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"Sempre que vires antissemitismo, atua imediatamente"

Christoph Strack
18 de janeiro de 2023

Dani Dayan, diretor do Memorial do Holocausto Yad Vashem em Israel, viaja à Alemanha pela primeira vez na vida. Falou à DW sobre as suas expetativas em relação à viagem e sobre a luta contra o antissemitismo.

Dani Dayan
Foto: Alex Kolomoisky/Yad Vashem

"O antissemitismo, infelizmente, está novamente a prosperar no mundo", diz Dani Dayan, de 67 anos, que dirige há um ano e meio o Yad Vashem, o memorial do Holocausto mais importante do mundo, localizado no Monte da Recordação, em Jerusalém.

Dayan diz que o ódio crescente aos judeus em todo o mundo é o que o leva a convidar todos os líderes mundiais a visitar o Yad Vashem: "Sempre que vires antissemitismo, atua imediatamente, não esperes. Se esperares, o antissemitismo vai metastizar em dimensões monstruosas e será impossível impedi-lo", afirmou Dayan em entrevista à jornalista da DW, Rebecca Ritters.

A 22 de janeiro, o diretor do Memorial do Holocausto visitará a Alemanha pela primeira vez na sua vida. Foi um longo percurso até aqui - e não só por Dayan ter nascido na Argentina, em 1955, e aí viver até que a sua família se mudou para Israel, em 1971.

Mais tarde, tornou-se num dos líderes políticos do movimento de colonos israelita na Cisjordânia ocupada. Dayan insiste que o seu passado político já não importa. Desde que foi nomeado como diretor do Yad Vashem, diz ter erguido "um muro de proteção" entre a política e ele próprio. Para ele, a sua missão atual é "sagrada".

Quando era jovem, Dayan prometeu que nunca iria à Alemanha, o país dos perpetradores do Holocausto. "Mas não tem nada a ver com ódio ou algo do género. Pelo contrário, é tudo uma questão de memória", diz. "É para respeitar os seis milhões de judeus que foram assassinados".

Os mitos nebulosos por trás do antissemitismo

13:07

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Inícios perigosos

Embora se assista a um aumento do antissemitismo nas ruas, Dayan sublinha as diferenças entre o mundo atual e os anos de 1930, quando o movimento nacional-socialista associado a Adolf Hitler ganhou força na Alemanha, resultando no assassinato em massa de judeus europeus.

A situação atual não é como naquela época, "estamos longe disso", diz Dayan. Mas contrariamente ao que acontecia há 80 anos, as pessoas hoje sabem o que se pode desenvolver a partir de inícios perigosos, refere.

Antes do Holocausto, as pessoas "provavelmente tiveram o privilégio de acreditar, a ingenuidade de acreditar, que podem queimar livros e podem queimar sinagogas, mas nunca queimariam seres humanos", diz Dayan. "Nós não temos esse privilégio". É por isso, conclui, que temos hoje tamanha responsabilidade de combater o antissemitismo, o racismo e a xenofobia.

Na Noite de Cristal, em novembro de 1938, foram destruídas sinagogas em toda a AlemanhaFoto: dpa/picture-alliance

Primeiro encontro no Yad Vashem

A visita de Dayan à Alemanha segue-se a um convite da presidente do Bundestag, o Parlamento alemão, Bärbel Bas, que visitou Israel em abril de 2022. Bas foi a primeira alta representante alemã a participar na cerimónia anual para recordar o Holocausto no Knesset, o Parlamento israelita, onde são lidos os nomes das vítimas. Também visitou o Yad Vashem, onde Dayan lhe apresentou um trabalho de investigação sobre uma judia de Duisburg, cidade natal de Bas. Irma Nathan foi assassinada pelos nazis em 1942.

Por sua vez, Bas convidou Dayan a inaugurar uma exposição no Bundestag, em Berlim, antes do Dia Internacional em Memória das Vítimas do Holocausto deste ano, a 27 de janeiro. Ambos falarão na abertura da exposição intitulada "Dezasseis Objetos - Setenta Anos do Yad Vashem", a 24 de janeiro, na Casa Paul Löbe, um dos edifícios do Parlamento.

