Para oposição, novas leis definiriam "perturbação grave da ordem pública" como um acto de terrorismo, asfixiando a dissidência.
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O Governo do Senegal diz que as leis, aprovadas pelo Parlamento do país na sexta-feira (25.06), destinam-se a reforçar a sua luta contra os grupos terroristas.
Mas uma cláusula define "perturbação grave da ordem pública" como um acto de terrorismo, uma medida que provocou fortes críticas por parte dos partidos da oposição.
De acordo com Moustapha Niasse, presidente da Assembleia Nacional senegalesa composta por 165 deputados, 70 legisladores votaram a favor dos dois novos projetos de lei relevantes na sexta-feira.
Onze votaram contra, acrescentou ele. Não é claro quantos legisladores estavam presentes para a votação, precedida de uma tensão crescente na câmara da assembleia, bem como nas ruas da capital Dakar.
Os deputados protagonizaram um animado debate na assembleia nacional, argumentando contra e a favor das medidas. Entretanto, o líder da oposição Ousmane Sonko e um deputado que apoia o Governo entraram em luta corporal na sala de entrada.
A aprovação de nova legislação antiterrorista surge em meio à incerteza sobre se o Presidente Macky Sall irá tentar um terceiro mandato controverso.
Os presidentes senegaleses estão limitados a dois mandatos consecutivos, mas alguns temem que Sall procure explorar as alterações constitucionais aprovadas num referendo de 2016 para voltar a concorrer em 2024.
Suprimir as manifestações
Os representantes do Movimento para a Defesa da Democracia (MDD), uma coligação da oposição, também disseram aos jornalistas que a legislação antiterrorista destina-se a suprimir as manifestações no caso de uma tentativa de terceiro mandato por Sall.
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No projeto de lei, o Governo argumenta que a actual legislação antiterrorista "não cobre totalmente certas questões" e aponta áreas, como o financiamento do terrorismo, nas quais a lei precisa de ser reforçada.
Defendendo a iniciativa na sexta-feira, o Ministro da Justiça Malick Sall disse à Assembleia Nacional que os deputados da oposição tinham compreendido mal as novas leis e que muito do que eles criticavam já estava contido na legislação anterior.
Aymerou Gningue, o presidente do bloco parlamentar aliado ao Presidente, disse à AFP que o terrorismo se tinha tornado mais complexo, dizendo que a nova lei foi concebida para combater o problema em "todas as suas formas".
Na noite de quinta-feira (24.06), o MDD tinha instado os apoiantes a manifestarem-se contra as novas leis.
"Este projeto de lei mata a nossa democracia porque acusará qualquer dissidente de terrorismo", disse Babacar Diop, um líder do MDD, numa conferência de imprensa.
As autoridades senegalesas registaram vários incidentes em manifestações na capital, Dakar, durante a apreciação pelos deputados de novas leis que pretendem fortalecer a luta contra o terrorismo, apelidadas por oposição e sociedade civil de "liberticidas".
As manifestações levaram as forças de segurança a colocarem veículos em vários pontos do centro da capital senegalesa, impedindo o acesso à sede da Assembleia. Com esta limitação, os manifestantes retiraram-se para a praça da Nação, no distrito de Colobane, segundo a agência de notícias France-Presse (AFP).
O ativista e crítico do Governo Guy Marius Sagna e pelo menos três membros do movimento civil "Y'en a marre" foram presos pela polícia, segundo a comunicação social local e imagens partilhadas em redes e plataformas sociais.
Casamança: Um conflito (quase) esquecido
A região de Casamança, no sul do Senegal, é um foco de conflito há 30 anos - embora oficialmente prevaleça a paz. Com uma nova operação militar, o Exército tem tomado medidas contra os refúgios dos grupos rebeldes.
Foto: John Wessels/AFP/Getty Images
Nova ofensiva do Exército
No início de fevereiro de 2021, soldados do Governo senegalês participaram numa operação para encontrar rebeldes em Casamança. A região no sudoeste do Senegal é palco de um conflito em ebulição desde os anos 80. Embora ultimamente a situação se mantenha relativamente calma, em janeiro deste ano o Governo lançou uma nova ofensiva contra os refúgios dos rebeldes.
Foto: John Wessels/AFP/Getty Images
Rebelião sangrenta
O círculo vicioso de violência começou em 1982, quando os líderes do Movimento das Forças Democráticas de Casamança (MFDC), que até então lutavam pacificamente pela independência da região, foram presos. Nos anos seguintes, o grupo radicalizou-se e, a partir de 1990, recebeu apoio militar vindo de território guineense. Também a vizinha Gâmbia é cada vez mais arrastada para o conflito.
Foto: John Wessels/AFP/Getty Images
Negociações falhadas
Houve várias tentativas de um cessar-fogo nos anos 90, que não duraram muito tempo, em parte porque o braço armado do MFDC continuou a fragmentar-se. Apesar de várias tentativas do fundador do MFDC, Augustin Diamacoune Senghore, para alcançar um acordo com o Governo do Senegal, só entre 1997 e 2001 centenas de pessoas foram mortas e milhares tiveram de fugir.
Foto: John Wessels/AFP/Getty Images
Momento histórico
Em abril de 2001, o então Presidente senegalês Abdoulaye Wade (à direita) viajou para Ziguinchor, em Casamança, um ano após a sua tomada de posse. O novo chefe de Estado queria negociar um caminho para a paz com o líder separatista Augustin Diamacoune Senghore (à esquerda), mas como o acordo contornava a questão da autonomia, volta a ser rejeitado pelos rebeldes.
Foto: Seyllou Diallo/AFP
Violência apesar do acordo de paz
Em 2004, o líder rebelde Augustin Diamacoune Senghore (à direita) e o ministro do Interior Ousmane Ngom (à esquerda) assinaram um tratado de paz duradouro. Embora o conflito político estivesse resolvido, alguns grupos de dissidentes do MFDC continuaram a lutar. E a violência em Casamança intensifica-se.
Foto: Seyllou/AFP/Getty Images
A paz torna-se uma questão eleitoral
Em 2012, o concorrente Macky Sall venceu as eleições presidenciais contra Abdoulaye Wade. Uma das suas promessas era trazer finalmente a paz a Casamança. Durante a campanha, Macky Sall enviou o popular músico senegalês Youssou Ndour a Casamança.
Foto: Seyllou/AFP/Getty Images
Violência latente
Apesar de todos os esforços de paz, a violência continuou nos anos seguintes. Mais recentemente, em 2018, 13 jovens foram mortos e vários ficaram feridos num massacre perto da capital regional de Ziguinchor. Até agora, muitas pessoas deslocadas não regressaram às suas casas por terem medo.
Foto: Seyllou/AFP/Getty Images
Quotidiano em Casamança
Apesar dos recorrentes surtos de violência, os habitantes de Ziguinchor, a principal cidade da região de Casamança, prosseguem a sua vida quotidiana. Com mais de 200.000 habitantes, Ziguinchor é o principal centro comercial de Casamança e uma base importante para o Exército senegalês.
Foto: John Wessels/AFP/Getty Images
Atrás dos rebeldes
Segundo informações oficiais, soldados do Exército já capturaram várias bases rebeldes, incluindo um bunker subterrâneo, durante a última operação militar que arrancou no início de fevereiro de 2021. Desta forma, o Governo espera acabar também com as atividades criminosas através das quais os grupos rebeldes se financiam.