Negociações de paz em Moçambique com "mais força" em 2017
Lusa | ar
20 de dezembro de 2016
Bancada parlamentar da RENAMO, principal partido de oposição, afirmou que as negociações de paz em Moçambique serão retomadas "com mais força ainda em janeiro", assinalando que "tudo falhou este ano".
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"Tudo, tudo falhou este ano, mas acreditamos que em janeiro o diálogo será retomado com mais força ainda. Não é o fim do mundo. Teremos a paz. Trabalhemos para isso", disse esta terça-feira (20.12) a chefe da bancada da RENAMO, Ivone Soares, durante o discurso de encerramento do ano parlamentar.
Ivone Soares reafirmou que a solução para a violência militar que opõe as Forças de Defesa e Segurança moçambicanas e o braço armado da RENAMO passa pela mesa das negociações e que não se deve apostar na eterna medição de forças tentando obter solução através de uma vitória militar.
"As negociações têm sofrido revezes e perturbações, como o assassínio bárbaro de um dos membros da delegação da RENAMO, o saudoso colega, amigo e antigo deputado Jeremias Pondeca Munguambe, bem como de outros membros e quadros do partido", acrescentou a chefe da bancada parlamentar da RENAMO, aludindo à onda de assassínios de membros do partido, supostamente com motivações políticas.
Mediadores internacionaisIvone Soares acusou o Governo moçambicano de afastar os mediadores internacionais do atual processo negocial para a paz no país, defendendo que os mesmos se envolveram no diálogo para ajudar o povo moçambicano.
"Os moçambicanos ficaram incrédulos e surpreendidos com o retrocesso manifestado pela delegação do Governo, reafirmado pelo primeiro-ministro e pelo Presidente da República, que passaram a exigir o afastamento dos mediadores internacionais no processo", declarou.
Por seu turno, o chefe da bancada do Movimento Democrático de Moçambique (MDM), o terceiro partido moçambicano, Lutero Simango, defendeu a ampliação do processo negocial de paz a outros setores da sociedade, considerando que o atual diálogo político não deve ser monopólio da Renamo e da Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO).
"O futuro de Moçambique não deve ser decidido por uma comissão bipartidária nem tão pouco por aqueles que reclamam ser os representantes legítimos do povo", declarou Simango, referindo à comissão mista entre o Governo, RENAMO e mediadores internacionais, criada para as negociações de paz.
Inclusão é elemento fundamental na busca de soluçõesA inclusão, prosseguiu o chefe da bancada do MDM, constituiu um elemento fundamental para a busca de soluções conducentes a uma participação proativa e justa dos recursos económicos do país.
O centro e norte de Moçambique estão a ser assolados pela violência militar, na sequência da recusa da Renamo em aceitar os resultados das eleições gerais de 2014, considerando que a FRELIMO viciou o escrutínio para se manter no poder.
Os trabalhos da comissão mista das delegações do Governo e da RENAMO pararam na semana passada sem acordo sobre o pacote de descentralização exigido pela RENAMO para cessar a crise política e militar em Moçambique e os mediadores abandonaram Maputo, referindo que só regressarão se forem convocados pelas partes.
O Presidente moçambicano disse na segunda-feira (19.12) que propôs à RENAMO a criação de um grupo de trabalho especializado, "sem distinção política" nem a presença do atual grupo de mediadores para discutir o pacote de descentralização e um acordo de paz com o maior partido de oposição.
20 Anos de Paz em Moçambique: Uma viagem
A 4 de outubro de 1992, FRELIMO e RENAMO assinaram o Acordo Geral de Paz, pondo fim a 16 anos de guerra civil em Moçambique. Apesar da paz, a guerra civil continua a marcar a vida de muitos moçambicanos.
Foto: Marta Barroso
A guerra presente todos os dias
A 4 de outubro de 1992, FRELIMO e RENAMO assinaram o Acordo Geral de Paz, pondo fim a 16 anos de guerra civil em Moçambique. Apesar da paz, a guerra civil continua a marcar a vida de muitos moçambicanos. Joula estava grávida de oito meses quando uma mina anti-pessoal lhe arrancou um pé em 1991. Na noite anterior, a RENAMO tinha atacado a aldeia e plantado minas em redor.
Foto: Marta Barroso
De armas a enxadas... ou cadeiras
Desde 1996, o projeto "Armas em Enxadas" dá um novo destino ao material bélico que destruiu milhares de vidas durante a guerra civil. O objetivo da iniciativa, lançada pelo Conselho Cristão de Moçambique, é criar, com as armas, obras de arte com mensagens de paz. Muitas peças foram encontradas pelo país, outras foram recolhidas a privados.