A exposição inclui 16 objetos da coleção do Yad Vashem juntamente com testemunhos da vida quotidiana dos judeus que tiveram de deixar a Alemanha ou foram assassinados pelos nazis, incluindo brinquedos de crianças, uma Chanukiá (castiçal de nove braços, usado pelos judeus durante a Festa das Luzes), um diário e um piano. Dezasseis objetos de cada um dos 16 estados federados alemães, que recordam tanto a História como as histórias de vidas perdidas.

O Yad Vashem, fundado há quase 70 anos, em agosto de 1953, também utiliza esse tipo de objetos para manter viva a memória. O nome hebraico "Yad Vashem" é emprestado do livro do profeta Isaías na Bíblia e significa "um memorial e um nome".

"Alguns dos artefactos que temos aqui levar-vos-ão imediatamente às lágrimas assim que os virem, se forem seres humanos", diz Dayan.

Páginas com testemunhos de mais de quatro milhões de judeus vítimas do Holocausto estão preservadas no Yad VashemFoto: Nir Alon/ ZUMAPRESS.com/picture alliance

"Corrida contra o tempo"

O número de sobreviventes do Holocausto está a diminuir. Só algumas pessoas mais velhas conseguem ainda oferecer às gerações mais jovens os seus relatos em primeira mão, e Dayan já começa a pensar no que acontecerá quando os sobreviventes morrerem: "É evidente que o nosso trabalho será muito mais difícil, mas será também muito mais importante".

"Porque quando isso acontecer, estou convencido de que será uma boa hora para os negacionistas e os distorcionistas, que também já existem hoje. Eles vão prosperar. Essa é uma das razões pelas quais estamos numa corrida contra o tempo."

Dayan acrescenta que a cerimónia de recordação da Shoá (palavra em hebraico para Holocausto) é um instrumento muito poderoso na luta contra o antissemitismo.

"Não tentamos educar os antissemitas", afirma. "Tentamos educar as pessoas decentes do mundo - que creio serem a grande maioria - para se posicionarem contra o antissemitismo".

O diretor do Yad Vashem explica isto com dois exemplos, sobre duas celebridades norte-americanas que despertaram a atenção dos média com declarações controversas nos últimos meses.

Uma delas é o rapper Ye, mais conhecido como Kanye West, que fez várias declarações antijudaicas, recorrendo a estereótipos comuns. "Ele é claramente um antissemita", aponta Dayan. "Eu não traria Kanye West ao Yad Vashem porque é uma perda de tempo".

Pelo contrário, Dayan diz que convidaria a atriz Whoopi Goldberg, que descreveu a Shoá como um conflito entre dois grupos brancos que não tinha nada a ver com ódio racial.

"Isso é um disparate", diz o diretor do Yad Vashem. "Isso não é antissemitismo. É ignorância. Ela simplesmente não sabe que os nazis viam o povo judeu - seja isso certo ou errado - como uma raça. E não houve um conflito entre os judeus e os nazis, houve um massacre dos nazis contra os judeus".

A presidente do Bundestag, Bärbel Bas, visitou o Memorial do Holocausto Yad Vashem em abril de 2022Foto: Menahem Kahana/AFP

Reuniões de alto nível em Berlim

Na sua primeira viagem à Alemanha, Dayan ficará dois dias em Berlim. Além do encontro com a presidente do Bundestag, Bärbel Bas, está agendada uma reunião com o chefe de Estado alemão, Frank-Walter Steinmeier, e o chanceler Olaf Scholz, entre outros políticos, incluindo o ministro alemão das Finanças, Christian Lindner, líderes dos Verdes (Die Grüne) e o presidente da União Democrata-Cristã (CDU), Friedrich Merz, na oposição.

Dayan visitará também o Memorial aos Judeus Mortos da Europa, no centro de Berlim, e o Museu Judaico, bem como membros da comunidade judaica de Berlim.

À noite, após a inauguração da exposição, Dani Dayan viajará para Nova Iorque. O seu trabalho consiste em manter "acesa a chama da memória do Holocausto", diz.

"Como é que mantemos a Shoá algo isolado? Educamos, legislamos e aplicamos a lei para garantir que esse terrível acontecimento do século XX nunca mais volte a acontecer. Nem ao povo judeu, nem a qualquer outro povo".

Artigo originalmente escrito em alemão.

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