O Presidente de Moçambique assume esta segunda-feira a presidência rotativa da SADC, numa cimeira que deve aprovar "resolução apropriada" para insurgência em Cabo Delgado, adianta oposição da África do Sul.
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Moçambique assume esta segunda-feira (17.08) a presidência rotativa da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC).
A Tanzânia entregará a presidência a Filipe Nyusi durante a 40.ª cimeira anual da organização, que este ano será virtual, por causa da Covid-19, e "onde se espera que o desastre em Cabo Delgado e as ameaças dos insurgentes serão discutidos e aprovada uma resolução apropriada".
Quem o afirma é o responsável da Defesa no maior partido da oposição na África do Sul, a Aliança Democrática (DA, na sigla em inglês), em declarações à agência Lusa na sexta-feira (14.08).
"Se a SADC leva a sério a região e o seu papel na região, deve absolutamente decidir o que fazer em Cabo Delgado", afirmou o deputado Kobus Marais que defendeu ainda uma missão especial ao local.
"Esperemos que seja aprovado o envio de um enviado especial a Cabo Delgado para apuramento de factos, e que façamos parte do enviado especial multipartidário", salientando que a maior necessidade de Pretória neste momento "são informações credíveis e confiáveis, que parecem não atender aos requisitos rigorosos".
Intervenção militar
Para Kobus Marais, que tem instado na Assembleia Nacional sul-africana a ministra da Defesa a pronunciar-se sobre os riscos regionais do conflito armado em Cabo Delgado e a presença de "células" do ISIS (Estado Islâmico) na África do Sul, "qualquer intervenção [militar sul-africana] deve envolver, e de preferência ser, uma iniciativa da SADC que deve considerar a segurança e estabilidade da região e dos países da região".
"Existe uma força de intervenção da SADC que está operacional no Leste da RDC [República Democrática do Congo] como parte da Brigada de Intervenção da Força da Monusco [Missão das Nações Unidas na RDC]", adiantou o deputado sul-africano.
"Se e quando as forças armadas da RSA [República da África do Sul] forem destacadas, deve ser em primeiro lugar para proteger os nossos próprios interesses de estabilidade económica e política, em segundo lugar prestar ajuda humanitária, e em terceiro, prestar assistência a Moçambique com base nos seus pedidos à RSA de ajuda e assistência", defendeu Marais.
Segurança das fronteiras
De acordo com o deputado, "devem ser intervenções sancionadas pela SADC, União Africana e Organização das Nações Unidas".
"A África do Sul e os nossos ministérios relevantes devem considerar seriamente o aumento das medidas de segurança nas nossas fronteiras com Moçambique, Zimbabué e Suazilândia para prevenir qualquer movimento transfronteiriço indesejado e ilegal de pessoas e bens", adiantou.
Kobus Marais sublinhou que Pretória "deve estar muito ciente dos possíveis danos e riscos que as indesejáveis células relacionadas ao ISIS na RSA podem ter" para os sul-africanos, bem como "para o futuro político e económico" da África do Sul.
"Isso deve incluir tecnologia cibernética e de satélite com capacidade de vigilância e reconhecimento 24 horas por dia, sete dias por semana", referiu à Lusa.
O Instituto de Estudos de Segurança (ISS) da África do Sul também defendeu na quinta-feira (13.08) uma intervenção "urgente" da SADC e da União Africana, presidida pela África do Sul, para travar o conflito armado na província de Cabo Delgado, norte de Moçambique.
"Cabo Delgado também é Moçambique"
02:10
Para que serve a SADC?
A SADC é uma organização integrada por 16 Estados-membros e foi estabelecida em 1980, como Conferência de Coordenação do Desenvolvimento da África Austral (SADCC) e, mais tarde, em agosto de 1992, transformada em Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC).
A organização visa promover o crescimento e desenvolvimento socioeconómico da região com o objetivo de assumir "um papel mais competitivo e efetivo nas relações internacionais e na economia mundial".
África do Sul, Angola, Botsuana, Comores, República Democrática do Congo, Essuatíni, Lesoto, Madagáscar, Maláui, Ilhas Maurícias, Moçambique, Namíbia, Seicheles, Tanzânia, Zâmbia e Zimbabué são os Estados-membros da SADC.
As reuniões técnicas da 40ª cimeira da organização arrancaram na última segunda-feira (10.08), com o encontro do Comité Permanente de Altos Funcionários da SADC e encerraram na sexta-feira, com a cimeira da 'troika' que gere a organização.
A atual 'troika' da SADC é constituída por John Magufuli, Presidente da Tanzânia, como atual presidente em exercício da SADC, pelo seu antecessor, Hage G. Geingob, chefe de Estado da Namíbia, e por Filipe Nyusi, na qualidade de novo presidente da comunidade regional.
Moçambique acolheu pela última vez uma cimeira da SADC em 2012, sob a presidência do antigo chefe de Estado Armando Guebuza.
As cerimónias de abertura e encerramento da cimeira serão transmitidas em direto pela Televisão de Moçambique (TVM).
Cabo Delgado: Datas marcantes dos ataques armados
Começaram em outubro de 2017 em Mocímboa da Praia e já se alastraram a outros três distritos moçambicanos. Os ataques armados na província de Cabo Delgado, que somam já mais de 130 mortos, ainda não têm solução à vista.
Foto: DW/G. Sousa
Outubro de 2017
Os primeiros ataques de grupos armados desconhecidos na província de Cabo Delgado aconteceram no dia 5 de outubro de 2017 e tiveram como alvo três postos da polícia na vila de Mocímboa da Praia. Cinco pessoas morreram. Cerca de um mês depois, a 17 de novembro, as autoridades dão ordem de encerramento a algumas mesquitas por se suspeitar terem sido frequentadas por membros do grupo armado.
