São Tomé e Príncipe conta com o apoio de Portugal para estudar com a União Europeia (UE) a viabilidade de um acordo de isenção de vistos para circulação de cidadãos são-tomenses no espaço Schengen.
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O Governo são-tomense pediu apoio institucional e diplomático a Portugal, na tentativa de estabelecer com a UE um regime especial de isenção de vistos de curta duração, à semelhança dos expedientes em curso encetados por Cabo Verde junto do Executivo de Lisboa. De acordo com a chefe da diplomacia são-tomense, Elsa Pinto, Portugal prontificou-se a ajudar São Tomé e Príncipe.
"Nós lançámos um desafio a Portugal. Na nossa reflexão, evoluímos para uma solução muito mais interessante, que é de Portugal ser trampolim nas [nossas] negociações para que, à semelhança de Cabo Verde, possamos ter vistos Schengen, ter um acordo de isenção de vistos ordinários com a União Europeia", afirmou.
Oportunidades de trabalho em Portugal
Entretanto, está prevista para breve a ratificação de um acordo de imigração laboral com o Governo português, que vai oferecer aos cidadãos são-tomenses a oportunidade de trabalho sazonal em Portugal. A proposta, segundo Elsa Pinto, "foi muito bem aceite pela parte portuguesa" e Portugal não se opõe à celebração deste acordo no "âmbito do trabalho, de imigração temporária".
São Tomé procura acordo com a UE para cidadãos sem visto
A ideia partiu da Associação da Comunidade São-tomense em Portugal (ACOSP), por intermédio do seu presidente, António Cádio. "Nós temos, em São Tomé e Príncipe, um manancial de mão-de-obra e sabemos também que Portugal tem falta dessa mão-de-obra, sobretudo em alguns serviços", lembra.
António Cádio realça que as áreas como o turismo, a hotelaria e até a agricultura são as bases para que a "proposta que foi feita junto do Governo são-tomense fosse analisada durante a visita da ministra dos Negócios Estrangeiros a Portugal.
O presidente da ACOSP espera que, com a possível assinatura de um acordo neste domínio, a proposta se torne realidade a partir de 2020. "Agora, São Tomé e Príncipe tem de se preparar no que toca à logística. Há que preparar os candidatos que poderão efetuar esse trabalho sazonal. Assim, teremos uma imigração legalizada, uma imigração enquadrada e uma imigração também para o bem do país [Portugal]", sublinha.
Incidente em consulado: "Tempestade em copo de água"
Segundo a ministra dos Negócios Estrangeiros de São Tomé e Príncipe, estas diligências a nível político-diplomático nada têm a ver com o incidente ocorrido em setembro deste ano, quando um cidadão são-tomense destruiu as instalações do setor consular da Embaixada portuguesa em São Tomé, alegando demora prolongada, de mais de seis meses, face aos pedidos de obtenção de vistos para Portugal.
Elsa Pinto diz que não vale a pena "fazer tempestades num copo de água"."Este foi um caso extremamente isolado, anódino. Nós não estamos a ver este comportamento como algo que possa perturbar as relações ou os trabalhos, quer da nossa Embaixada, quer do nosso relacionamento com Portugal", sublinha.
A chefe da diplomacia são-tomense referiu ainda que a questão dos vistos de livre circulação é muito mais complexa e terá respostas no âmbito do projeto de mobilidade dos cidadãos lusófonos no espaço da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP). O tema, como refere a ministra, estará em cima da mesa e conhecerá avanços no primeiro trimestre do próximo ano, aquando da reunião entre os ministros dos Negócios Estrangeiros e os chefes de Estado e de Governo da CPLP.
Jovem são-tomense ajuda sem-abrigo em Lisboa
Depois de passar por dificuldades como imigrante na capital portuguesa, Mirko Santiago tomou a iniciativa de recolher alimentos desperdiçados e distribuí-los aos sem-abrigo.
Foto: DW/Joao Carlos
Gesto de solidariedade
Mirco Djallu Vaz Santiago abraçou uma causa solidária. O jovem são-tomense de 26 anos chegou a Portugal em 2010 como turista e passou por inúmeras dificuldades como imigrante. Mesmo em situação irregular em Portugal, decidiu por conta própria ajudar os sem-abrigo espalhados pela capital portuguesa. Atualmente, abraça o desafio contra o desperdício.
