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Lavrov visita África em tempos de isolamento diplomático

Abu-Bakarr Jalloh | Mikhail Bushuev | Benita van Eyssen
26 de julho de 2022

O chefe da diplomacia russa, Sergey Lavrov, está de visita a África desde domingo para reforçar os laços com o continente. A Rússia pretende enfrentar o Ocidente, construindo a sua reputação como "defensora de África".

Sergei Lavrov esteve hoje reunido com o Presidente do Uganda, Yoweri Museveni, em Entebbe
Sergei Lavrov esteve hoje reunido com o Presidente do Uganda, Yoweri Museveni, em EntebbeFoto: AFP

O ministro dos Negócios Estrangeiros da Rússia, Sergey Lavrov, está de visita a África esta semana, num itinerário que inclui o Egito, a República do Congo, o Uganda e a Etiópia.

Na segunda-feira (25.07), Lavrov encontrou-se com o Presidente do Congo, Denis Sassou N'guesso, e com o ministro dos Negócios Estrangeiros Jean-Claude Gakosso, na primeira visita ao país africano de um diplomata de topo da Rússia. No Egito, no domingo (24.07), Lavrov disse ao seu homólogo, Sameh Shoukry, que a Rússia iria satisfazer as encomendas de cereais.

Na sexta-feira passada (22.07), a Rússia e a Ucrânia assinaram um acordo com as Nações Unidas e a Turquia, para aliviar a crise alimentar global causada pelo bloqueio dos carregamentos de cereais no Mar Negro.

Muitos países africanos estão extremamente dependentes das importações de trigo e outros cereais da Rússia e da Ucrânia, mas o abastecimento tem sido muito perturbado pela guerra na Ucrânia, agravando assim o risco de fome.

Em junho, o presidente da União Africana (UA), Macky Sall, disse ao chefe de Estado russo, Vladimir Putin, que apesar de África estar longe do teatro de guerra, o povo africano é "vítima desta crise económica".

No entanto, é no domínio da segurança que a Rússia parece estar verdadeiramente a deixar a sua marca no continente africano.

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Apoio militar a África

A visita de Lavrov está a ser vista como uma tentativa de reunir o apoio de vários países africanos, muitos das quais têm fortes laços históricos com a Rússia, numa altura de forte condenação ocidental da guerra na Ucrânia.

Nos meses que antecederam a sua visita, a Rússia assinou vários acordos políticos e militares no continente.

No início de janeiro, centenas de conselheiros militares russos foram destacados para o Mali. Membros do controverso grupo militar russo Wagner foram convidados a "ajudar o Mali a treinar as suas forças de segurança", segundo o Exército maliano. Anteriormente, era esse o trabalho da Missão Europeia de Formação para o Mali (EUTM). 

No golpe de Estado de 2020 no Mali, o coronel Assimi Goita conseguiu tirar do poder o entretanto falecido Presidente Ibrahim Boubacar Keita. Mais tarde tomou posse como Presidente, após um segundo golpe em maio de 2021, que motivou depois sanções regionais e internacionais por atrasar as eleições presidenciais.

A junta militar no poder respondeu às sanções proibindo os aviões militares alemães no espaço aéreo do Mali, expulsando o embaixador da França, antiga potência colonial, e apelando à retirada imediata das forças dinamarquesas.

O vizinho Burkina Faso também testemunhou um golpe de Estado em janeiro. E tal como os seus vizinhos do Mali, os militares do Burkina ignoraram os apelos à entrega do poder a um governo civil. Também este país se tem orientado cada vez mais para Moscovo.

O ministro dos Negócios Estrangeiros russo, Sergey Lavrov, e o homólogo congolês, Jean-Claude Gakosso, numa conferência conjunta na residência do Presidente em OyoFoto: imago images

Formação estrangeira e golpes de Estado

Sudão, Chade, Guiné-Conacri e Guiné-Bissau também sofreram golpes ou tentativas de golpes de Estado no último ano. O que alguns destes países têm em comum é que parte dos soldados por detrás dos golpes receberam treino militar patrocinado pela Rússia.

