Senegal: Parlamento aprova reforço dos poderes presidenciais
Lusa | rl
5 de maio de 2019
Lei, que prevê, entre outros, o fim do cargo de primeiro-ministro, foi aprovada com 124 votos a favor e apenas sete contra. Oposição fala em "recuo democrático". Macky Sall foi reeleito Presidente no final de fevereiro.
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Os deputados senegaleses aprovaram, este sábado (04.05), a revisão da Constituição que deve implicar a supressão do cargo de primeiro-ministro, uma iniciativa do poder denunciada pela oposição e a sociedade civil, dois meses após a reeleição do Presidente Macky Sall.
Após uma sessão de nove horas, por vezes agitada, 124 deputados votaram a favor e apenas sete contra, anunciou o presidente da Assembleia nacional, Moustapha Niasse. Um resultado que não surpreendeu, uma vez que o partido no poder dispõe de larga maioria no parlamento.
Esta revisão, que engloba 20 artigos da Constituição, estabelece um novo equilíbrio entre os poderes, ao reforçar o caráter presidencial do regime senegalês. Para além do fim do cargo de primeiro-ministro, previsto para breve, o presidente do parlamento também ficará impedido de dissolver o hemiciclo, que deixará de poder apresentar moções de censura para derrubar o governo.
Esta reforma não é "política", mas "apenas técnica e administrativa", e o "objetivo não consiste em reforçar os poderes do Presidente da República", assegurou perante os deputados o ministro da Justiça Malick Sal, confrontado com as críticas da oposição.
No poder desde 2012, e reeleito no final de fevereiro, Macky Sal prometeu acelerar as transformações da economia senegalesa e, através da supressão do posto de primeiro-ministro, pretende "manter-se em contacto direto com os níveis administrativos", segundo os seus serviços. "Trata-se apenas de suprimir um escalão intermediário entre o Presidente e os seus ministros", que "vão prestar contas diretamente", justificou o presidente da comissão das leis, Seydou Diouf, que pertence ao partido no poder.
"Recuo democrático", diz oposição
As principais forças da oposição opuseram-se à revisão constitucional. "É um recuo democrático. Não podemos concentrar todos os poderes numa única pessoa", declarou à agência noticiosa AFP Toussaint Manga, porta-voz do grupo Liberdade e democracia, formado por fiéis do ex-presidente Abdoulaye Wade. Toussaint Manga criticou ainda a "bulimia de poder" do Presidente Macky Sal e o seu desejo de "tudo controlar".
Detenções
Quatro figuras da sociedade civil que apelaram a protestos contra a revisão constitucional foram detidas pela polícia frente à Assembleia nacional, informou a AFP.
Diversos organismos da sociedade civil tinham apelado a manifestações frente à Assembleia, mas as forças da ordem bloquearam os acessos ao centro de Dakar, onde todas os protestos são proibidos desde 2011.
Madrassas do Senegal: um perigo para as crianças
No Senegal, famílias de todo o país enviam os seus filhos para escolas corânicas, onde eles não só aprendem o Corão, como também são forçados a mendigar nas ruas, supostamente para aprenderem a ser modestos.
Foto: Reuters/Z. Bensemra
Dentro da madrassa
Omar Wone, de oito anos, está sentado no chão da "daara" - uma escola corânica no Senegal. Wone é uma das dezenas de milhares de crianças talibé que continuam a ser obrigadas a pedir nas ruas, à mercê das regras das escolas corânicas tradicionais.
Foto: Reuters/Z. Bensemra
Dependentes dos "marabus"
Um estudante do Corão mendiga em frente a um hotel na cidade de Saint-Louis, no Senegal. Algumas organizações de direitos humanos denunciam que os estudantes - conhecidos como talibés - costumam viver em condições precárias. Os alunos dizem que os professores, os "marabus", os obrigam a pedir esmola, sendo espancados se não regressarem com dinheiro suficiente. Face a isto, algumas crianças fogem.
Foto: Reuters/Z. Bensemra
Dinheiro ou abuso?
"Eu não posso ver os meus pais até terminar de aprender o Corão", diz Suleiman, de 10 anos. "Tenho que trazer de volta 200 francos (30 cêntimos de euro) por dia para o marabu [professor corânico], caso contrário vou ser espancado. Muitas vezes eu não consigo esse dinheiro". Não há medidas de proteção em vigor para as crianças que fogem e acabam nas ruas.
Foto: Reuters/Z. Bensemra
Sem escolha
Moussa - um estudante do Corão em Futa - carrega um balde de água para poder tomar banho numa organização que ajuda crianças de rua talibé. "Os meus pais sabem que estou a mendigar para dar dinheiro ao marabuto, mas eles não fazem nada", diz ele. "Não gosto de pedir, mas sou forçado a isso. Sou espancado se não trouxer dinheiro de volta".
Foto: Reuters/Z. Bensemra
Quebrando um tabu
Os abusos aos talibé costumavam ser um tema tabu no Senegal. Mas, graças a campanhas de educação e debates sobre as condições nas escolas corânicas, o panorama está a mudar, ainda que lentamente. Já em 2016, o Presidente Macky Sall ordenou que as crianças fossem retiradas das ruas e prendeu os professores que os forçaram a mendigar. 300 crianças podem ter sido ajudadas por este programa em 2018.
Foto: Reuters/Z. Bensemra
Violado
Issa Kouyate, o fundador da associação de apoio às crianças "Maison de la Gare", está a chorar. Um estudante do Corão de oito anos acabou de lhe contar que foi vítima de violação. O aluno fugiu da escola e foi violado várias vezes durante a noite por um adolescente nas ruas. Kouyate resgatou-o. "Estes incidentes ainda são muito chocantes, mesmo que os vivenciemos dez ou quinze vezes", disse.
Foto: Reuters/Z. Bensemra
Infetado com sarna
El Hadj Diallou, um ex-talibé, trabalha agora como médico na "Maison de la Gare". Ele está a tratar um estudante infetado com sarna. Especialistas dizem que muitos pais não sabem que os seus filhos são violados em algumas madrassas. Muitas vezes mandam os filhos para as escolas, porque um diploma pode torná-los imãs ou professores do Corão.
Foto: Reuters/Z. Bensemra
Aulas de karaté
"Estou a aprender karaté para me defender", diz Demba, de 8 anos. Um professor obrigou-o a passar a noite inteira nas ruas para pedir dinheiro. Na manhã seguinte, ele foi roubado por um homem bêbedo. Na "Maison de la Gare", os talibés recebem comida, água e medicamentos. Além do karaté, podem aprender outros desportos e também língua inglesa.
Foto: Reuters/Z. Bensemra
Procurando comida no lixo
Ngorsek, de 13 anos, procura comida nos contentores da cidade de Saint-Louis. "Fugi da escola porque não aguentava mais. O 'marabu' maltratou-me e chegou a espancar-me". Segundo a organizaão de defesa dos direitos humanos Human Rights Watch, mais de 100.000 crianças no Senegal continuam a ser forçadas a mendigar pelas ruas.