Relatório aponta ANC como "fonte de instabilidade"
Lusa | Reuters
7 de fevereiro de 2022
As várias fações do ANC, no poder na África do Sul, são uma "séria fonte de instabilidade", concluem especialistas nomeados pelo Presidente para averiguar as causas da violência que fez mais de 350 mortos em julho.
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"O que parece serem batalhas entre fações no Congresso Nacional Africano (ANC) tornaram-se uma séria fonte de instabilidade no país", alerta o relatório divulgado hoje pela Presidência da República sul-africana.
A resposta da polícia e dos serviços de informações sul-africanos foi "inadequada" e "insuficiente" para conter a violência desencadadeada em julho de 2021, após a prisão do ex-Presidente Jacob Zuma, por desrespeito à Justiça, conclui o painel de peritos nomeado por Presidente Cyril Ramaphosa para analisar a preparação e reação do seu Governo.
O Executivo destacou soldados para restaurar a calma após os tumultos, que causaram a morte de pelo menos 354 pessoas nas províncias de Gauteng e KwaZulu-Natal e danos materiais orçados em mais de 50 mil milhões de rands (2,8 mil milhões de euros).
"A polícia ficou sem munições, como balas de borracha e gás lacrimogéneo. Por outro lado, relatos de pessoas que testemunharam a violência sugerem que as pessoas que iniciaram a violência sabiam que teriam pouca resistência, se houvesse alguma", refere-se no documento.
"Disfuncionalidade" no Governo
"As razões para essas falhas são complexas e, por vezes, não são da sua autoria. Em algumas circunstâncias, não receberam informações para poderem planear as operações", dizem ainda os peritos.
A divisão entre ricos e pobres na África do Sul
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Os autores criticam também a "disfuncionalidade" no executivo de Ramaphosa, salientando que, em alguns casos, "impediu" a tomada rápida de decisões. Os peritos defendem que "o Presidente e o seu gabinete de ministros devem assumir a responsabilidade pelo lapso de liderança."
Segundo o relatório, a violência de julho "pode ser analisada no contexto de múltiplas crises e desafios que a África do Sul enfrenta", destacando o "enfraquecimento das instituições do Estado", "elevado desemprego, acima dos 70% entre os jovens", "níveis elevados de pobreza" e "desigualdade profunda" que subsiste no país após cerca de 30 anos de governação democrática.
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Receita para a instabilidade
Destacaram ainda o "mau ordenamento do território, levando a condições de vida superlotadas e inadequadas para muitos, com assentamentos informais surgindo em espaços urbanos lotados, corrupção desenfreada em vários níveis da governação e o fenómeno da captura estatal [pela grande corrupção pública]".
"A combinação dos desafios acima mencionados é uma receita para instabilidade constante", destacam os autores do relatório, salientando que a violência e pilhagens que sacudiram a África do Sul entre 8 e 17 de julho do ano passado.
Poucos dias depois dos tumultos, o Presidente Cyril Ramaphosa destacou cerca de 25.000 soldados para restaurar a ordem pública, abolindo posteriormente o Ministério da Segurança de Estado, que ficou sob a alçada da Presidência da República juntamente com os serviços secretos e de informações.
Espera-se que na próxima quinta-feira (10.02) o chefe de Estado anuncie ao país que medidas irá tomar o seu Governo em resposta ao relatório.
Ramaphosa e Zuma são de fações opostas no ANC, que escolhe um novo líder no final do ano. Espera-se que o atual Presidente concorra à reeleição.
Soweto: a profunda transformação de uma cidade
Soweto era apenas um símbolo do apartheid, mas hoje é considerada um exemplo do vibrante urbanismo sul-africano. 40 anos depois da violenta revolta na "cidade-dormitório" Soweto transformou-se numa atração turística.
Foto: Reuters/S. Sibeko
Futebol e liberdade
"Soccer City"- hoje denominado "FNB Stadium" - é considerado o "coração do futebol sul-africano". O gigantesco complexo desportivo foi construido para o mundial de 2010, mas antes já existia aqui um estádio. Foi precisamente aqui que, em 1990, milhares de sul-africanos aplaudiram a libertação de Nelson Mandela da prisão. Em 2013 teve lugar aqui o funeral do primeiro presidente pós-apartheid.
