Duas questões dominam a viagem do Secretário de Estado norte-americano Antony Blinken a África: A guerra na Ucrânia e a paz que tarda no leste do Congo. Washington vai também exigir mais apoio aos aliados africanos.
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Na sua segunda viagem oficial a África desde que tomou posse, no ano passado, como secretário de Estado norte-americano, Antony Blinken visita, a partir de domingo (07.08) e durante cinco dias, três países cuidadosamente selecionados em conformidade com as prioridades de Washington. O chefe da diplomacia americana chega à África do Sul no domingo; segue depois para a República Democrática do Congo e o vizinho Ruanda.
Em tempos de crescente tensão geopolítica, Blinken procura reforçar os laços com tradicionais aliados do seu país. Para o analista político sul-africano Daniel Silke, esta visita é mais um exemplo para guerra diplomática global em curso em África entre a Rússia, os Estados Unidos e a China.
"As três grandes potências competem pela atenção de África, tanto do ponto de vista político-diplomático como em termos de exportação de matérias-primas", disse Silke à DW.
Expandir a influência em África
Imediatamente antes de Blinken estiveram em visita oficial a várias nações africanas o Ministro dos Negócios Estrangeiros russo Sergei Lavrov e o Presidente francês Emmanuel Macron. Tal como Blinken, o seu objetivo foi alargar a influência no continente africano.
A decisão do Presidente dos EUA Joe Biden de enviar o seu Secretário de Estado aos países em questão mostra que está ciente que a política africana de Washington pode não estar no bom rumo.
Os três países são antigos aliados dos Estados Unidos. Mas, em março, a África do Sul absteve-se de votar uma resolução das Nações Unidas exigindo a retirada imediata das tropas russas da Ucrânia. Segundo o analista Silke, Pretoria envia mensagens "muito contraditórias" que fazem o Governo liderado pelo Congresso Nacional Africano (ANC) "parecer um fraco aliado dos EUA, e até mesmo da República Democrática do Congo e do Ruanda".
A África do Sul sob pressão
Blinken não deixará de pressionar a África do Sul a assumir uma posição mais crítica, especialmente face à guerra de agressão da Rússia na Ucrânia e à subida de tom da China em relação a Taiwan.
A visita insere-se numa nova estratégia do governo dos EUA a ser preparada há um ano e que será desvendada por Blinken na África do Sul, afirmou à DW Alex Vines, chefe do programa africano no centro de pesquisa londrino Chatham House. "Esta estratégia visa concentrar melhor os esforços do Governo dos EUA em África, incluindo a forma de conter a China e a Rússia no continente", disse Vines.
Segundo o Departamento de Estado em Washington, a viagem de Blinken vai focar uma série de questões urgentes, como o reforço da cooperação na saúde, o combate à criminalidade, comércio, investimento e energia, mas também a segurança alimentar.
Muitos países do mundo estão a sofrer consequências negativas pela quebra de fornecimento de cereais da Ucrânia em guerra. As Nações Unidas alertam para a possibilidade da pior crise da fome em África em décadas. A representante dos EUA nas Nações Unidas, Linda Thomas-Greenfield, encontra-se em périplo pelo Gana, Uganda e Cabo Verde, para colher informações em primeira mão sobre a insegurança alimentar desencadeada pelo conflito europeu.
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A paz que não chega ao leste do Congo
Uma das questões centrais para Blinken em África é a situação de insegurança na República Democrática do Congo (RDC). "O principal objetivo da visita a Kinshasa e Kigali é abordar os recentes confrontos armados no leste do Congo e o ressurgimento do grupo armado M23", diz Vines.
O Governo de Washington está preocupado com a violência crescente desde 2021 e o resultante agravamento da tensão entre os seus dois aliados, RDC e Ruanda. Kinshasa acusa Kigali de apoiar as milícias M23 na província do Kivu Norte.
Em finais de julho, pelo menos cinco civis morreram após um titoteio protagonizado por soldados da missão de paz da ONU, MONUSCO. Vários capacetes azuis foram detidos por terem aberto o fogo contra civis, o que levou a protestos violentos em Goma.
"Não queremos a MONUSCO no Congo porque estão a matar os nossos compatriotas. Ao mesmo tempo estão no país grupos armados, inclusive do estrangeiro. Depois vem a MONUSCO e mata-nos a nós. Basta!", disse a Rebecca Kabuo, membro do movimento social, Lucha, à agência noticiosa Associated Press. O Governo de Kinshasa delibera se deve permitir a presença continuada de forças internacionaisde manutenção da paz no país.
Os Estados Unidos participam na MONUSCO, pelo que este poderá também ser um assunto durante a visita do chefe da diplomacia de Washington. Para além de reuniões com políticos em Kinshasa, Blinken vai também reunir-se com representantes da sociedade civil. A intenção, diz o seu ministério em comunicado, é ajudar a preparar o caminho para uma eleição presidencial pacífica e justa na RDC em 2023. Tendo em conta a violência persistente naquele país da África Central, o objetivo parece ainda muito longínquo.
China em África: maldição ou benção?
