RENAMO quer mais celeridade nas negociações de paz
Lusa | ar
22 de janeiro de 2019
Em conferência de imprensa, em Maputo, RENAMO manifesta-se descontente com a lentidão das negociações de paz e acusa a FRELIMO de "manobras maquiavélicas" para governar a cidade moçambicana de Quelimane.
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A Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO) manifestou esta terça-feira (22.01.) o seu descontentamento com a lentidão nas negociações de paz com o Governo moçambicano, considerando que continua à espera da integração no exército do número de oficiais previstos no acordo assinado.
"O processo negocial está a caminhar muito lentamente", disse José Manteigas, porta-voz do principal partido de oposição em Moçambique, durante uma conferência de imprensa em Maputo.
Em dezembro, o Governo moçambicano nomeou interinamente três oficiais provenientes da RENAMO para cargos de chefia no exército moçambicano, no âmbito do Memorando de Entendimento assinado em agosto entre as partes.
Nomeados três oficiais em vez de 14
No entanto, para a RENAMO, o Governo moçambicano não está a respeitar os acordos assinados, na medida em que o memorando não prevê nomeações interinas, além do facto de só terem sido nomeados três oficiais em vez dos 14 previstos no memorando."Estas nomeações são contra o espírito e a letra do acordo, mas mesmo assim a RENAMO continua na mesa das negociações e faremos tudo que é possível para que o processo chegue a bom porto", concluiu José Manteigas.
O documento, assinado pelo chefe de Estado moçambicano, Filipe Nyusi, e pelo novo presidente da RENAMO, Ossufo Momade, distribui diversos cargos militares entre a RENAMO e o Governo e, ao nível do Estado-Maior General das Forças Armadas, prevê que, de um total de nove departamentos, três sejam entregues a homens do partido da oposição.
O memorando prevê, adicionalmente, que, de um total de 12 repartições do Exército, quatro sejam entregues à RENAMO, assim como lhe sejam entregues sete posições em brigadas e batalhões independentes - totalizando 14 oficiais da RENAMO a enquadrar nas FADM.
Processo negocial com pouco mais de 1 ano
O mesmo documento prevê ainda o enquadramento de outros "10 oficiais para ocupar postos de direção e comando na Polícia da República de Moçambique (PRM)", mas só depois de um "entendimento referente à sua colocação na orgânica do Ministério do Interior".Oficialmente, o atual processo negocial entre o Governo da FRELIMO, partido no poder, e a RENAMO arrancou há pouco mais de um ano, quando Filipe Nyusi se deslocou à serra da Gorongosa, centro de Moçambique, para uma reunião com o falecido líder da RENAMO, que morreu a 03 de maio do ano passado devido a complicações de saúde.
Além do desarmamento e da integração dos homens do braço armado do maior partido da oposição nas Forças Armadas, a agenda negocial entre as duas partes envolvia a descentralização do poder, ponto que já foi ultrapassado com a revisão da Constituição, em julho.
"Manobras maquiavélicas"
Na conferência de imprensa desta terça-feira, a RENAMO acusou ainda a FRELIMO de manobras para tentar governar Quelimane, considerando que a decisão de afastar Manuel de Araújo do cargo de presidente do município é um "duro golpe à democracia"."O regime continua a usar manobras para contrariar a vontade dos munícipes de Quelimane, lutando maquiavelicamente para obter via secretaria o que perdeu via voto popular", disse o porta-voz José Manteigas.
Em causa está a decisão do Conselho de Ministros de Moçambique de afastar do cargo Manuel de Araújo, que decidiu concorrer pela RENAMO, principal partido da oposição, a um novo mandato na liderança da cidade, quando ainda cumpria as mesmas funções para as quais concorreu e foi eleito pelo Movimento Democrático de Moçambique (MDM), terceiro maior partido.
O autarca de Quelimane, na província da Zambézia, recorreu ao Tribunal Administrativo da decisão do Governo moçambicano, com o fundamento de que não lhe foi dada a oportunidade de se defender em sede do contraditório e que ao caso foi aplicada a lei errada, mas o órgão chumbou o recurso, num acórdão publicado a 11 de janeiro, faltando poucas semanas para o fim do mandato.
