Cidadãos têm acesso dificultado à justiça em Angola
Manuel Luamba
28 de agosto de 2019
Nas zonas de exploração de madeiras em Angola, controladas por estrangeiros e altas patentes do Estado, a população tem mais dificuldades de acesso à justiça.
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O relatório sobre "Acesso à Justiça” da "Mosaiko" – Instituto para Cidadania – foi apresentado esta quarta-feira (28.08.), em Luanda. O documento com mais de 150 páginas foi produzido nas províncias angolanas do Moxico, Uíge e Kitexi. O estudo conclui que não há acesso à justiça nas zonas de exploração de madeira feita por chineses e com ordens superiores de Luanda.
Segundo Frei Júlio Candeeiro diretor-geral da "Mosaiko" o tema deste estudo participativo foi a extração de madeira nas duas regiões "onde há uma atividade intensa de exploração deste bem”.
Relatório da Mosaiko: Acesso à Justiça em Angola
"O estudo procura saber até que ponto estas pessoas que vivem nestas localidades têm ou não acesso a justiça, não só em relação aos problemas mais comuns que a maioria dos cidadãos angolanos vive, mas no caso muito específico, na relação entre madeireiros e a comunidade, a relação entre o cuidado do meio ambiente e o acesso das pessoas para poderem acorrer a instituições de acesso a justiça e fazer valer os seus direitos em caso de terem sido lesadas”, afirmou Júlio Candeeiro.
Acesso difícil
Contudo a população em geral não sente que tem um acesso facilitado, como relata o Frei Júlio Candeeiro. "É, na verdade, muito do que nós vivemos a sensação de que as pessoas não podem contar com as instituições do Estado ao nível local”.
Dom Tirso Blanco, bispo da Diocese do Luena, considera que a falta de acesso ao ensino dificulta a cultura de acesso à justiça por parte dos cidadãos locais.
"Não existe sobretudo, no interior da província do Moxico, uma cultura de acesso à justiça. (Por exemplo), o município do Alto Zambeze tem 48 mil quilómetros quadrados e há um único sítio hoje onde é possível estudar até à sétima classe, que é na própria cidade de Cazombo que é a sua capital. A partir daí, nós podemos imaginar qual é a cultura de acesso à justiça de forma global”, explicou Dom Tirso.
A exploração de madeira tem causado danos ao meio ambiente, principalmente nas estradas, diz o bispo do Luena. "Moxico só tem 5% da sua rede rodoviária asfaltada o resto são picadas e essas picadas foram seriamente danificadas pelos camiões que transportam as madeiras”.
Segundo Frei Júlio Candeeiro as comunidades locais dizem que quem explora as madeiras nestas regiões são sobretudo asiáticos e pessoas com altas patentes do Estado.
"Apontam o dedo aos chineses, as altas patentes das Forças Armadas no nosso país, mas também há um dedo bastante claro indicando pessoas com alguma autoridade... e para poder suplantar a voz local tem de ser alguém com algum poder cá em cima”, afirmou o Frei Júlio Candeeiro.
O relatório "Avaliação Participativa Sobre Acesso à Justiça” apresentado, esta quarta-feira na capital angolana, no âmbito da exploração da madeira na província do Moxico e Uíge tem mais de 150 páginas. O próximo estudo vai cingir-se só nas zonas de exploração petrolífera.
Angola: Jovens desempregados marcham em Luanda
O elevado índice de desemprego levou os jovens angolanos novamente às ruas. Durante a caminhada de sábado (08.12) os "kunangas", nome atribuído aos desempregados, exigiram políticas para a criação de postos de trabalho.
Foto: DW/B. Ndomba
Caminhar por mais emprego
Onde estão os 500 mil empregos que o Presidente da República, João Lourenço, prometeu durante a campanha eleitoral de 2017? Foi uma das questões colocadas pelos jovens desempregados que marcharam nas ruas de Luanda. A marcha decorreu sob o lema "Emprego é um direito, desemprego marginaliza".
Foto: DW/B. Ndomba
Apoio popular
Populares e vendedores ambulantes apoiaram o protesto deste sábado, que foi também acompanhado pelas forças de segurança. Participaram na marcha algumas associações como o Movimento Estudantil de Angola (MEA) e a Associação Nova Aliança dos Taxistas. Os angolanos que exigem criação de mais postos de trabalho marcharam do Cemitério da Sant Ana até ao Largo das Heroínas, na Avenida Ho Chi Minh.
Foto: DW/B. Ndomba
Níveis alarmantes
O Governo angolano reconhece que o nível de desemprego é preocupante no país. 20% da população em idade ativa está desempregada, segundo dados do Instituto Nacional de Estatística (INE) divulgados no ano passado. Os jovens em Angola são os mais afetados - 46% não têm emprego.
Foto: DW/B. Ndomba
Palavras de ordem
Os manifestantes exibiram vários cartazes com mensagens dirigidas ao Presidente e ao Governo: "João Lourenço mentiroso, onde estão os 500 mil empregos?", "Ser cobrador de táxi não é minha vontade" e "Por kunangar perdi respeito em casa”, foram algumas das questões levantadas.
Foto: DW/B. Ndomba
Estágios, inclusão e subsídios
Além de empregos, os manifestantes exigem políticas de estágio - para que os recém formados tenham a experiência exigida pelas empresas – e programas que beneficiem pessoas com deficiência física. Este sábado, pediram também ao Governo que atribua subsídio de desemprego aos angolanos que não trabalham.
Foto: DW/B. Ndomba
Sem perspetivas de trabalho
O índice do desemprego piorou com a crise económica e financeira em Angola, desde 2015. O preço do crude caiu no mercado internacional, e, como o país está dependente das exportações de petróleo, entraram menos divisas. Muitas empresas foram obrigadas a fechar as portas e milhares de cidadãos ficaram desempregados.
Foto: DW/B. Ndomba
Formados e desempregados
Entre os manifestantes ouvidos pela DW África em Luanda, histórias como a de Joice Zau, técnica de refinação de petróleo, repetem-se. Concluiu a sua formação em 2015 e, desde então, não teve quaisquer oportunidades de emprego: "Já entreguei currículos em várias empresas no ramo petrolífero e nunca fui convocada", conta. Gostaria de continuar a estudar, mas, sem emprego, são muitas as dificuldades.
Foto: DW/B. Ndomba
É preciso fazer mais
Para a ativista Cecília Quitomebe, o Executivo está a "trabalhar pouco para aquilo que é o acesso ao emprego para os jovens". No final da marcha, a organização leu um "manifesto" lembrando que a contestação à política de João Lourenço começou a 21 de julho, quando o mesmo grupo de jovens exigiu mais políticas de emprego. Na altura, a marcha realizou-se em seis cidades. Este sábado, ocorreu em 12.