A China quer mudar a sua imagem: de país explorador das matérias-primas africanas, para agente de desenvolvimento. Fazemos uma viagem pela história das relações sino-africanas.
Foto: AFP/Getty Images
Parceiros igualitários?
A China leva estradas asfaltadas, grandes estádios de futebol e internet de banda larga para África. Ao mesmo tempo, pede ao continente petróleo e outras matéria-primas. A China já é o maior parceiro comercial de África. Até 2020, o país pretende duplicar o volume de negócios para 400 mil milhões de dólares. Os críticos temem que haja apenas um vencedor nestes negócios: a China.
Foto: Getty Images
TAZARA: o primeiro grande projeto
A cooperação sino-africana começou nos anos 50 e 60. Como sinal da fraternidade socialista, a China financiou a construção de uma linha ferroviária que transportava o cobre da Zâmbia para a cidade portuária da Tanzânia, Dar es Salaam. O projeto baseava-se na amizade inter-étnica e no trabalho solidário. A ferrovia chamda TAZARA " Tanzania-Zambia Railway" funciona até aos dias de hoje.
Foto: cc-by-sa-Jon Harald Søby
Chegaram para fazer negócios
Com a estratégia "Go Global", na década de 90, o Governo chinês muda a sua política para África, começando a apoiar empresas do próprio país a fazerem negócios com o continente. O objetivo: proteger os recursos naturais estratégicos e promover o desenvolvimento económico da China. Ou seja, ter África como um parceiro de negócios e mercado para os bens de consumo chineses.
Foto: AP
Críticas do Ocidente
Com a nova política, a China garante para si campos de petróleo e as minas de metais preciosos, não tendo medo de trabalhar com regimes autoritários e corruptos. O país não é bem visto na Europa e nos Estados Unidos. A China só estaria interessada na exploração de recursos naturais, mas não no bem das pessoas, é a crítica do Ocidente.
Foto: picture-alliance/Tong jiang
Infraestruturas como moeda de troca
A China também faz negócios com o Presidente do Sudão, Omar al-Bashir, procurado pelo Tribunal Penal Internacional por genocídio. O país está a tornar-se o mais importante investidor na indústria de petróleo sudanês. Além disso, a empresa chinesa de petróleo estatal financia a construção da barragem de Merowe, no norte do Sudão.
Foto: picture-alliance/dpa
Oferta de 150 milhões de euros à União Africana
As boas relações com a África são bem pagas pela China. Em 2012, o país financiou a construção da sede da União Africana, em Adis Abeba. "A China vai ajudar os países africanos a ampliar a sua força e independência", disse o chefe da delegação chinesa na cerimónia de abertura.
Foto: Imago
Líder do mercado de telecomunicações
Duas empresas chinesas dominam o mercado africano de telecomunicações: a ZTE e a Huawei. Foi a essas empresas que Governos de todo o continente fizeram as suas grandes encomendas. Na Etiópia, a Huawei e a ZTE constroem uma rede de 3G para todo o país por 1,7 mil milhões de dólares. Na Tanzânia, empresas chinesas instalaram cerca de 10 mil quilómetros de cabos de fibra ótica.
Foto: AFP/Getty Images
Concorrentes desagradáveis
As esperanças de melhores oportunidades em África não atraem apenas as grandes empresas, mas também milhares de cidadãos comuns chineses . Eles abrem pequenas lojas onde vendem produtos chineses baratos: utensílios de cozinha, jóias, dispositivos elétricos. "Muitos comerciantes africanos não estão satisfeitos com a nova concorrência", diz o economista queniano David Owiro.
Foto: DW/J. Jaki
À espera de novos postos de trabalho
Seja no comércio de retalho ou na construção de estradas "os africanos raramente lucram com investimentos chineses. As empresas trazem os seus próprios trabalhadores", diz Owiro. Agora, na África do Sul, onde a China acaba de inaugurar uma fábrica de camiões, isso pode mudar. O Governo sul-africano elogia o projeto como um marco para a industrialização africana e espera novos postos de trabalho.
Foto: Imago
De exportador a agente de desenvolvimento?
O primeiro-ministro chinês, Li Keqiang, ofereceu dois mil milhões de dólares para um fundo de desenvolvimento para África durante a sua visita ao primeiro-ministro da Etiópia, Hailemariam Desalegn, em maio de 2014. A liderança chinesa quer abrir um novo capítulo nas relações China-África, passando de país explorador das matérias-primas para agente de um desenvolvimento sustentável.
Foto: Reuters
Medo pela reputação
"A China teme pela sua reputação no mundo", diz Sun Yun do centro de pesquisa norte-americano "Brookings". As alegações nos média de que a China só estaria interessada nas matérias-primas de África levaram a esta mudança. O Governo publicou recentemente uma lista dos programas de ajuda ao desenvolvimento, que inclui 30 hospitais, 150 escolas, 105 projetos de energia e água renováveis.
Foto: AFP/Getty Images
O charme chinês
Para promover a sua missão em África, a China lançou uma grande campanha mediática. Os meios de comunicação do Governo para o estrangeiro focam claramente os negócios, África é retratada como o continente próspero. Algo que contrasta com décadas de cobertura negativa dos meios de comunicação ocidentais.