STP: Jovens questionam processo que impede milhares de votar
Lusa
22 de setembro de 2022
Presidente da Rede Pan-Africana da Juventude questionou a imparcialidade do processo eleitoral em São Tomé e Príncipe, após a falta de atualização do recenseamento eleitoral, que terá impedido oito mil jovens de votar.
Publicidade
"Olhamos com bastante preocupação, porque se trata de um número bastante significativo de jovens que deveriam exercer o seu direito de voto, um direito consagrado na Constituição da República Democrática de São Tomé e Príncipe", disse Romilson Silveira.
Segundo os cálculos da organização, cerca de oito mil jovens que completaram 18 anos desde a última atualização dos cadernos eleitorais ficam impedidos de votar nas eleições legislativas, autárquicas e regional do próximo domingo (25.09). "É um número bastante significativo. Ainda que fosse um jovem. É um direito constitucional", lamentou.
Em entrevista à Lusa, o presidente da CEN, José Carlos Barreiros, disse na semana passada que apenas "um número insignificante" de eleitores que mudaram de residência ficarão sem votar no próximo domingo. "Em relação aos não eleitores que não foi possível fazer o recenseamento […] terão outra oportunidade nas próximas eleições de fazerem o recenseamento para depois exercer o seu direito de voto", acrescentou o magistrado que preside à CEN.
O responsável da organização de defesa dos jovens lamentou esta posição. "É preocupante quando o órgão com a responsabilidade da Comissão Eleitoral, que organiza todo o processo eleitoral até ao escrutínio final, tenha este tipo de declarações públicas, sobretudo num país em que 65% da população é jovem. Aqui coloca-se a questão da imparcialidade e da transparência do próprio processo", disse Romilson Silveira.
Publicidade
Manifestação a reclamar o recenseamento
A ala da juventude da Ação Democrática Independente (ADI, oposição) promoveu uma manifestação a reclamar o recenseamento, enquanto os jovens do Movimento de Libertação de São Tomé e Príncipe/Partido Social Democrata (MLSTP/PSD, no poder) responsabilizaram o Presidente da República.
O chefe de Estado são-tomense, Carlos Vila Nova, afirmou em julho que a não realização do recenseamento impede os jovens que completaram 18 anos e os cidadãos que mudaram de círculos eleitorais ou que emigraram de votar ou de serem eleitos, o que, alertou, representa "ma violação grosseira e uma grave afronta à Constituição da República".
São Tomé e Príncipe, destacou Romilson Silveira, tem muitos jovens "cheios de energia que querem contribuir para o desenvolvimento do país".
Sobre a campanha atualmente em curso, com vista às eleições legislativas, autárquicas e regional no próximo domingo, o dirigente disse ver "com preocupação" um "distanciamento dos jovens deste processo eleitoral, porque depois da eleição, os jovens são renegados". "As políticas públicas não refletem os anseios da juventude. Há esse desacreditar da classe política. Os jovens vão votar, mas há uma deceção", comentou, acrescentando que "toda a juventude, senão a grande parte, quer sair do país porque não encontra aqui alternativa".
Temas que preocupam os jovens, como as alterações climáticas ou a questão da energia, "não estão em cima da mesa".
Os jovens, prosseguiu, "estão envolvidos no processo ou nos partidos políticos", mas "são muitas vezes utilizados para atingir determinados fins, são uma alavanca para atingir o poder, e depois são renegados". "No processo de tomada de decisão, eles não são tidos em conta", salientou Romilson Silveira.
São Tomé e Príncipe: Como a pandemia mudou a vida das pessoas
Na capital do país, São Tomé, profissionais dos mais diversos setores ralatam as intempéries causadas pela Covid-19, mas falam em esperança num futuro sem pandemia.
Foto: João Carlos/DW
Impacto negativo das restrições
Quem chega às ilhas de São Tomé e Príncipe, plantadas no meio do Oceano Atlântico, depara com um ambiente de quase total abstração sobre a existência da Covid-19. A maior parte da população não usa máscara facial. Mas a pandemia do novo coronavírus obrigou a muitas restrições e teve um forte impacto negativo na vida social e económica deste país da África Central.
Foto: João Carlos/DW
Normalidade em plena pandemia
Apesar dos vários avisos e informações oficiais recomendarem cuidados preventivos e proteção por causa do coronavírus e de suas variantes, muitos são-tomenses levam a sua vida quotidiana com normalidade, praticamente a ignorar que a Covid-19 constitui um problema de saúde pública. No entanto, há quem reconheça que a doença provocou perturbações no quotidiano da população.
Foto: João Carlos/DW
A vida está mais difícil
Taxista, 40 anos de idade, pai de quatro filhos, Euclides Gonçalves é quem sustenta a família. A vida que já não era está fácil ficou ainda mais difícil desde o início da pandemia de Covid-19. "Sentimos muita pressão com esta pandemia", afirma. "O negócio arrefeceu e é mais complicado ganhar dinheiro", diz o taxista, reconhecendo que "vivemos um momento de crise mundial".
Foto: João Carlos/DW
Subsídio do Estado é irrisório
O subsídio de cerca de 60 euros atribuído apenas uma vez pelo Governo são-tomense foi irrisório face à dimensão dos prejuízos que os taxistas sofrem depois do surto da pandemia. "O santomense nunca acreditou que houve Covid-19 em São Tomé e Príncipe", afirma Euclides, explicando a razão pela qual já não exige aos passageiros o uso de máscaras.
Foto: João Carlos/DW
Clientes também têm dificuldades
Fernando Afonso Vila Nova, motoqueiro de 62 anos de idade, também tem limitações para sustentar a família. Ainda com filhos na escola, consegue o sustento com muito sacrifício, já agravado pelo acidente de viação que lhe afetou as pernas e um braço. A crise pandémica agudizou a sua situação e de muitos colegas: "Há pouco movimento porque os clientes também passam por dificuldades".
