Jornalistas moçambicanos vivem tempos difíceis, segundo o Instituto de Comunicação Social da África Austral. Organização diz que há uma regressão assinalável em relação à liberdade de imprensa e de expressão.
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Assinala-se a 3 de maio o Dia Mundial da Liberdade de Imprensa. Este ano, a data é dedicada aos desafios que os meios de comunicação social enfrentam na cobertura de eleições em tempos de desinformação, bem como o seu potencial para apoiar a democracia, a paz e a reconciliação.
Em Moçambique, a organização de defesa dos direitos humanos Amnistia Internacional denuncia esta sexta-feira numa mensagem que o ambiente é cada vez mais hostil para os jornalistas, com vários exemplos de coação do Estado sobre profissionais da imprensa, incluindo detenções arbitrárias.
"Há uma regressão assinalável no usufruto da liberdade de expressão e da liberdade de imprensa em Moçambique", corrobora Fernando Gonçalves, presidente do Instituto de Comunicação Social da África Austral (MISA) no país.
Jornalistas ouvidos pela DW em Moçambique consideram que este Dia Mundial da Liberdade de Imprensa deve servir para uma reflexão sobre como melhorar o ambiente de trabalho da classe.
Respeitar a Lei
Para Armando Nhantumbo, jornalista e docente da área, uma das causas desta situação é a não observância da legislação sobre a matéria, como as leis de imprensa e do direito à informação, por parte dos funcionários e agentes do Estado, incluindo dirigentes.
"Continuamos a assistir a situações em que impera a vontade daquele funcionário, daquele dirigente, não o espírito da Lei. Isto é que tem que mudar", defende.
O último relatório da organização Repórteres Sem Fronteiras sobre a liberdade de imprensa, divulgado em abril, coloca Moçambique entre os piores países lusófonos, tendo descido quatro posições em relação ao ano anterior, para ocupar o 103º lugar no ranking mundial.
O relatório considera que esta queda ficou a dever-se a casos reportados de ataques e de detenção arbitrária de jornalistas, assim como a falta de recursos e a autocensura.
Para Fernando Gonçalves, do MISA-Moçambique, os principais problemas que afetam os jornalistas no país têm a ver precisamente com o ambiente hostil ao seu trabalho.
"Os jornalistas são várias vezes impedidos de fazerem trabalhos em situações em que alguém, que muitas vezes fala em nome do Governo, evoca questões de segurança do Estado para impedir que os jornalistas façam o seu trabalho de forma livre", refere Gonçalves.
Recuos na liberdade de imprensa em Moçambique
Detenções, raptos e agressões físicas
O responsável do MISA-Moçambique cita como exemplo as recentes detenções de jornalistas e profissionais da área, na província de Cabo Delgado, simplesmente porque estavam a realizar o seu trabalho, para além de casos de comentaristas que foram alvo de raptos e agressões físicas.
O Dia da Liberdade de Imprensa será marcado em Moçambique, entre outras atividades, pela realização de uma conferência, que vai abordar temas como "Media para a Democracia: Jornalismo e Eleições em Tempo de Desinformação" e "A qualidade da informação eleitoral para os cidadãos: experiências e recomendações dos atores relevantes para o bom trabalho com os média".
A reflexão acontece numa altura em que o país se prepara para realizar este ano eleições presidenciais, legislativas e provinciais.
O presidente do MISA-Moçambique, Fernando Gonçalves, recorda que, nas eleições autárquicas de 2018, embora não tenha sido generalizado, houve jornalistas que foram agredidos somente porque realizavam o seu trabalho.
"É este tipo de incidentes que nós achamos que não devem acontecer", sublinha.
Países africanos que mais violam a liberdade de imprensa
Gana é o país africano mais bem classificado no "<i>Ranking</i> Mundial da Liberdade de Imprensa" dos Repórteres sem Fronteiras. A Eritreia é o pior em África e, a nível mundial, só é melhor que a Coreia do Norte.
Foto: Esdras Ndikumana/AFP/Getty Images
Eritreia - posição 179º lugar
A liberdade de imprensa é considerada "não existente". Em 2001, uma série de medidas repressivas contra <i>media</i> independentes levaram a uma onda de detenções. O Presidente Isaias Afeworki é visto como um “predador” da liberdade de imprensa e usa os meios de comunicação nacionais como seus porta-vozes. Escritores, locutores e artistas são censurados e a informação é escondida dos cidadãos.