Foto: picture-alliance/Zuma Press
A casa de um herói
Em Soweto vivia a classe trabalhadora, assim como muitos ativistas anti-apartheid, incluindo o próprio Nelson Mandela, que morou num dos apartamentos construidos pelo governo para os operários negros. Estas casas eram conhecidas por "matchbox houses" - caixas de fósforos - devido ao seu reduzido tamanho. "Foi a minha primeira casa e eu orgulhava-me dela", escreveu Mandela na sua autobiografia.
Foto: Getty Images/C. Furlong
Da sala de aulas diretamente para a luta!
As históricas revoltas do Soweto surgiram praticamente nas escolas da cidade. Em 1976 milhares de estudantes e alunos iniciaram os seus protestos contra o ensino obrigatório de Afrikaans, a língua oficial do regime de apartheid. A revolta estudantil do Soweto constitui um marco importante no declínio e derrube do sistema de apartheid.
Foto: AFP/AFP/GettyImages
Enorme centro comercial
"Maponya Mall" é um dos maiores centros comerciais da África do Sul. Esta megaloja foi inaugurada em 2007 por Mandela. Os promotores do projeto prometiam a criação de muitos postos de trabalho e conseguiram mesmo. Mas muitos pequenos comerciantes também se queixaram da concorrência. Richard Maponya, um dos primeiros milionários negros da África do Sul e promotor do projeto, mora também em Soweto.
Foto: picture-alliance/robertharding/I. Trower
Fúria e violência
Milhares de estudantes negros invadiram as ruas de Soweto: foi o tiro de partida para a luta contra o regime de segregação racial, o início da longa marcha contra o apartheid na África do Sul. No dia 16 de junho de 1976 cerca de 176 jovens foram mortos pelas forças de segurança que dispararam sobre os manifestantes que recusavam abandonar os protestos.
Foto: AFP/Getty Images
o "glamour" de uma central elétrica
As torres "Orlando Towers", que faziam parte de uma central elétrica a carvão, encontram-se agora cobertas de desenhos alusivos à cultura dos "townships". A central fora construida nos anos 30 para fornecer eletricidade aos bairros brancos e ao centro da cidade de Joanesburgo. Enquanto isso o papel dos negros era trabalhar nas minas de carvão que forneciam o combustível para a central.
Foto: picture-alliance/WILDLIFE/M. Harvey
Cultura e cor
O primeiro teatro do Soweto abriu em 2012. O edifício é de uma arquitetura extrovertida e o seu programa não é menos arrojado. Quem assiste às peças aqui apresentadas consegue obter uma boa impressão de como a cidade e a sociedade mudaram nos últimos decénios. O teatro foi construindo com dinheiros públicos.
Foto: Getty Images/AFP/S. de Sakutin
Imagens que perduram
Entre os primeiros a perderem a vida durante as revoltas de 1976 estava o jovem Hector Pieterson, de 13 anos, que foi abatido por uma bala policial. A fotografia de um jovem local a carregar o corpo de Hector foi publicada, no dia seguinte, por inúmeros jornais, um pouco por todo o mundo. E assim aumentou a sensibilidade, um pouco por todos os países, perante as atrocidades do sistema racista.
Foto: Imago/imagebroker
A estrada mais célebre da África do Sul
A única estrada do mundo que chegou a albergar dois prémios Nobel: Nelson Mandela e o arcebispo Desmond Tutu chegaram ambos a morar na Vilakazi Street, em Soweto. Hoje esta rua é uma importante atração turística na África do Sul. Mais de 700mil turistas visitam anualmente as "South Western Townships".
Foto: Getty Images/C. Somodevilla
A luta continua
Muito dinheiro foi investido na transformação do Soweto e a transformação é bem visível: de um gueto para um bairro da moda e atração turística! Mesmo assim muitos habitantes sentem-se desiludidos: a pobreza teima em persistir. A educação continua deficitária. Muitos dizem que a luta está longe de estar acabaca e que há um longo caminho ainda para percorrer.