Foto: DW/Joao Carlos
Contra o desperdício
Mirco Santiago trabalhava antes numa fábrica de bolos, que eram comercializados em supermercados. No trabalho, viu que muitos bolos iam diariamente para o lixo por não estarem em condições adequadas de comercialização. De modo a evitar o desperdício, achou por bem doar os bolos que recebia às pessoas carenciadas a viver nas ruas de Lisboa.
Foto: Instagram/@tchezboy
Para os que mais necessitam
Na sua rotina entre o trabalho e a casa, o jovem de São Tomé e Príncipe tratou de identificar quem seriam os potenciais beneficiários da sua ação humanitária. Partilhou a ideia pelas redes sociais e encontrou muitos apoiantes entre os seus seguidores no Facebook e no Instagram. Mirco Santiago lamenta o volume de alimentos, ainda em bom estado de consumo, que são deitados ao lixo.
Foto: DW/Joao Carlos
Mãos à obra
Não conformado com a situação, Mirco Santiago meteu mãos à obra. Saiu à rua e fez algo de útil pelos outros. Ao longo da semana, nos dias destinados à recolha de lixo, desloca-se por meios próprios aos locais onde sabe que há desperdício, que lhe é doado. E recolhe pequenas quantidades.
Foto: Instagram/@tchezboy
Organização das embalagens
Mirco Santiago recolhe vários alimentos. Na casa onde vive, em Loures, tem a preocupação de conservar os alimentos, como frango, entrecosto, salsicha, pão e bolos de carne. Depois, no dia seguinte, aquece os produtos e organiza a composição das embalagens. A distribuição é feita até antes da uma da manhã, porque tem de apanhar o metro para regressar à casa.
Foto: Instagram/@tchezboy
Abandonados
No Largo de São Domingos, no Rossio, pernoitam muitos sem-abrigo, alguns incomodados com o facto de terem sido abandonados à sua sorte. É o caso de Ana Maria, nascida no Alentejo, que partilha o local onde dorme no chão. Ana Maria viveu dois anos sozinha na rua antes de encontrar o companheiro João Paulo.
Foto: DW/Joao Carlos
"Queremos trabalho"
O companheiro de Ana Maria veio de São Tomé num avião militar quando tinha 11 meses. O pai era militar e a mãe empregada doméstica. Técnico de impressora de offset, acabou por ficar desempregado. Foi assim que veio parar à rua. "Queremos trabalho", reclama. João Paulo recusa o rendimento mínimo, mas não recusa a ajuda de Mirco Santiago, pessoa que, para ele, nunca será esquecida.
Foto: DW/Joao Carlos
"Devia haver mais pessoas assim"
Faz agora um ano que este homem, que pediu para não ser identificado, vive na rua. O motivo foi uma separação dolorosa. Ao referir-se a Mirco Santigo, diz: "Tem um nome de santo". O sem-abrigo elogia a iniciativa do jovem são-tomense. "Devia haver mais pessoas assim. Há muito poucas. Como ele só conheço mais um senhor", sublinhou.
Foto: DW/Joao Carlos
Continuar a alimentar sorrisos
Atualmente, Mirco Santiago não tem emprego. Participa apenas como figurante numa novela durante o dia. À noite, apesar de alguns entraves e de haver instituições que fazem doações na capital, o jovem está decidido a continuar com este gesto, admitindo a possibilidade de vir a distribuir comida quente confecionada em casa. Quer assim alimentar o sorriso das pessoas que vivem nas ruas da cidade.
Foto: DW/Joao Carlos
Serviços de barbearia
A higiene e a saúde dos sem-abrigo também inquietam o jovem são-tomense. Mirco Santiago pediu ajuda a um amigo cabo-verdiano, Patrick Fernandes, que se disponibilizou a cortar o cabelo de pessoas que vivem nas ruas. "Também já passei por muita coisa. É uma boa atitude da parte dele", sublinha Mirco, que espera contar com o apoio de outros amigos.
Foto: DW/Joao Carlos
Amigo aceitou o desafio
O brasileiro Neto Guerra, barbeiro de profissão, também aceitou o desafio de cuidar do cabelo dos sem-abrigo, sempre que possível. É para ele e Mirco Santiago uma espécie de retribuição pelas ajudas que também receberam no passado quando enfrentaram dificuldades.
Foto: DW/Joao Carlos
"Ficamos com outro aspeto"
João Paulo, que vive nas ruas de Lisboa, critica o sistema social português e agradece o gesto solidário destes jovens. "Esta oportunidade chegou em boa hora", afirma. "Ficamos com outro aspeto".