São Tomé: Sociedade quer compromisso no combate à corrupção
Lusa
13 de abril de 2022
A Federação das Organizações Não-Governamentais de São Tomé e Príncipe pediu um "compromisso inadiável" na luta contra a corrupção, a impunidade e outras "fragilidades" que têm dificultado o desenvolvimento do país.
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O repto foi lançado esta terça-feira (12.04) pelo presidente da Federação das Organizações Não-Governamentais de São Tomé e Príncipe (FONG-STP), Cândido Rodrigues, na abertura de um intercâmbio internacional sobre a governação e luta contra a corrupção, que durante dois dias reúne em São Tomé jornalistas, investigadores e outros atores de diferentes países para partilha de experiência na promoção da boa governação e o combate a corrupção, no âmbito do projeto sociedade civil pela transparência e integridade, financiado pela União Europeia e pela Cooperação Portuguesa.
"A luta contra a corrupção e a impunidade deve constituir um compromisso inadiável para todas as forças do quadrante político e social, para que tenhamos um país próspero que não deixa ninguém para trás", defendeu Cândido Rodrigues.
O presidente da FONG-STP referiu que apesar de vários avanços no domínio de boa governação, "São Tomé e Príncipe apresenta algumas fragilidades que dificultam o desenvolvimento do país, nomeadamente, a existência de censura nos meios de comunicação estatais, a ausência de independência do poder judicial ou a falta de acesso a informação por parte dos cidadãos".
STP desce no índice de perceção da corrupção
Cândido Rodrigues recordou que no ano passado o país desceu três posições no índice de perceção da corrupção da organização Transparência Internacional e está no 12º lugar, com "uma qualificação particularmente baixa no domínio de acesso a informação e dos mecanismos anticorrupção", entre 55 países que constam no índice Mo Ibrahim 2020 sobre a Governação em África.
São-tomenses nas ruas contra o Governo
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"Se olharmos para o panorama do país, podemos perceber o quanto a corrupção tem adiado a nossa perceção de viver com dignidade em São Tomé e Príncipe", considerou Cândido Rodrigues, defendendo que a participação das pessoas e das organizações da sociedade civil "concorre para o fortalecimento da democracia e consequentemente para o melhor controlo da gestão dos recursos públicos" e do desenvolvimento do arquipélago.
Acrescentou que "os cidadãos têm o direito de viver num país onde o Estado, os dirigentes e as instituições sejam transparente", e que, apesar de sucessivos relatórios do Tribunal de Contas terem detetado "vários atos de má gestão de recursos públicos", a falta de consequências para os infratores está a criar "antecedentes nefastos" para o futuro da sociedade.
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Alguns progressos
No entanto, o embaixador de Portugal em São Tomé e Príncipe, Rui Carmo, apontou alguns progressos alcançados no âmbito do projeto sociedade civil pela transparência ao longo dos últimos anos. "Em muito tem contribuído para: a criação de um ambiente mais propicio a promoção da transparência e boa governação em São Tomé e Príncipe e para a melhoria da prestação de contas pelas instituições públicas; para uma população mais bem informada sobre políticas públicas, a governação do país e o seu direito e dever de participar; para jornalistas mais bem preparados e de informações mais credíveis e para uma FONG mais forte, mais dinâmica, com ações reconhecidas e respeitadas", precisou Rui Carmo.
A representante da Associação para a Cooperação Entre os Povos (ACEP), Fátima Proença, recordou que várias organizações da sociedade civil são-tomense têm realizado ações de advocacia "no sentido de influenciar a Assembleia Nacional [parlamento são-tomense] para adotar o amplo projeto de lei de acesso aos documentos e informações da administração que tem como objetivo vincular os órgãos e entidades da administração pública são-tomenses, ou que com ela colaborem, no respeito por esse direito e disponibilizarem informação e documentação de interesse público".
"A nível da Assembleia Nacional estamos disponíveis para todo tipo de ação em torno dessas questões, na sua discussão, na sua tomada de análise de aprovação de instrumentos legais para por em curso estas questões", disse o vice-presidente da Assembleia Nacional, Guilherme Octaviano que fez a abertura do evento.
