Na primeira entrevista desde que renunciou à Presidência do Zimbabué, Mugabe diz que foi vítima de um golpe de Estado e afirma que se sente traído pelo sucessor, Emmerson Mnangagwa.
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O ex-Presidente zimbabueano, Robert Mugabe, concedeu, esta quinta-feira (15.03), a primeira entrevista desde a sua renúncia. Falando à emissora sul-africana SABC, em Harare, Mugabe disse que foi vítima de um golpe de Estado em novembro do ano passado, o que tornaria ilegal o Governo do seu sucessor, o Presidente Emmerson Mnangagwa.
"Ele nunca teria assumido a Presidência do país sem o Exército, foi o Exército que o ajudou”, frisa Mugabe. "Os militares asseguraram-se de que os outros órgãos do Estado fossem neutralizados, completamente neutralizados”.
Robert Mugabe, de 94 anos de idade, permaneceu por 37 anos no poder. O ex-líder zimbabueano não esquece que foi ele quem levou Mnangagwa ao Governo: "Nunca pensei que Emmerson Mnangagwa, que eu criei e levei ao Governo, tornar-se-ia um dia o homem que iria se virar contra mim".
Segundo o ex-Presidente, para quem a chegada de Emmerson Mnangagwa ao poder é ilegal, o país precisa respeitar as leis. "Devemos desfazer essa desgraça que impusemos a nós mesmos, nós não merecemos isso”, afirma. "O Zimbabué não merece isso, queremos ser um país constitucional. Podemos ter os nossos problemas aqui e ali, mas, em geral, devemos obedecer à lei".
Mugabe frisou, no entanto, que não odeia o seu sucessor, mas insistiu que não iria trabalhar com ele, sugerindo que a sua Presidência é "ilegal" e "inconstitucional": "As pessoas têm de ser escolhidas para o Governo da maneira certa. Estou disposto a discutir e a apoiar esse processo - mas tenho de ser convidado".
Estratégia da oposição?
A entrevista concedida por Robert Mugabe, segundo analistas, foi organizada pela nova Frente Patriótica Nacional (NPF), partido que visa derrotar Emmerson Mnangagwa nas próximas eleições, previstas para agosto. Recentemente, Mugabe, ex-líder do partido do Governo, o ZANU-PF, encontrou-se com o presidente do partido da oposição, o general reformado Ambrose Mutinhiri.
Robert Mugabe: Presidência do Zimbabué é "ilegal"
Mugabe renunciou ao poder a 21 de novembro do ano passado. A renúncia foi forçada pelas Forças Armadas, que tomaram o controlo do país e mantiveram a família do ex-Presidente presa dentro de casa por vários dias.
Entretanto, os militares negaram ter conduzido um golpe de Estado, alegando que realizaram uma operação contra corruptos ligados ao ex-líder, algo que é interpretado como uma referência à Grace Mugabe e seus aliados.
A operação militar ocorreu poucos dias depois de Robert Mugabe ter destituído Mnangagwa da vice-Presidência. Veterano de guerra com forte apoio dentro do partido do Governo, Emmerson Mnangagwa tinha entrado em choque com as ambições políticas de Grace Mugabe.
Apesar de ter sido mantido recluso pelos militares e de contar com a oposição da população, Mugabe negou-se a renunciar e só cedeu depois que o seu partido iniciou uma moção de censura contra ele.
O Zimbabué já foi uma das economias mais promissoras de África, mas sofreu décadas de declínio. Desde que assumiu o poder, Mnangagwa prometeu abrir o país ao investimento estrangeiro e reatar laços com a comunidade internacional.
Família Mugabe: 37 anos de luxo e ostentação
Enquanto Robert Mugabe liderou o Zimbabué, não foi uma preocupação da sua família esconder o luxo em que vivia. Num país em que parte da população é pobre, a família do Presidente exibiu, durante anos, uma vida faustosa.
Foto: Getty Images/M.Safodien
Fortuna de um bilião
Estima o The Guardian que a fortuna de Mugabe deverá rondar um bilião de euros, espalhados, entre outros, em contas secretas na Suiça e Bahamas. Só a sua mansão, localizada a norte de Harare, está avaliada em cerca de oito milhões de euros. Um valor que um cidadão comum no Zimbabué só conseguiria pagar se trabalhasse cerca de 3.825 anos seguidos sem gastar um centavo.