Foto: picture-alliance
Sudão - 174º lugar
Na capital Cartum, pratica-se a chamada “censura pré-publicação". O Governo detém jornalistas arbitrariamente e interfere abertamente na produção de notícias. A "Lei da Liberdade de Informação de 2015" é vista como uma outra forma de exercer controlo governamental sobre a informação pública. Os jornalistas têm de passar por um teste e obter uma permissão para trabalhar.
Foto: Getty Images/AFP/A. Shazly
Burundi - 159º lugar
Repressão estatal contra a liberdade de imprensa e intimidação de jornalistas é comum no país. <i>Media </i> controlados pelo Estado substituem cada vez mais estações de rádio independentes, depois de a maior parte delas ter sido forçada a fechar, após uma tentativa de golpe de estado há três anos. Centenas de jornalistas fugiram do país desde 2015. Na foto, protesto de jornalistas no país.
Foto: Esdras Ndikumana/AFP/Getty Images
República Democrática do Congo - 154º lugar
Defensores dos <i>media</i> falam em jornalistas mortos, agredidos, detidos e ameaçados desde que Joseph Kabila sucedeu ao pai na presidência do país em 2001. Orgãos de comunicação internacionais queixam-se que o Governo interfere nos sinais de rádio ou corta mesmo a transmissão. Protestos da oposição levaram as autoridades a interromper ou cortar o acesso à Internet.
Foto: picture-alliance/dpa/M. Kappeler
Suazilândia - 152º lugar
Esta monarquia absoluta tem a reputação de obstruir o acesso à informação e impedir os jornalistas de fazerem o seu trabalho. Os <i>media</i> estão sujeitos a leis restritivas e repórteres são frequentemente chamados a tribunal pelo seu trabalho. Auto-censura é comum. Um editor saiu recentemente do país depois de fazer uma reportagem sobre negócios obscuros ligados ao Rei Mswati III (na foto).
Foto: picture-alliance/dpa
Etiópia - 150º lugar
O Governo tem uma mordaça sobre os órgãos de comunicação e os jornalistas trabalham sobre condições muito restritivas. Com a Eritreia, este país tem uma das mais altas taxas de jornalistas detidos na África subsariana. Na foto, o jornalista etíope Getachew Shiferaw, que foi condenado a 18 meses de prisão por ter falado com um dissidente.
Foto: Blue Party Ethiopia
Sudão do Sul - 144º lugar
Os jornalistas são obrigados pelo Governo a evitar fazer cobertura do conflito. Órgãos de comunicação internacionais denuciaram casos de assédio e foram banidos deste jovem país, onde pelo menos 10 jornalistas foram mortos desde 2011. Na foto, dois jornalistas do Uganda que tinham sido detidos por autoridades no Sudão do Sul.
Foto: Getty Images/AFP/W. Wudu
Camarões - 129º lugar
O Governo chamou às redes sociais uma “nova forma de terrorismo”, e bloqueia frequentemente o acesso às mesmas. Emissões de rádio e televisão foram bloqueadas duas semanas em março, durante o período eleitoral. Jornais que publicam conteúdos que desagradam políticos no poder são banidos e jornalistas e editores são detidos.
Foto: picture alliance/abaca/E. Blondet
Chade - 123º lugar
Os jornalistas arriscam-se a detenções arbitrárias, agressões e intimidações. Nos últimos meses, o Governo tem vindo a reprimir plataformas de <i>social media</i> e ciber-ativistas. A Internet tem estado bloqueada no país desde 28 de março, no seguimento de um “apagão” da Internet devido a manifestações da sociedade civil e protestos dos órgãos de comunicação num chamado “dia sem imprensa”.
Foto: UImago/Xinhua/C. Yichen
Tanzânia - 93º lugar
Críticos dizem que o Presidente John Magufuli tem vindo a atacar a liberdade de expressão deliberadamente, desde que tomou posse em 2015. Jornalistas foram presos ou dados como desaparecidos. Orgãos de comunicação social foram fechados ou impedidos de publicar durante longos períodos de tempo. Leis que podem ser usadas contra os <i>media</i> foram apertadas.