Foto: João Carlos/DW
Nem barba, nem cabelo e tampouco bigode
A Barbearia Rita é uma das mais antigas da cidade de São Tomé. Edne Sacramento, cabeleireiro há 17 anos e pai de três filhos, testemunha em que medida a Covid-19 prejudicou a sua atividade. "Antes da pandemia, tínhamos muitos clientes", relata. Mas "depois da pandemia, muitos sentiam aquele receio de vir cá ao salão cortar cabelo, apesar de cumprirmos as regras todas".
Foto: João Carlos/DW
Escassez de mercadorias
Maria Helena da Mata, há mais de 30 anos no comércio, diz que é "muito forte" o impacto na sua atividade. O país depende totalmente do exterior: "Houve falta de transporte marítimo, o que provocou escassez de mercadorias". Além disso, a crise afetou a situação das famílias. "As pessoas não têm dinheiro, não têm poder de compra. Isso faz com que o comércio esteja também numa situação caótica".
Foto: João Carlos/DW
Encerramentos e incertezas
Os setores da restauração, viagens e eventos não ficaram ilesos. Elisabete Carvalho avalia a atual conjuntura com algum alívio porque fez investimentos próprios sem recorrer a créditos. Ainda assim, foi obrigada a fechar os serviços e isso acabou por afetar muitas famílias que empregava. "Neste momento, tudo é uma incerteza", refere.
Foto: João Carlos/DW
O peixe de cada dia
Nascido na localidade de Praia Gambôa, arredores de São Tomé, o pescador Cristovão da Trindade confirma que a sua atividade também sofreu com a redução da campanha e limitação à circulação das "palaiês" [vendedeiras de peixe], afetando o rendimento de toda a comunidade. Agora que diminuiu o número de casos de infetados, ele e os demais pescadores tentam recuperar o tempo perdido.
Foto: João Carlos/DW
Acostumar-se ao teletrabalho
O jurista Weiko Bastos diz que a pandemia pesou fundamentalmente na redução da receita e dos honorários. Levou à diminuição da quantidade e qualidade de clientes. Isso, aliado ao confinamento, atingiu igualmente o orçamento da sua família, forçada a fazer contenção de gastos. "Não estávamos preparados para o teletrabalho e não tinha Internet em casa. As dificuldades eram maiores", recorda.
Foto: João Carlos/DW
Estudar em casa
O professor e escritor, Lúcio Amado é um observador crítico da sociedade são-tomense. Considera que a principal preocupação da população é a sobrevivência, o que faz com que se não dê muita atenção à luta contra a Covid-19. No entanto, reconhece, a pandemia teve reflexos perversos no sistema de ensino. As turmas tinham números elevados de alunos que foram forçados a ficar em casa.
Foto: #
Dançar conforme a música
Tem um disco novo que devia ter sido lançado em 2020, o que não aconteceu devido à Covid-19. "Tive que suspender todos os trabalhos", explica Kalú Mendes, produtor e um dos músicos de referência de São Tomé e Príncipe. '"Também as grandes editoras começaram a ter problemas financeiros", afirma. No entanto, continua a trabalhar e espera ter o disco no mercado em 2022.
Foto: João Carlos/DW
Resistir à turbulência
Outra referência das artes das ilhas, João Carlos Nezó resiste às intempéries no sul de São Tomé: "Aqui o mercado de arte é muito pequeno", dependente de turistas estrangeiros. Com a pandemia, deixou de vender. Ficou em primeiro lugar num concurso da Aliança Francesa, que lhe dava o passaporte para participar numa residência artística. "Não pude ir porque a pandemia durou dois anos", lamenta.
Foto: João Carlos/DW
Quebra brutal no turismo
Ligada a um empreendimento turístico ecológico no sul de São Tomé, Luísa Carvalho lamenta a quebra de turistas. "Todos os dias há cancelamentos de reservas. Antes da pandemia, tínhamos muita procura", garante a gerente. "De julho até então", adianta, "têm estado a aparecer alguns clientes curiosos", que fogem um pouco à situação, por exemplo, na Europa. Ms prevê: "Isto já não será como era antes".
Foto: João Carlos/DW
Resistência à vacinação
No início, havia resistência da maioria dos são-tomenses em aceitar a vacina contra a Covid-19, devido a rumores sobre a Astrazeneca. No entanto, com a campanha iniciada a 15 de março, aumentou a adesão da população, diz Solange Barros, coordenadora do Programa Nacional de Vacinação. "As vacinas são todas eficazes". Mas, dá conta, a adesão à segunda dose ficou muito aquém do esperado.
Foto: João Carlos/DW
À espera da terceira dose
Daniel Costa reconhece que "a pandemia afetou toda a gente". Para este antigo militar das Forças Armadas, as restrições impostas pelo confinamento e fracos salários agravaram o nível de pobreza da população. Sentiu-se algum alívio com as medidas de apoio do Governo aos mais carenciados. Diz que está pronto para tomar a terceira dose de qualquer vacina e aconselha as pessoas a se vacinarem.
Foto: João Carlos/DW
Manter a esperança e o otimismo
Apesar de algum receio, há uma mensagem de esperança entre os são-tomenses. Os nossos entrevistados acreditam que "as coisas poderão melhorar" nos próximos tempos, sobretudo para a atividade turística afetada sobremaneira. Vive-se uma "normalidade aparente", como diz Elisabete Carvalho, mas a expetativa está em 2022, porque, argumenta Weiko Bastos, "a economia não suporta mais confinamentos".