"Sem colaboração teria sido impossível pilhagem de Angola"
Lusa
13 de abril de 2022
Rafael Marques responsabilizou hoje "cúmplices" estrangeiros pela pilhagem em Angola, criticando autoridades judiciais por se preocuparem em perseguir angolanos. Ativista cita Banco Espírito Santo Angola (BESA).
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O ativista angolano Rafael Marques responsabilizou hoje os "cúmplices" estrangeiros pela pilhagem em Angola, criticando as autoridades judiciais por só se preocuparem em perseguir angolanos, dando como exemplo o caso do Banco Espírito Santo Angola (BESA).
"As autoridades judiciais angolanas só se têm preocupado em perseguir angolanos, deixando de fora todos os estrangeiros, corruptores, corruptos, facilitadores, intermediários, etc., que foram e são autores ou cúmplices da corrupção", disse.
O jornalista e fundador do Ufolo - Centro de Estudos para a Boa Governação, falava hoje (13.04), em São Tomé e Príncipe, onde decorre um intercâmbio internacional sobre a governação e luta contra a corrupção.
"Temos de ser cristalinos: sem a colaboração estrangeira - das chamadas sociedades mais avançadas - não teria sido possível a pilhagem desenfreada em Angola", acusou.
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"Captura da classe dirigente"
Rafael Marques apontou Sam Pa, ex-patrão do China International Fund (CIF), e o brasileiro Valdomiro Minoru Dondo, ambos detentores de dupla cidadania angolana, como dois dos empresários estrangeiros que "funcionaram como verdadeiros polvos na captura da classe dirigente para o saque do país".
O ativista questionou a falta de empenho da justiça em rastrear as centenas de milhões de dólares e o vasto património adquirido em vários países pelo conglomerado ChinaSonangol, uma joint venture entre o CIF e a Sonangol com fundos do Estado angolano.
O brasileiro Valdomiro Minoru Dondo, por seu lado, tinha negócios transversais com uma longa lista dos principais membros da anterior nomenclatura, muitos dos quais estão a contas com a justiça, indicou.
Marques elencou outros casos, entre os quais o Banco Espírito Santo Angola (BESA), que ficaram de fora da alçada da justiça angolana.
"Em Portugal, é um caso submarino: permanece escondido debaixo do mar durante anos, e de vez em quando emerge. Não se entende bem por que motivo uma investigação iniciada em 2009, com sete acórdãos do Tribunal da Relação, envolvendo 14 juízes de tribunais superiores, ainda não tem uma solução em 2022", questionou.
"Nem sequer existe menção de processo"
O jornalista lembrou que foi ouvido em Lisboa há 12 anos, inicialmente como suspeito, por ter denunciado os esquemas de corrupção do BES Portugal em Angola, "quando este banco era intocável" e salientou que "em Angola, nem sequer existe menção de um processo"
"A existir, estará sempre submerso", acrescentou, lamentando que a rede da justiça não seja lançada para todos.
"Não se pode entregar as investigações de casos fundamentais para Angola, ocorridos em território nacional, apenas a Portugal e para benefício exclusivo deste país. A soberania judicial tem de ser efetivada nos dois sentidos, e não apenas na via da antiga metrópole", reforçou o diretor do site Maka Angola.
Rafael Marques abordou ainda o caso da Unitel, ligada à PT/Oi e da Biocom ligada à brasileira Odebrecht, em que a "entidade estrangeira é simplesmente ignorada", apesar de haver provas de envolvimento em atos de corrupção.
"O combate efetivo à corrupção só terá sucesso quando abranger todos, nomeadamente os estrangeiros que funcionam como catalisadores e absorventes das fortunas desviadas", frisou Rafael Marques.
Mural da Cidadania imortaliza defensores dos direitos humanos em Angola
O Mural da Cidadania presta homenagem a defensores dos direitos humanos em Angola, uns vivos, outros já falecidos. Espaço no Mulemba Waxa Ngola, periferia de Luanda, chegou a ser vandalizado, mas já está como novo.
