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RENAMO desarmada: Como se reinventar a nova realidade?

27 de junho de 2023

Em Moçambique, como comportar-se-á a RENAMO agora que entregou oficialmente as suas últimas armas, na semana passada? À DW analistas dizem que a "nova" RENAMO terá de passar a ser um "megafone" da sociedade moçambicana.

Schließung der letzten RENAMO-Militärbasis in Gorongosa
Foto: A. Sebastião/DW

A Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO), o principal partido da oposição em Moçambique, entregou oficialmente as últimas armas. O momento histórico foi comemorado na sexta-feira passada numa cerimónia oficial, em Maputo, mais de 30 anos depois da assinatura do acordo de paz de 1992.

Dirigindo-se ao país, o chefe do Estado moçambicano, Filipe Nyusi, destacou que aquela era "uma oportunidade para que fiquem para a história as escaramuças armadas que ocorriam na região centro do país, aliás, para que fique para a história o derramamento de sangue entre irmãos por causa de divergências políticas."

Nova página

Assim, abre-se uma nova página na história contemporânea moçambicana, descreve à DW o docente universitário Fidel Terenciano. "Este é o caminho que a história moçambicana teria de trilhar. Teríamos de ter o desarmamento real dos partidos políticos", diz o analista.

A força militar da RENAMO foi durante muito tempo usada pelo partido como instrumento de dissuasão contra o regime do dia. Que RENAMO terá Moçambique daqui para frente, sem a sua retaguarda militar?

O professor universitário Ricardo Raboco diz que o futuro político da RENAMO é sinuoso se a liderança do partido não for capaz de se reinventar, traçando novas estratégias de atuação pública.

"Isto implicaria a convocação de um congresso extraordinário e renovar a sua estrutura política, injetando sangue novo [composto por intelectuais e jovens]. Um grupo que, do ponto de vista intelectual e de capacidade de leitura e antecipação dos fenómenos, está mais preparado do que os que se identificam com a guerrilha, que ficaram parados no tempo", aconselha Raboco.

Contestação interna

Antigos guerrilheiros da RENAMO questionaram inclusive, nos últimos meses, a continuação de Ossufo Momade na liderança do partido. Momade sacode constantemente as críticas.

Alguns membros contestam a liderança de MomadeFoto: Bernardo Jequete/DW

Mas para Ricardo Raboco "quando a liderança fecha as portas, me parece um comportamento antidemocrático que coloca em causa a ideia de que a RENAMO é um partido que sempre se bateu pela democracia", sentencia o académico.

O líder da RENAMO, Ossufo Momade, garantiu na sexta-feira (23.06) passada que a desmobilização e desarmamento dos ex-guerrilheiros não é o fim do partido. Pelo contrário, "continuaremos inabaláveis e firmes como alternativa de Moçambique e dos moçambicanos", assegura Momade.

Sobrevivência da RENAMO

Mas como tornar isso uma realidade? O professor universitário Ricardo Raboco diz que, para a RENAMO ter sucesso, terá de ir passo a passo e começar por apostar na governação local. As autárquicas de outubro, em Moçambique, serão já um teste.

"A RENAMO terá de investir [muito] no poder local, para ver se aumenta o número de assentos nas autarquias, nas assembleias provinciais, na Assembleia da República e até mesmo conquistar novas autarquias”, defende Raboco para quem "só isso fará valer a influência da RENAMO no cenário político nacional."

"A RENAMO terá de investir [muito] no poder local (...)", defende RabocoFoto: DW/L. Matias

Mas, para chegar lá, o docente universitário Fidel Terenciano entende que o discurso público da RENAMO terá de ecoar muito mais as preocupações da sociedade, para que o partido possa ser visto como um interlocutor válido no país.

"É preciso que a RENAMO pense em novas estratégias e o discurso público se aproxime um pouco mais do discurso do público em relação não só ao modelo de governação, mas também nas grandes decisões que o Executivo tem tomado nos últimos quatro anos”, diz Terenciano.

O académico sublinha que esta postura faria com que "boa parte dos jovens olhe para a RENAMO como o espaço para onde vai canalizar as suas comunicações e ela as faça chegar ao Governo."

Por outro lado, Fidel Terenciano alerta que o encerramento da última base da RENAMO em Vunduzi, distrito de Gorongosa, não deve ser visto, por si só, como o fim dos conflitos no país. No entender do analista político "a forma como será feita a reintegração dos desmobilizados da RENAMO é que poderá ditar o fim, ou não, das tensões políticas."

O professor Ricardo Raboco acrescenta que a FRELIMO tem de saber partilhar o poder.

"O partido no poder tem de aceitar partilhar o poder com a RENAMO. Continuar a dialogar com a própria RENAMO. E reduzir a partidarização das instituições públicas", conclui Raboco.

O momento do abraço entre Filipe Nyusi e Ossufo Momade

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Background histórico da RENAMO

46 anos depois da sua criação, a RENAMO deixou oficialmente de ter um braço armado. O movimento foi fundado em 1977 sob a liderança de André Matsangaissa, nas matas do distrito de Manica, na província do mesmo nome, no centro de Moçambique. No mesmo ano iniciava a guerra civil em Moçambique, que durou 16 anos.

Dois anos mais tarde, a 17 de outubro de 1979, o primeiro líder da RENAMO, André Matsangaissa foi morto em combate nas matas do distrito de Manica e Afonso Dhlakama, então com 26 anos de idade, assumiu a liderança da guerrilha.

Joaquim Chissano (à esq) e Afonso Dhlakama (à dir), na assinatura do acordo de RomaFoto: picture-alliance/dpa

O líder da RENAMO assinou com o Governo o acordo de Roma, a 4 de outubro de 1992, que pôs fim à guerra dos 16 anos e abriu espaço ao multipartidarismo em Moçambique.

Terminada a guerra civil, Afonso Dhlakama concorreu a cinco pleitos eleitorais como cabeça de lista do seu partido, em 1994, 1999, 2004, 2009 e 2014, e perdeu todos, embora não reconhecesse os resultados eleitorais.

Em 2012, depois de várias ameaças de retorno à guerra, Afonso Dhlakama decide voltar às matas da Gorongosa, onde esteve instalada a principal base do partido durante a guerra civil. E de lá comandou os confrontos militares entre os seus homens e as forças de defesa, nas províncias de Sofala e Manica. O país voltou a viver o espetro da guerra, 20 anos depois.

A 5 de setembro de 2013 foi assinado o acordo de cessação das hostilidades entre Afonso Dhlakama e Armando Guebuza (então Presidente moçambicano), que permitiu a participação de Afonso Dhlakama das eleições de 2014.

Tensão político-militar forçou a intrudução de escoltas militares nas estradas do centro do paísFoto: DW/B. Jequete

Em 2014, Afonso Dhlakama e a RENAMO voltam a não reconhecer os resultados das eleições presidenciais, ganhas por Filipe Nyusi, e a FRELIMO e o país volta a mergulhar numa nova tensão político-militar.

Em maio de 2018, Afonso Dhlakama morreu nas matas da Gorongosa. Ossufo Momade foi eleito como sucessor de Dhlakama na liderança do partido, em 2019. No mesmo ano, Momade e Nyusi assinam o acordo de paz de Maputo, que prevê o Desarmamento, Desmobilização e Reintegração (DDR) dos homens armados da RENAMO.

Foi o início do processo desarmamento dos primeiros homens da RENAMO. Um processo que só encerrou anos depois com o fecho da última base do partido, em Vunduzi, a 15 de junho de 2023.

"Todos pela paz em Moçambique"

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