"As qualidades que os tornam aptos para receber formação estrangeira são as mesmas que os tornam líderes golpistas eficazes", disse à DW no final de 2021 Judd Devermont, o diretor do Programa para África do Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais, com sede nos Estados Unidos da América (EUA).

Malick Diaw e Sadio Camara, os dois malianos que se acredita terem sido os principais arquitetos do golpe de 2020, passaram cerca de um ano na Escola Superior de Comando Militar de Moscovo. Estes soldados também participaram em missões de treino organizadas pelos EUA e pela União Europeia (UE).

O golpe no Mali foi "fortemente condenado" por Kelly Cahalan, do Comando Militar dos Estados Unidos em África (AFRICOM), que em declarações à DW classificou o ato como "inconsistente com o treino e educação militar dos EUA".

Sergey Lavrov foi recebido no domingo (22.07) pelo Presidente egípcio, Abdel Fattah el-Sissi, no CairoFoto: Egyptian Presidency/AP/picture alliance

Moscovo reaviva antigos laços soviéticos

De acordo com Irina Filatova, da Escola Superior de Economia de Moscovo, a Rússia pretende ganhar uma posição no continente como agente de segurança, a fim de "confrontar o Ocidente" e projetar a imagem de "defensora de África".

Está longe de ser a primeira vez que a Rússia se envolve em assuntos africanos. Na década de 1950, o Kremlin apoiou os movimentos de libertação em todo o continente. Na altura, a principal exportação da Rússia eram armas e munições.

A influência de Moscovo foi bem recebida por muitos. "Sem a posição firme da União Soviética durante a Guerra Fria e o auge da luta anti-colonial, muitos dos nossos países nunca teriam visto a luz da independência", disse à DW Obadiah Mailafia, antigo vice-governador do Banco Central da Nigéria.

Este apoio diminuiu após a dissolução da União Soviética, em 1991. Mas durante as duas últimas décadas, o atual Presidente russo, Vladimir Putin, tem tentado reavivar essas ligações.

"Agora que a Rússia se encontra numa posição bastante forte, África pode beneficiar de investimentos mutuamente benéficos e de cooperação comercial", afirma Mailafia.

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A Rússia tem permanecido oficialmente em silêncio sobre as suas políticas para África. Mas, no entender de Irina Filatova, Moscovo depende de empresas militares privadas como o grupo Wagner que agem como "abridores de portas".

"Oficialmente, [os grupos militares] não estão de modo algum incorporados na estratégia. Mas o que vemos é que eles surgem sempre primeiro quando há alguma instabilidade e depois ajudam a manter no poder os que construíram relações com a Rússia", disse à DW.

O grupo Wagner também está ativo na República Centro-Africana (RCA), onde tem sido acusado de graves violações dos direitos humanos. Antes, eram relativamente discretos nas operações de guerra no continente africano.

De volta aos negócios

Durante a maior parte das duas últimas décadas, Moscovo tem conseguido celebrar discretamente acordos nas áreas de energia nuclear e de exportação de armas.

A Rússia é atualmente o maior exportador de armas para o continente africano. De acordo com o relatório de 2020 do Instituto Internacional de Estudos para a paz de Estocolmo (SIPRI), as exportações de armas para África representaram 18% de todas as exportações de armas russas entre 2016 e 2020.

Para além dos serviços militares, Moscovo também conseguiu desenvolver um nicho de mercado que vende tecnologia nuclear a países em desenvolvimento. Zâmbia, Ruanda, Etiópia, Egito e Nigéria estão entre os países que procuram centrais nucleares construídas na Rússia.

Embora os detalhes das várias políticas e acordos continuem no segredo dos deuses, pelo menos uma coisa é clara: a Rússia está de volta a África - e isso significa negócios.

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