Ativista angolano Sedrick de Carvalho considera que pouco mudou em sete anos em Angola no que toca à liberdade de expressão. No livro "Prisão Política", autor narra momentos sobre a sua detenção no âmbito do caso "15+2".
Publicidade
O livro "Prisão Política", da autoria do jornalista e ativista Sedrick de Carvalho, já chegou às bancas em Angola. A obra relata os momentos vividos pelo autor enquanto esteve preso durante o processo dos "15+2", pelo qual ele e outros 16 ativistas foram acusados de "atos preparatórios para a prática de rebelião".
"O livro é todo ele um conjunto de evidências de como os direitos mais básicos são menosprezados e violados sistematicamente neste país. Foi assim que aconteceu connosco durante todo o processo", afirma.
"Leis elementares não foram cumpridas, até mesmo com pressão internacional. Mesmo assim, as autoridades não cumpriram", frisou.
"Durante todo o processo de prisão houve também momentos de permanente instigação, violação, tortura psicológica e até física", denuncia o autor.
O ativista lamenta que volvidos sete anos – e mesmo com um novo Presidente da República, João Lourenço, que prometeu mudanças – se continuem a registar violações sistemáticas de direitos, liberdades e garantias em Angola.
"Continuamos mal. Continuamos com as mesmas violações graves e reiteradas das liberdades mais básicas", assevera.
Protestos reprimidos
Angola continua a ser palco de repressões violentas contra manifestações por parte das autoridades. Um exemplo da perseguição política em curso é o julgamento sumário de mais de 20 ativistas por terem participado num protesto alegadamente não autorizado. Entre as pessoas detidas no dia 9 de abril estão Laurinda Gouveia, com um filho de apenas seis meses, e Rosa Conde, as duas únicas mulheres integrantes no caso "15+2".
À DW África, o ativista José Gomes "Hata" diz que em Angola há coisas que não mudam.
"Temos pessoas envolvidas naquele processo que estão aí a responder por situações muito idênticas. Não devemos intimidar-nos. Apesar das prisões, devemos continuar o nosso rumo em direção a uma Angola justa e próspera", considera.
José Gomes "Hata", que também integrava o grupo dos "15+2", diz que a prisão ensinou-lhe uma coisa: "O que me marcou foi a vontade de se doar por causa de todos nós, na luta pelos direitos humanos, pela democracia e pela liberdade de expressão".
As t-shirts do julgamento dos 15+2
O julgamento dos ativistas angolanos acusados de prepararem uma rebelião iniciou na segunda-feira (16.11). Ao mesmo tempo, começou um desfile de t-shirts de protesto, dentro e fora do tribunal. Veja as fotos do processo.
Foto: Reuters/H. Corarado
"Vai acontecer o que o José Eduardo decidir"
"Vai acontecer o que o José Eduardo decidir. Tudo aqui é um teatro", afirmou o ativista Luaty Beirão no primeiro dia do julgamento. Luaty e outros 16 ativistas são acusados de prepararem uma rebelião contra o Presidente José Eduardo dos Santos. Defensores dos direitos humanos dizem que o caso tem motivações políticas. Em protesto, um ativista escreveu na farda prisional: "Recluso do Zédu".
Foto: DW/P.B. Ndomba
Presunção da inocência
Outro ativista escreveu na farda prisional "in dubio pro reo [princípio da presunção da inocência]. Nenhuma ditadura impedirá o avanço de uma sociedade para sempre." Ele é um dos 15 jovens detidos desde junho. Até à detenção, os ativistas costumavam encontrar-se aos sábados; um dos tópicos dos debates semanais era o livro "Da Ditadura à Democracia", do académico norte-americano Gene Sharp.
Foto: picture-alliance/dpa/P. Juliao
Nova acusação por causa das t-shirts?
À acusação que os ativistas angolanos já enfrentam, de alegados atos preparatórios para uma rebelião, poderá agora somar-se uma outra: a do crime de danos, por escrever frases de intervenção na farda dos serviços prisionais. A informação foi avançada por David Mendes, um dos advogados dos jovens.
Foto: picture-alliance/dpa/P. Juliao
Mais t-shirts fora do tribunal
Fora do tribunal, um grupo de manifestantes jurou acompanhar o julgamento dos 15+2 até ao fim. Vestiram-se a rigor com t-shirts brancas de apoio ao sistema judicial angolano, com os dizeres "Justiça sem Pressão" - "Estamos aqui a favor da Justiça, visto que Angola é um Estado soberano e que os tribunais têm o seu papel, com o qual nós estamos solidários", disse um dos manifestantes.
Foto: DW/P. Borralho
#LiberdadeJa
Sem t-shirts feitas para a ocasião, mas com cartazes, houve ainda quem pedisse "liberdade já!" para os ativistas angolanos, no exterior da 14ª Secção do Tribunal Provincial de Luanda. Essas são também as palavras de ordem de uma campanha nas redes sociais pela libertação dos jovens a que se associaram músicos, escritores, ativistas e muitos outros cidadãos de dentro e fora de Angola.
Foto: Reuters/H. Corarado
Método n.º 159
Luaty Beirão (ao centro) é outro dos 15 jovens detidos desde junho. Ele cumpriu 36 dias de greve de fome em protesto contra o excesso de prisão preventiva dos ativistas. Com a greve de fome de Luaty, o caso ganhou proporções internacionais. Jejuns e greves de fome estão listados no livro "Da Ditadura à Democracia" como o método n.º 159 de "intervenção não violenta".
Foto: picture-alliance/dpa/P. Juliao
Sala de imprensa improvisada
O julgamento dos 15+2 é tido como um dos casos mais mediáticos da história de Angola. No entanto, os jornalistas ficam à porta. O tribunal autorizou-os a estar na sala de audiências para assistir às primeiras horas do julgamento, mas agora só poderão voltar a entrar na fase das alegações finais e na leitura do acórdão. Diplomatas estrangeiros também não puderam entrar.
Foto: DW/P.B. Ndomba
"Momento decisivo"
Estava previsto que o julgamento dos 15+2 terminasse esta sexta-feira, 20 de novembro, mas deverá prolongar-se. Segundo a organização de direitos humanos Human Rights Watch, este caso é um "momento decisivo" para o sistema judicial de Angola: "Os juízes angolanos devem demonstrar independência e não permitir que este julgamento seja manipulado como um instrumento para silenciar as vozes críticas."