Foto: Getty Images
Seis pessoas, 25 quartos
Desenhada por arquitetos chineses, a mansão “Blue Roof”- com este nome por causa dos azulejos azuis do telhado importados da China - tem 25 quartos. Se cada elemento da família tiver um quarto - Robert, Grace, os três filhos do casal e o filho do primeiro casamento de Grace - sobrarão ainda 19. A casa tem ainda lagos, monitores panorâmicos, cadeiras de veludo e camas em estilo monárquico.
Foto: Getty Images/J.Njikizana
Outras propriedades
Sabe-se que o casal possui ainda propriedades na Malásia, Singapura e Dubai . Em 2009, diz o Sunday Times, Robert e Grace Mugabe adquiriram uma outra casa num bairro de luxo em Hong Kong, cidade onde estudou a sua filha Bona, por 4,5 milhões de euros. Na mesma altura, "Dis Grace", como também é chamada pelos zimbabueanos, terá gasto mais de 60 mil euros em estátuas de mármore do Vietname.
Foto: picture-alliance/dpa/Ym Yik
Casamento extravagante
Robert e Grace Mugabe deram o nó em agosto de 1996, quatro anos após a morte da primeira esposa do presidente do Zimbabué, Sally, ter falecido. O casamento custou um milhão de dólares e contou com 40 mil convidados. Na imprensa local, falou-se no “casamento do século”. Para assinalar o 20º aniversário de casamento, Grace terá comprado um anel de diamantes por 1,15 milhões de euros.
Foto: Getty Images/O.Anderson
"Gucci Grace"
Embora quisesse ser notícia pelo trabalho social que desenvolvia no Zimbabué, a agora ex primeira-dama, apelidada também de "Gucci Grace" pela sua futilidade, era criticada pelos seus gastos pessoais com objetos de luxo. Grace Mugabe, 40 anos mais nova que Robert Mugabe, não escondia as suas roupas, sapatos e jóias de marcas de luxo.
Foto: Getty Images/Z.Auntony
Às compras pela Europa...
Diz o The Guardian que a marca favorita de sapatos de Grace é a Ferragamo. Ao todo, o seu armário, contará com mais de três mil pares de sapatos. Em 2003, o Daily Telegraph deu conta que Grace gastou, numa só viagem a Paris, cerca de 63 mil euros. Já em Londres, a primeira-dama terá gasto 45 mil. Até 2004, Grace terá retirado do Banco Central do Zimbabué mais de cinco milhões de euros.
Foto: Getty Images/J.Delay
Luxo “hereditário”
O gosto por gastar é algo que Grace parece ter incutido nos seus filhos. Só o casamento de Bona (na foto) custou mais de três milhões de euros. Já Robert Jr. e Bellarmine Chatunga, os outros dois filhos do casal, enquanto viveram no Dubai, estiveram instalados num apartamento que tinha uma renda mensal de cerca de 30 mil euros. Já na África do Sul, pagavam cerca de 4,5 mil.
Foto: Getty Images/R.Rahman
Filhos não escondem riqueza
Este ano, o filho mais novo de Mugabe publicou um vídeo onde derramava champanhe Armand de Brignac em cima do seu relógio de luxo. Dias antes, diz o The Guardian, o jovem postou uma fotografia com a legenda “51 mil euros no pulso quando o seu pai comanda o país”. A imprensa local não deixou também passar em branco a excentricidade do enteado de Mugabe, que importou dois luxuosos Rolls-Royce.
Foto: Rolls-Royce
"Gucci Grace" em tribunal
Recentemente “DisGrace” travou uma guerra no tribunal com um negociante de diamantes libanês. Grace Mugabe afirma ter pago cerca de 858 mil euros por um diamante de 100 quilates que não recebeu.
Foto: dapd
Festas de anos milionárias
As festas de anos de Mugabe já eram uma tradição. Ano após ano, em fevereiro, repetiam-se as notícias relacionadas com as suas extravagâncias. No seu 85º aniversário, por exemplo, foram encomendadas duas mil garrafas de champanhe Moet & Chandon e 400 doses de caviar. Já por altura dos seus 91 anos, Mugabe gastou cerca de um milhão de dólares na festa, que teve lugar num hotel de cinco estrelas.
Foto: picture-alliance/dpa/A. Ufumeli
Na mira do “Wikileaks”
Em 2010, as informação reveladas pelo Wikileaks vieram dar razão aos zimbabueanos que criticavam os luxos da família Mugabe. Os documentos divulgados fizeram referência ao envolvimento de elites e altos funcionários do governo do Zimbabué em negócios de diamantes. Um dos nomes citados foi precisamente o de Grace Mugabe.