O índice de transparência no setor extrativo em Moçambique regrediu nos últimos dois anos, alerta o Centro de Integridade Pública (CIP). A falta de informações das empresas que operam no país é o principal motivo.
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O setor extrativo moçambicano foi menos transparente nos anos de 2021 e 2022. É o que mostra o mais novo relatório apresentado esta terça-feira (28.03) pelo CIP, em Maputo.
No documento, o CIP avalia itens como a governação corporativa e a divulgação de informações em 21 empresas de extração mineira em Moçambique.
O terceiro relatório elaborado pela ONG moçambicana verificou que houve um recuo na transparência em comparação às duas últimas edições.
Falta de informação
De acordo com o autor do estudo, Rui Mate, o facto fica a dever-se à não apresentação ou atualização das informações das empresas sobre a atividade mineira que exercem no país.
"Há empresas que regrediram e outras até estagnaram porque elas tinham informação, mas simplesmente não a atualizaram. E um dos aspetos avaliados é a atualização da informação. Não vale disponibilizar uma informação e esta não ser atualizada", explica.
O pesquisador destaca o exemplo da empresa Vulcan Resource como aquela que não está a disponibilizar informação, contrariamente ao que acontecia com a sua predecessora, a brasileira Vale Moçambique.
"Então ela faz com que a transparência global do setor regrida de forma geral, porque não disponibiliza informação, não tem nenhum website, e quando é contactada não dá nenhuma informação", critica Mate.
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Transparência para os moçambicanos
O pesquisador Rui Mate aponta o dedo a empresas que não estão preocupadas em desmobilizar informação aos moçambicanos, como a indiana Jindhal.
Segundo Mate, "não faz sentido que a empresa esteja em Moçambique, esteja a explorar recursos de moçambicanos e não tem nenhum site ou uma informação disponibilizada para Moçambique ou pelo menos na língua oficial moçambicana que é o português".
Dificuldades nas auditorias
Além da falta de informação, o Tribunal Administrativo de Moçambique, responsável por auditar contas do Estado, indica que as mudanças nas estruturas governativas e na legislação criam dificuldades para efetuar o trabalho transparente no setor extrativo.
De acordo com o contista Vitor Guibunda, "se as regras mudam no meio do jogo, de um exercício para o outro, nós às vezes podemos ter dificuldades na nossa análise".
"Há alguns operadores, por exemplo, que são regidos por determinados instrumentos legais e outros com outros instrumentos mais recentes, mas isso tem a ver obviamente com os postulados escritos nos próprios contratos destes mesmos operadores", conclui.
Moçambique: População lamenta fraco retorno da exploração mineira em Nampula
A Kenmare é uma das multinacionais que explora minérios no distrito de Larde, outrora Moma. Apesar da crise, a sua produção nunca parou. No entanto, a população queixa-se da falta de oportunidades e infraestruturas.
Foto: DW/S. Lutxeque
Mititicoma: um bairro de reassentamento
Com o início da sua atividade, a multinacional irlandesa Kenmare viu-se obrigada a reassentar milhares de famílias. Mititicoma é um dos populosos bairros de reassentamento, onde vivem mais de cinco dos cerca de 27 mil habitantes de toda a localidade de Topuito. Nos dias de hoje, cada casa destas pode custar dois milhões de meticais (cerca de 28 mil euros) mas, na altura, o preço foi inferior.
Foto: DW/S. Lutxeque
Negócios e melhoria de vida
Em Topuito, no distrito de Larde, emergem novas infraestruturas socioeconómicas. Muitos comerciantes que hoje vivem com pequenos "luxos", iniciaram a atividade com um pequeno financiamento da Kenmare que, na altura, não passava dos 200 mil meticais (cerca de 2900 euros) por cada pessoa.
Foto: DW/S. Lutxeque
À beira da falência
Amade Francisco, de 25 anos, é natural de Topuito, onde ainda vive. Encontrou no comércio uma forma de combater o desemprego. Mas, neste período de crise financeira do país, tem receio de ir à falência. "Iniciei o negócio em 2014, através de um empréstimo na Kenmare no valor de 120 mil meticais (cerca de 1745 euros). Já os reembolsei porque [antes] havia muita clientela, agora não".
Foto: DW/S. Lutxeque
Nativos excluídos
O desemprego está a afetar milhares de cidadãos de Topuito. As principais "vítimas", diz Saíde Ussene, são os jovens nativos e ele é um exemplo. Afirma que já tentou, mas sem sucesso, arranjar emprego na Kenmare, pois eles "preferem os cidadãos de Maputo aos nativos". "E nós onde vamos trabalhar se não temos dinheiro para subornar?", questiona o jovem moto-taxista.
Foto: DW/S. Lutxeque
Trocar a pesca pela agricultura
Ainda assim, continua a haver quem potencie o seu próprio emprego. Chiquinho Nampakhiriwa é um dos jovens que aguardava pela sorte de trabalhar na mineradora. Dedicava-se à pesca, mas decidiu trocar o anzol pela enxada e trabalhar na terra. Hoje fornece vegetais e legumes à Kenmare, apesar de ser em pouca quantidade. Também foi a empresa que o financiou incialmente.
Foto: DW/S. Lutxeque
Casamentos prematuros e pobreza
Fátima Ismael tem 17 anos e já é mãe. Vive no bairro de Nalokho, em Topuito e, devido à pobreza, viu-se forçada a ignorar os apelos do governo acerca dos casamentos prematuros. "Casei-me cedo porque não tinha condições [financeiras e materiais] de continuar a estudar. Mas estou feliz com o meu esposo", disse.
Foto: DW/S. Lutxeque
Falta de infraestruturas
Apesar da abundância de recursos minerais, Topuito continua, dez anos após o início da atividade deste tipo de empresas, com um rosto pacato e empobrecido. Existem muitos bairros, dentro da localidade, que têm falta de várias coisas, entre elas infraestruturas socioeconómicas. O bairro de Nalokho é exemplo disso.
Foto: DW/S. Lutxeque
Maus acessos
Entre as preocupações dos residentes do distrito de Larde está a degradação das vias de acesso e a falta da ponte sobre o rio Larde. As estradas que dão acesso à localidade de Topuito, como é visível na imagem, estão em más condições.
Foto: DW/S. Lutxeque
Kenmare minimiza problemas
Regina Macuacua é responsável da área social da Kenmare. Segundo esta responsável, a vida [da população] melhorou significativamente com a chegada da multinacional. "Hoje muitos residentes têm casas melhoradas, carros, há corrente elétrica. Continuamos a prover água e financiamos projetos", afirmou à DW, sem revelar os ganhos dos últimos dois anos.
Foto: DW/S. Lutxeque
Oscilação de preços no mercado
Sabe-se que a internacional irlandesa Kenmare, que explora e comercializa zircão, rutilo, ilmenite, entre outros produtos mineiros, conheceu alguns momentos de "pouca glória" com a oscilação dos preços no mercado internacional, desde 2009.