Foto: Privat
Dezembro de 2017
Surgem novos relatos de ataques nas aldeias de Mitumbate e Makulo, em Mocímboa da Praia. Na primeira semana de dezembro de 2017, terão sido assassinadas duas pessoas. Vários suspeitos foram identificados, tendo os moradores dado conta que os atacantes deram sinais de afiliação muçulmana. Por sua vez, a polícia desmentiu o envolvimento do grupo terrorista Al-Shabaab nestes ataques.
Foto: DW/G. Sousa
Janeiro a maio de 2018
Apesar de ter começado calmo, 2018 revelar-se-ia um ano de terror na província de Cabo Delgado com os ataques a alastrarem-se a mais distritos. Dada a gravidade da situação, a Assembleia da República aprovou, a 2 de maio, a Lei de Combate ao Terrorismo. Mas, no final do mês, dia 27, novos ataques foram realizados junto a Olumbi, distrito de Palma. Dez pessoas morreram, algumas decapitadas.
Foto: Privat
2 de junho de 2018
Dias mais tarde, a televisão STV dava conta que as forças de segurança moçambicanas haviam abatido, nas matas de Cabo Delgado, oito suspeitos de participação nos ataques. Foram ainda apreendidas catanas e uma metralhadora AK-47, além de comida e um passaporte tanzaniano. Por esta altura, já milhares de pessoas haviam abandonado as suas casas, temendo a repetição dos episódios de terror.
Foto: Borges Nhamire
4 de junho de 2018
Ainda se "festejava" os avanços na investigação das autoridades, e consequente abate dos suspeitos quando, a 4 e 7 de junho, se registaram novos incêndios nas aldeias de Naunde e Namaluco. Sete pessoas morreram e quatro ficaram feridas. Foram ainda destruídas 164 casas e quatro viaturas. O mesmo cenário voltou a repetir-se a 22 de junho: um novo ataque na aldeia de Maganja matou cinco pessoas.
Foto: Privat
29 de junho de 2018
Fortemente criticado por não se ter ainda pronunciado acerca dos ataques, o Presidente moçambicano Filipe Nyusi resolve fazê-lo, em Palma, perante um mar de gente. Oito meses e 33 mortos [25 vítimas dos ataques e oito supostos atacantes] depois... Em Cabo Delgado, Nyusi prometeu proteção aos cidadãos e convidou os atacantes a dialogar consigo, de forma a resolver as suas "insatisfações".
Foto: privat
Agosto de 2018
Depois de, em julho, um novo ataque à aldeia de Macanca - Nhica do Rovuma, em Palma, ter feito mais quatro mortos, Filipe Nyusi desafiou, a 16 de agosto, os oficiais promovidos no exército, por indicação da RENAMO, a usarem a sua experiência no combate contra estes grupos armados que, mais tarde, a 24 do mesmo mês, tirariam a vida a mais duas pessoas, na aldeia de Cobre, distrito de Macomia.
Foto: Jinty Jackson/AFP/Getty Images
Setembro de 2018
Setembro de 2018 voltava a ser um mês negro no norte de Moçambique. Ataques nas aldeias de Mocímboa da Praia, Ntoni e Ilala, em Macomia, deixaram pelo menos 15 mortos e dezenas de casas destruídas. No final do mês, o ministro da Defesa, Atanásio Mtumuke, afirmou que os homens armados responsáveis pelos ataques seriam "jovens expulsos de casa pelos pais".
Foto: Privat
Outubro de 2018
Um ano após o início dos ataques em Cabo Delgado, a polícia informou que os mais de 40 ataques ocorridos, haviam feito 90 mortos, 67 feridos e destruído milhares de casas. Foi também por esta altura que Filipe Nyusi anunciou a detenção de um cidadão estrangeiro suspeito de recrutar jovens para atacar as aldeias. No final do mês, começaram a ser julgados 180 suspeitos de envolvimento nos ataques.
Foto: privat
Novembro de 2018
Novos relatos de mortes macabras surgem na imprensa. Seis pessoas foram encontradas mortas com sinais de agressão com catana na aldeia de Pundanhar, em Palma. Dias depois, o cenário repetiu-se nas aldeias de Chicuaia Velha, Lukwamba e Litingina, distrito de Nangade. Balanço: 11 mortos. Em Pemba, o embaixador da União Europeia oferecia ajuda ao país.
Foto: Privat
6 de dezembro de 2018
A população do distrito de Nangade terá feito justiça pelas próprias mãos e morto três homens envolvidos nos ataques. Na altura, à DW, David Machimbuko, administrador do distrito de Palma, deu conta que "depois de um ataque, a população insurgiu-se e acabou por atingir alguns deles". Entretanto, o Ministério Público juntou mais nomes à lista dos arguidos neste caso. Entre eles está Andre Hanekom.
Foto: DW/N. Issufo
16 de dezembro de 2018
A 16 de dezembro, e após mais um ataque armado no distrito de Palma, que matou seis pessoas, entre as quais uma criança, Moçambique e Tanzânia anunciaram uma união de esforços no combate aos crimes transfronteiriços. 2018 chegava assim ao fim sem uma solução à vista para os ataques que já haviam feito, pelo menos, 115 mortos. O julgamento dos já acusados de envolvimento nos ataques continua.
Foto: privat
Janeiro de 2019
O novo ano não começou da melhor forma. Sete pessoas morreram quando um grupo armado intercetou uma carrinha de caixa aberta que transportava passageiros entre Palma e Mpundanhar. Na semana seguinte, outras sete pessoas foram assassinadas a tiro no Posto Administrativo de Ulumbi. Um comerciante foi ainda decapitado em Maganja, distrito de Palma, no passado dia 20.