No leque de painelistas do intercâmbio internacional sobre governação e luta contra a corrupção figuram personalidades como o procurador-geral da República de São Tomé e Príncipe, Kelve Nobre de Carvalho, a diplomata e ex-eurodeputada portuguesa Ana Gomes, o fundador do Centro de Estudos para a Boa Governação em Angola (UFOLO), Rafael Marques, entre outros representantes de organizações internacionais e da sociedade civil.
São Tomé e Príncipe: Como a pandemia mudou a vida das pessoas
Na capital do país, São Tomé, profissionais dos mais diversos setores ralatam as intempéries causadas pela Covid-19, mas falam em esperança num futuro sem pandemia.
Foto: João Carlos/DW
Impacto negativo das restrições
Quem chega às ilhas de São Tomé e Príncipe, plantadas no meio do Oceano Atlântico, depara com um ambiente de quase total abstração sobre a existência da Covid-19. A maior parte da população não usa máscara facial. Mas a pandemia do novo coronavírus obrigou a muitas restrições e teve um forte impacto negativo na vida social e económica deste país da África Central.
Foto: João Carlos/DW
Normalidade em plena pandemia
Apesar dos vários avisos e informações oficiais recomendarem cuidados preventivos e proteção por causa do coronavírus e de suas variantes, muitos são-tomenses levam a sua vida quotidiana com normalidade, praticamente a ignorar que a Covid-19 constitui um problema de saúde pública. No entanto, há quem reconheça que a doença provocou perturbações no quotidiano da população.
Foto: João Carlos/DW
A vida está mais difícil
Taxista, 40 anos de idade, pai de quatro filhos, Euclides Gonçalves é quem sustenta a família. A vida que já não era está fácil ficou ainda mais difícil desde o início da pandemia de Covid-19. "Sentimos muita pressão com esta pandemia", afirma. "O negócio arrefeceu e é mais complicado ganhar dinheiro", diz o taxista, reconhecendo que "vivemos um momento de crise mundial".
Foto: João Carlos/DW
Subsídio do Estado é irrisório
O subsídio de cerca de 60 euros atribuído apenas uma vez pelo Governo são-tomense foi irrisório face à dimensão dos prejuízos que os taxistas sofrem depois do surto da pandemia. "O santomense nunca acreditou que houve Covid-19 em São Tomé e Príncipe", afirma Euclides, explicando a razão pela qual já não exige aos passageiros o uso de máscaras.
Foto: João Carlos/DW
Clientes também têm dificuldades
Fernando Afonso Vila Nova, motoqueiro de 62 anos de idade, também tem limitações para sustentar a família. Ainda com filhos na escola, consegue o sustento com muito sacrifício, já agravado pelo acidente de viação que lhe afetou as pernas e um braço. A crise pandémica agudizou a sua situação e de muitos colegas: "Há pouco movimento porque os clientes também passam por dificuldades".
Foto: João Carlos/DW
Nem barba, nem cabelo e tampouco bigode
A Barbearia Rita é uma das mais antigas da cidade de São Tomé. Edne Sacramento, cabeleireiro há 17 anos e pai de três filhos, testemunha em que medida a Covid-19 prejudicou a sua atividade. "Antes da pandemia, tínhamos muitos clientes", relata. Mas "depois da pandemia, muitos sentiam aquele receio de vir cá ao salão cortar cabelo, apesar de cumprirmos as regras todas".
Foto: João Carlos/DW
Escassez de mercadorias
Maria Helena da Mata, há mais de 30 anos no comércio, diz que é "muito forte" o impacto na sua atividade. O país depende totalmente do exterior: "Houve falta de transporte marítimo, o que provocou escassez de mercadorias". Além disso, a crise afetou a situação das famílias. "As pessoas não têm dinheiro, não têm poder de compra. Isso faz com que o comércio esteja também numa situação caótica".
Foto: João Carlos/DW
Encerramentos e incertezas
Os setores da restauração, viagens e eventos não ficaram ilesos. Elisabete Carvalho avalia a atual conjuntura com algum alívio porque fez investimentos próprios sem recorrer a créditos. Ainda assim, foi obrigada a fechar os serviços e isso acabou por afetar muitas famílias que empregava. "Neste momento, tudo é uma incerteza", refere.