"Estratégias do partido no poder"
Para a RENAMO, a decisão do Tribunal Administrativo e a posição do Ministério da Administração Estatal resultam de "estratégias do partido no poder", a FRELIMO, para distrair o povo."É uma encenação e uma tentativa de distrair os moçambicanos, que acompanham atentamente o julgamento internacional dos corruptos da FRELIMO que estão envolvidos nas dívidas ocultas", acrescentou José Manteigas, em alusão aos novos desenvolvimentos de uma investigação norte-americana que revela subornos e outras ilegalidades na contratação de empréstimos para três empresas públicas, num valor total de cerca de 2 mil milhões de dólares.
José Manteigas disse que Manuel de Araújo, que voltou a concorrer e vencer em Quelimane nas eleições autárquicas de 10 de outubro, vai tomar posse no novo mandato.
"Manuel de Araújo irá tomar posse em fevereiro, em cumprimento obrigatório do acórdão de 13 de novembro de 2018 do Conselho Constitucional, um documento que valida e proclama a sua eleição para o cargo", observou o porta-voz, que lembra que as decisões do Conselho Constitucional são de cumprimento obrigatório.
Para quando a posse de M. de Araújo?
O acórdão do Tribunal Administrativo que rejeitou o recurso não faz menção aos efeitos sobre o novo mandato que Manuel de Araújo conquistou com a vitória nas eleições autárquicas do dia 10 de outubro do ano passado, dado que o recurso era sobre o mandato que o autarca cumpria desde 2014.
Nesse sentido, ainda não está juridicamente claro se Manuel de Araújo está habilitado a tomar posse para um novo mandato em função da vitória nas últimas eleições autárquicas ou se o acórdão do Tribunal Administrativo divulgado no dia 11 de janeiro impede esse ato.
Cabo Delgado: Datas marcantes dos ataques armados
Começaram em outubro de 2017 em Mocímboa da Praia e já se alastraram a outros três distritos moçambicanos. Os ataques armados na província de Cabo Delgado, que somam já mais de 130 mortos, ainda não têm solução à vista.
Foto: DW/G. Sousa
Outubro de 2017
Os primeiros ataques de grupos armados desconhecidos na província de Cabo Delgado aconteceram no dia 5 de outubro de 2017 e tiveram como alvo três postos da polícia na vila de Mocímboa da Praia. Cinco pessoas morreram. Cerca de um mês depois, a 17 de novembro, as autoridades dão ordem de encerramento a algumas mesquitas por se suspeitar terem sido frequentadas por membros do grupo armado.
Foto: Privat
Dezembro de 2017
Surgem novos relatos de ataques nas aldeias de Mitumbate e Makulo, em Mocímboa da Praia. Na primeira semana de dezembro de 2017, terão sido assassinadas duas pessoas. Vários suspeitos foram identificados, tendo os moradores dado conta que os atacantes deram sinais de afiliação muçulmana. Por sua vez, a polícia desmentiu o envolvimento do grupo terrorista Al-Shabaab nestes ataques.
Foto: DW/G. Sousa
Janeiro a maio de 2018
Apesar de ter começado calmo, 2018 revelar-se-ia um ano de terror na província de Cabo Delgado com os ataques a alastrarem-se a mais distritos. Dada a gravidade da situação, a Assembleia da República aprovou, a 2 de maio, a Lei de Combate ao Terrorismo. Mas, no final do mês, dia 27, novos ataques foram realizados junto a Olumbi, distrito de Palma. Dez pessoas morreram, algumas decapitadas.
Foto: Privat
2 de junho de 2018
Dias mais tarde, a televisão STV dava conta que as forças de segurança moçambicanas haviam abatido, nas matas de Cabo Delgado, oito suspeitos de participação nos ataques. Foram ainda apreendidas catanas e uma metralhadora AK-47, além de comida e um passaporte tanzaniano. Por esta altura, já milhares de pessoas haviam abandonado as suas casas, temendo a repetição dos episódios de terror.
