se diretamente às forças policiais, pedindo-lhes que imponham o cumprimento das medidas de prevenção da Covid-19, que entraram em vigor, visando "salvar vidas" face à gravidade da situação.

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