Seca no sul de Angola pode causar desastre humanitário
José Adalberto
2 de março de 2021
A situação das comunidades rurais no sul de Angola é grave e exige uma resposta urgente, alerta o padre Pio Wacussanga, que lamenta que o executivo tenha deixado a situação chegar a esta fase, apesar dos muitos alertas.
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A situação não é nova. Quase de forma cíclica, a região sul de Angola é afetada pela seca ou por inundações. Caso a chuva não caia nos próximos tempos, a região pode viver um desastre humanitário. O alerta é do prelado católico Pio Wacussanga, que acompanha o drama das comunidades da Huíla, Cunene, Namibe e Cuando Cubango.
O missionário lamenta que o executivo tenha deixado as coisas chegarem a esta fase, porque há quase dez anos que a igreja e outros parceiros sociais vêm alertando as autoridades governamentais sobre a necessidade da criação de projetos sociais voltados para estas áreas e comunidades.
"Poderá sim, vir um grande desastre e há muito tempo, desde 2012, que estamos a alertar para isso. Temos muitas famílias a deixarem as suas zonas e a mudarem-se para lá onde podem buscar um apoio, por exemplo, pastores que estão a imigrar com manadas e rebanhos", conta o padre Wacussanga à DW.
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Envolvimento das comunidades "imprescindível"
A situação das comunidades rurais dos Gambos, na Huíla, Namibe, Cunene e Cuando Cubango é grave e exige uma resposta multisetorial e urgente, adverte. O padre Pio Wacussanga, que também é membro de direção da Associação Construindo Comunidades, considera imprescindível o envolvimento de todas áreas do saber na busca de soluções para os efeitos da seca.
"Era preciso fazerem-se levantamentos mais sérios, fazerem-se interações muito profundas, contactarem-se pessoas e grupos, convidarem-se agências internacionais especializadas neste tipo de desastres humanitários para se prevenir e se verem alternativas neste tipo de contingência", recomenda.
Simione Chiculo, representante da Ação Para o Desenvolvimento Rural e Ambiente (ADRA) para a Huíla e Cunene, também lembra que o fenómeno da seca não constitui uma novidade, quer para as comunidades quer para as autoridades governamentais, de quem, aliás, se esperava soluções definitivas.
"O que é preocupante para nós é o facto de que mesmo o fenómeno sendo conhecido, não existe por parte das estruturas governamentais e outros parceiros, mecanismos de resposta para criar resiliência nas famílias, no sentido do choque não ser tão forte como está acontecer agora", lamenta.
A título de exemplo das consequências da seca no país, dados avançados pelas autoridades governamentais apontam que, só no município dos Gambos, na província da Huila, mais de 90 mil famílias estão afetadas pela estiagem e pela fome. O mesmo se aplica a perto de vinte mil pessoas na província do Namibe, nos municípios do Tombwa e Virei.
Seca em África
Não chove, as colheitas são más, pouco há para comer, há quem consuma ervas para saciar a fome: É a pior seca das últimas décadas. 14 milhões de pessoas estão em perigo. Angola e Moçambique são dois dos países afetados.
Foto: Reuters/T. Negeri
À espera de água
Os jerricans estão vazios, não há água à vista. A Etiópia atravessa a pior seca das últimas três décadas, sem chover durante meses a fio. Segundo as Nações Unidas, mais de dez milhões de pessoas precisam urgentemente de assistência alimentar. Em breve, o número pode duplicar.
Foto: Reuters/T. Negeri
Sem fonte de sustento
Uma grande parte dos etíopes vive da agricultura e da criação de gado. Os animais são, muitas vezes, a fonte de sustento da família. "Vi as últimas gotas de chuva durante o Ramadão", conta um agricultor da região de Afar, no nordeste da Etiópia. O mês de jejum dos muçulmanos terminou em julho. "Desde essa altura, nunca mais choveu. Não há água, não há pasto. O nosso gado morreu".
Foto: Reuters/T. Negeri
Perigo para as crianças
Em 1984, mais de um milhão de pessoas morreu de fome na Etiópia. Pouco mais de três décadas depois, os etíopes voltam a correr perigo, sobretudo as crianças. Segundo o Governo etíope, mais de 400.000 rapazes e raparigas estão gravemente subnutridos e precisam de tratamento médico.
Foto: Reuters/T. Negeri
O El Niño
A colheita também foi magra no Zimbabué. Neste campo perto da capital, Harare, em vez de maçarocas de milho viçosas crescem apenas estes grãos secos. A seca foi agravada pelo El Niño. Noutros locais, o fenómeno meteorológico provocou chuvas fortes e inundações.
Foto: Reuters/P. Bulawayo
No limite
Esta vaca está no limite das suas forças, mal consegue manter-se em pé. Os agricultores de Masvingo, no centro do Zimbabué, tentam movê-la. Em 2015, choveu metade do que havia chovido no ano anterior. Os campos ficaram completamente secos.
Foto: Reuters/P. Bulawayo
Seca em Moçambique
"Lá no nosso bairro já perdi trinta e cinco cabeças", conta um criador de gado do distrito de Moamba, a 80 quilómetros da capital moçambicana, Maputo. Milhares de famílias estão em situação de insegurança alimentar. A seca afeta principalmente o sul do país. O norte e centro têm sido fustigados por chuvas intensas.
Foto: DW/R. da Silva
Ervas para combater a fome
A província do Cunene, no sul de Angola, também tem sido afetada pela seca. À falta de outros alimentos, há populares que comem ervas para saciar a fome: "Muitos morreram, não há comida. Mas, depois, estas ervas causam diarreia", contou um morador do município do Curoca.
Foto: DW/A.Vieira
Rio seco
Seria impossível estar aqui, não fosse a seca. O rio Black Umfolozi, a nordeste da cidade sul-africana de Durban, ficou sem água à superfície. Só cavando os habitantes conseguem obter o líquido vital.
Foto: Reuters/R. Ward
Seca inflaciona os preços
O Malawi também atravessa um período de seca. E isso reflete-se aqui neste mercado perto da capital, Lilongwe. Os preços de produtos básicos como o milho aumentaram bastante, porque a colheita foi má e é necessário importá-los. Muitas vezes, os habitantes mal conseguem pagar os alimentos que precisam para sobreviver.