Foto: Marta Barroso
Ataques inesperados
São as mesmas armas que há 20 anos eram usadas para atacar seres humanos como estes refugiados em Chamanculo, perto da capital, Maputo, em 1992. Chamanculo nunca recuperou da chegada de milhares de refugiados da guerra civil. Ainda hoje, é um bairro pobre. Foi aqui que nasceram figuras ilustres do país como Maria de Lurdes Mutola.
Foto: DW/Cristina Krippahl
Ruas desertas em Maputo
A guerra, que se arrastou por 16 anos, atrasou o desenvolvimento do país. Também a vida social sofreu, até mesmo na capital. Engarrafamentos eram, durante a guerra e nos primeiros anos seguintes, algo raro como se pode ver nesta fotografia do centro de Maputo de 1992.
Foto: DW/Cristina Krippahl
Filhos da guerra
Em 1990, Moçambique era considerado o país mais pobre do mundo. Em 2011, ocupava o lugar 184 entre 187 Estados no Índice de Desenvolvimento Humano do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, PNUD. 20 anos depois de assinada a paz, os moçambicanos continuam a viver, em média, 50 anos.
Foto: DW/Cristina Krippahl
Filhos da paz
20 anos depois do Acordo Geral de Paz, ainda há muito que fazer no combate à pobreza em Moçambique. As províncias do Niassa, de Maputo, Cabo Delgado e Tete (na imagem) são, segundo o Programa da ONU para o Desenvolvimento, PNUD, as que têm maior incidência de pobreza no país.
Foto: Marta Barroso
Casa de Espera
Iniciativas como esta na aldeia de Vinho, no Parque Nacional da Gorongosa, província de Sofala, contribuem para diminuir a mortalidade infantil e materna. Atualmente, em Moçambique cerca de 500 mães morrem por cada 100 mil crianças nascidas vivas. Para evitar que isso aconteça na aldeia de Vinho, a Casa de Espera assiste as mulheres grávidas das redondezas na preparação dos partos.
Foto: Marta Barroso
Economia dominada por megaprojetos
A paz possibilitou megaprojetos, como o da exploração de carvão em Moatize, Tete. De futuro, a esperança é de que os rendimentos destes projetos beneficiem mais a população. Devido aos incentivos fiscais de que gozam as multinacionais ligadas a eles, o Estado moçambicano deixa de ganhar mais de 200 milhões de dólares por ano, segundo o Instituto de Estudos Sociais e Económicos (IESE).
Foto: Marta Barroso
Carvão, a euforia de Tete
74 toneladas de carvão já estão carregadas nesta transportadora que pode levar até 400 toneladas. O carvão da província central de Tete tem vindo a atrair investidores nacionais e internacionais à procura do "El Dorado" que tem limitado a diversificação da economia nacional na segunda década de paz em Moçambique.
Foto: Marta Barroso
Cahora Bassa...
Durante a guerra civil, as linhas de transmissão de Cahora Bassa foram alvo de ataques da RENAMO. Hoje, a barragem funciona em pleno. Cahora Bassa tem uma capacidade instalada de 2.075 megawatts, a maior parte da energia é exportada para os países da região: 70% para a África do Sul e 5% para o Zimbabué. Apenas um quarto da eletricidade aqui produzida é consumida em Moçambique.
Foto: DW/M. Barroso
... um elefante branco para esta área do país?
Ainda há poucas casas em redor de Cahora Bassa com acesso regular à eletricidade. Para o economista moçambicano Carlos Castel-Branco do IESE, dever-se-iam estender as bases do desenvolvimento do país às aldeias e vilas em torno da barragem para que também aqui a vida económica se transformasse num elemento de estímulo para o investimento.
Foto: Marta Barroso
Gentes ligadas
A reabilitação das infraestruturas permite agora uma maior mobilidade e fomenta o comércio interno. A linha férrea de Sena liga a província de Tete, no interior de Moçambique, à cidade portuária da Beira. No tempo da guerra civil, foi encerrada e acabou por ser completamente destruída. Nos últimos anos, o corredor ferroviário foi reabilitado para escoar sobretudo o carvão da região de Tete.
Foto: Marta Barroso
Gentes apertadas
O comboio é um dos meios de transporte mais baratos em Moçambique. Em fevereiro de 2012, a Linha de Sena abriu a passageiros em toda a sua extensão. A reconstrução foi feita por troços e acabou por tomar muito mais tempo que o previsto, porque o consórcio indiano responsável pelas obras não cumpriu diversos prazos. Grande parte do dinheiro veio do Banco Mundial.
Foto: Marta Barroso
Há esperança em Moçambique
Idalina Melesse viajou de comboio pela primeira vez em 2012. Durante a guerra civil, os ataques impediram-na de se mover dentro do país. Desde então e até à reabertura da Linha de Sena, não tinha tido dinheiro para longas viagens. A Linha de Sena e outras infraestruturas não só unem moçambicanos, mas devolvem-lhes a liberdade de movimento e a facilidade de comunicação confiscadas pela guerra.