Foto: João Carlos/DW
O peixe de cada dia
Nascido na localidade de Praia Gambôa, arredores de São Tomé, o pescador Cristovão da Trindade confirma que a sua atividade também sofreu com a redução da campanha e limitação à circulação das "palaiês" [vendedeiras de peixe], afetando o rendimento de toda a comunidade. Agora que diminuiu o número de casos de infetados, ele e os demais pescadores tentam recuperar o tempo perdido.
Foto: João Carlos/DW
Acostumar-se ao teletrabalho
O jurista Weiko Bastos diz que a pandemia pesou fundamentalmente na redução da receita e dos honorários. Levou à diminuição da quantidade e qualidade de clientes. Isso, aliado ao confinamento, atingiu igualmente o orçamento da sua família, forçada a fazer contenção de gastos. "Não estávamos preparados para o teletrabalho e não tinha Internet em casa. As dificuldades eram maiores", recorda.
Foto: João Carlos/DW
Estudar em casa
O professor e escritor, Lúcio Amado é um observador crítico da sociedade são-tomense. Considera que a principal preocupação da população é a sobrevivência, o que faz com que se não dê muita atenção à luta contra a Covid-19. No entanto, reconhece, a pandemia teve reflexos perversos no sistema de ensino. As turmas tinham números elevados de alunos que foram forçados a ficar em casa.
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Dançar conforme a música
Tem um disco novo que devia ter sido lançado em 2020, o que não aconteceu devido à Covid-19. "Tive que suspender todos os trabalhos", explica Kalú Mendes, produtor e um dos músicos de referência de São Tomé e Príncipe. '"Também as grandes editoras começaram a ter problemas financeiros", afirma. No entanto, continua a trabalhar e espera ter o disco no mercado em 2022.
Foto: João Carlos/DW
Resistir à turbulência
Outra referência das artes das ilhas, João Carlos Nezó resiste às intempéries no sul de São Tomé: "Aqui o mercado de arte é muito pequeno", dependente de turistas estrangeiros. Com a pandemia, deixou de vender. Ficou em primeiro lugar num concurso da Aliança Francesa, que lhe dava o passaporte para participar numa residência artística. "Não pude ir porque a pandemia durou dois anos", lamenta.
Foto: João Carlos/DW
Quebra brutal no turismo
Ligada a um empreendimento turístico ecológico no sul de São Tomé, Luísa Carvalho lamenta a quebra de turistas. "Todos os dias há cancelamentos de reservas. Antes da pandemia, tínhamos muita procura", garante a gerente. "De julho até então", adianta, "têm estado a aparecer alguns clientes curiosos", que fogem um pouco à situação, por exemplo, na Europa. Ms prevê: "Isto já não será como era antes".
Foto: João Carlos/DW
Resistência à vacinação
No início, havia resistência da maioria dos são-tomenses em aceitar a vacina contra a Covid-19, devido a rumores sobre a Astrazeneca. No entanto, com a campanha iniciada a 15 de março, aumentou a adesão da população, diz Solange Barros, coordenadora do Programa Nacional de Vacinação. "As vacinas são todas eficazes". Mas, dá conta, a adesão à segunda dose ficou muito aquém do esperado.
Foto: João Carlos/DW
À espera da terceira dose
Daniel Costa reconhece que "a pandemia afetou toda a gente". Para este antigo militar das Forças Armadas, as restrições impostas pelo confinamento e fracos salários agravaram o nível de pobreza da população. Sentiu-se algum alívio com as medidas de apoio do Governo aos mais carenciados. Diz que está pronto para tomar a terceira dose de qualquer vacina e aconselha as pessoas a se vacinarem.
Foto: João Carlos/DW
Manter a esperança e o otimismo
Apesar de algum receio, há uma mensagem de esperança entre os são-tomenses. Os nossos entrevistados acreditam que "as coisas poderão melhorar" nos próximos tempos, sobretudo para a atividade turística afetada sobremaneira. Vive-se uma "normalidade aparente", como diz Elisabete Carvalho, mas a expetativa está em 2022, porque, argumenta Weiko Bastos, "a economia não suporta mais confinamentos".