Foto: Manuel Luamba/DW
Rostos dos direitos humanos
O Mural da Cidadania é uma parede na periferia de Luanda onde se encontram desenhados alguns rostos de cidadãos, uns vivos e outros já falecidos, em gesto de homenagem aos defensores dos direitos humanos em Angola. Localizado no Mulemba Waxa Ngola, o espaço foi recentemente vandalizado por desconhecidos. Ativistas deslocaram-se, entretanto, ao local para proceder à limpeza do espaço.
Foto: Manuel Luamba/DW
Padre Pio Wakussanga
O padre católico Pio Wakussanga, responsável pela ONG Construindo Comunidades, é um dos rostos do Mural da Cidadania. Wakussanga é uma das vozes mais sonantes na luta contra a fome na região dos Gambos, na província da Huíla, onde a população é fortemente assolada pela fome e pela estiagem. Também tem estado a denunciar fazendeiros que desalojam camponeses na região.
Foto: Manuel Luamba/DW
José Patrocínio
Nasceu em dezembro de 1962 em Benguela e morreu em 2019, aos 57 anos. Fundador da ONG Omunga, José Patrocínio foi um dos mais conhecidos ativistas cívicos na luta pela proteção, promoção e divulgação dos direitos humanos em Angola. No dia da sua morte, a sociedade descreveu-o como um "grande combatente dos direitos humanos".
Foto: Manuel Luamba/DW
Carbono Casimiro
Dionísio Gonçalves Casimiro, também conhecido por "Boneira", foi um rapper e ativista angolano e um dos pioneiros e principais rostos das manifestações de rua que começaram em 2011, inspiradas na "Primavera Árabe", e que visavam lutar contra as más políticas públicas do Presidente José Eduardo dos Santos. Foi preso várias vezes pela polícia angolana. Morreu em 2019, vítima de doença.
Foto: Manuel Luamba/DW
Sizaltina Cutaia
É um dos principais rostos da luta pelos direitos das mulheres em Angola. A ativista é uma das mentoras da Ondjango Feminista e uma dos responsáveis da ONG Open Society. É conhecida pelas críticas contra a anterior e a atual governação. Comentadora do programa da Televisão Pública de Angola (TPA), Sizaltina Cutaia tem criticado os titulares de cargos públicos que desviaram fundos públicos.
Foto: Manuel Luamba/DW
Rafael Marques
O jornalista e ativista cívico angolano tornou-se conhecido pelas denúncias de corrupção no seu site Maka Angola, durante a governação do Presidente José Eduardo dos Santos. Foi muitas vezes levado às barras do tribunal. A entrada de Rafael Marques na lista de homenageados do Mural da Cidadania gerou controvérsia por, neste momento, estar supostamente mais próximo do atual governo.
Foto: Manuel Luamba/DW
Inocêncio de Matos
O estudante universitário Inocêncio de Matos foi morto pela polícia a 11 de novembro de 2020, em Luanda, quando participava, pela primeira vez, num protesto de rua. A sua morte gerou revolta popular e uma onda de indignação na sociedade. É descrito como um "herói do nosso tempo" pelos ativistas, que querem que a antiga Avenida Brasil, onde foi morto, seja baptizada com o seu nome.
Foto: Manuel Luamba/DW
Isaac Pedro "Zbi"
Isaac Pedro "Zbi" é um dos artistas que imortalizou no Mural da Cidadania os feitos de alguns defensores dos direitos humanos. Diz que o monumento da Mulemba Waxa Ngola tem três objetivos: "Valorizar o espaço", um dos poucos que há na periferia, "homenagear as pessoas" que se encontram aqui desenhadas e "tentar fazer perceber as pessoas o que é a arte urbana."
Foto: Manuel Luamba/DW
Hervey Madiba
Hervey Madiba é outro dos mentores da Mural da Cidadania, que foi recentemente vandalizado. O que se fez no espaço "é um exercício de cidadania", diz o co-fundador da Universidade de Hip Hop, que não entende os motivos e promete responsabilizar os autores. No domingo (10.01), começou a ser feita uma recolha de assinaturas para uma petição que será entregue ao Presidente João Lourenço.