Foto: Borges Nhamire
4 de junho de 2018
Ainda se "festejava" os avanços na investigação das autoridades, e consequente abate dos suspeitos quando, a 4 e 7 de junho, se registaram novos incêndios nas aldeias de Naunde e Namaluco. Sete pessoas morreram e quatro ficaram feridas. Foram ainda destruídas 164 casas e quatro viaturas. O mesmo cenário voltou a repetir-se a 22 de junho: um novo ataque na aldeia de Maganja matou cinco pessoas.
Foto: Privat
29 de junho de 2018
Fortemente criticado por não se ter ainda pronunciado acerca dos ataques, o Presidente moçambicano Filipe Nyusi resolve fazê-lo, em Palma, perante um mar de gente. Oito meses e 33 mortos [25 vítimas dos ataques e oito supostos atacantes] depois... Em Cabo Delgado, Nyusi prometeu proteção aos cidadãos e convidou os atacantes a dialogar consigo, de forma a resolver as suas "insatisfações".
Foto: privat
Agosto de 2018
Depois de, em julho, um novo ataque à aldeia de Macanca - Nhica do Rovuma, em Palma, ter feito mais quatro mortos, Filipe Nyusi desafiou, a 16 de agosto, os oficiais promovidos no exército, por indicação da RENAMO, a usarem a sua experiência no combate contra estes grupos armados que, mais tarde, a 24 do mesmo mês, tirariam a vida a mais duas pessoas, na aldeia de Cobre, distrito de Macomia.
Foto: Jinty Jackson/AFP/Getty Images
Setembro de 2018
Setembro de 2018 voltava a ser um mês negro no norte de Moçambique. Ataques nas aldeias de Mocímboa da Praia, Ntoni e Ilala, em Macomia, deixaram pelo menos 15 mortos e dezenas de casas destruídas. No final do mês, o ministro da Defesa, Atanásio Mtumuke, afirmou que os homens armados responsáveis pelos ataques seriam "jovens expulsos de casa pelos pais".
Foto: Privat
Outubro de 2018
Um ano após o início dos ataques em Cabo Delgado, a polícia informou que os mais de 40 ataques ocorridos, haviam feito 90 mortos, 67 feridos e destruído milhares de casas. Foi também por esta altura que Filipe Nyusi anunciou a detenção de um cidadão estrangeiro suspeito de recrutar jovens para atacar as aldeias. No final do mês, começaram a ser julgados 180 suspeitos de envolvimento nos ataques.
Foto: privat
Novembro de 2018
Novos relatos de mortes macabras surgem na imprensa. Seis pessoas foram encontradas mortas com sinais de agressão com catana na aldeia de Pundanhar, em Palma. Dias depois, o cenário repetiu-se nas aldeias de Chicuaia Velha, Lukwamba e Litingina, distrito de Nangade. Balanço: 11 mortos. Em Pemba, o embaixador da União Europeia oferecia ajuda ao país.
Foto: Privat
6 de dezembro de 2018
A população do distrito de Nangade terá feito justiça pelas próprias mãos e morto três homens envolvidos nos ataques. Na altura, à DW, David Machimbuko, administrador do distrito de Palma, deu conta que "depois de um ataque, a população insurgiu-se e acabou por atingir alguns deles". Entretanto, o Ministério Público juntou mais nomes à lista dos arguidos neste caso. Entre eles está Andre Hanekom.
Foto: DW/N. Issufo
16 de dezembro de 2018
A 16 de dezembro, e após mais um ataque armado no distrito de Palma, que matou seis pessoas, entre as quais uma criança, Moçambique e Tanzânia anunciaram uma união de esforços no combate aos crimes transfronteiriços. 2018 chegava assim ao fim sem uma solução à vista para os ataques que já haviam feito, pelo menos, 115 mortos. O julgamento dos já acusados de envolvimento nos ataques continua.
Foto: privat
Janeiro de 2019
O novo ano não começou da melhor forma. Sete pessoas morreram quando um grupo armado intercetou uma carrinha de caixa aberta que transportava passageiros entre Palma e Mpundanhar. Na semana seguinte, outras sete pessoas foram assassinadas a tiro no Posto Administrativo de Ulumbi. Um comerciante foi ainda decapitado em Maganja, distrito de Palma, no passado dia 20.