Simango: "FRELIMO devia usar inteligência" contra conflitos
João Carlos
29 de janeiro de 2020
Daviz Simango acha que não se pode ter medo de dizer que o "Acordo de Maputo teve insuficiências" e defende diálogo entre os interessados para resolver conflitos armados: "Mais inteligência do que ditadura do poder".
Publicidade
A Beira, capital da zona centro de Moçambique, não sofre diretamente com os conflitos armados e ataques engendrados por homens associados à autoproclamada junta militar da Resistência Nacional de Moçambique (RENAMO). Apesar disso, a tensão na região tem efeitos na capital de Sofala porque força a deslocação das comunidades.
O presidente do Concelho Autárquico da Beira, Daviz Simango, sustenta que Moçambique deve encontrar um caminho definitivo de paz e defende a integração e o diálogo com todas as partes do processo de estabilização do país. “Há um sentimento de que uma parte dos guerrilheiros não tiveram comunicação suficiente para compreender o processo", disse o edil em entrevista à DW África.
Simango acha que pessoas foram a razão central do Acordo de Maputo, que selou a paz em 6 de agosto de 2019, por isso elas deveriam ser centrais na resolução da tensão que se vive no país.
"Houve essa guerra civil, houve esses conflitos, porque existiam homens que estavam com armas em punho, e esses homens continuam lá e andam em desavenças com a direção do partido da oposição, neste caso da Renamo”, afirmou o líder do Movimento Democrático de Moçambique (MDM).
Aproximação para paz
Simango pede a aproximação entre a autoproclamada junta militar, a direção da RENAMO e o Governo, para que ninguém fique para trás neste processo de paz. Seguindo o líder do MDM, isso passa por compreender quais seriam "as necessidades profundas" dos integrantes do grupo dissidente da RENAMO.
O autarca reconhece que as declarações do Presidente Filipe Nyusi sinalizam que há esta vontade. E se for esse o entendimento, acrescenta, os moçambicanos aplaudirão as iniciativas que contribuam para a paz e a estabilidade.
Por outro lado, Daviz Simango alerta que é preciso distinguir o conflito interno da RENAMO, que compete ao partido da oposição resolver. Ele considera que a solução dos conflitos armados, porém, deve ser uma prioridade.
“Não podemos viver num país com conflito no centro e com conflito no norte. Isso cria um grande desgaste, cria grandes despesas. O saneamento financeiro que é gasto hoje para atender essas duas frentes militares podiam ser muito úteis para curar pessoas que têm problemas de saúde, [para construir] mais hospitais, mais escolas. Isso iria permitir que o país fosse mais sólido”, explica.
Concretamente em relação aos ataques terroristas sistemáticos ocorridos no norte de Moçambique, Simango diz que "é preciso investigar mais" a ação dos grupos fundamentalistas que atuam na região.
Simango: "FRELIMO devia usar inteligência" contra conflitos
Acordo insuficente
"A gente sabe que em Cabo Delgado há muitos recursos naturais. Havia muitos garimpeiros que deixaram de ser garimpeiros para [abraçar] outros interesses e que, eventualmente, tenham sido lesados. Há também a percepção de que pode haver fundamentalistas, mas isso acaba atingindo a parte norte do país e também vai gerando um conflito interregional com alguns países vizinhos" opina Simango
Para o líder do MDM, não se pode deixar perpetuar esta situação, por que tais grupos armados podem "ganhar raízes" e tornarem-se mais difíceis de serem "removidos".
O edil defendeu que a Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO) "devia usar mais a inteligência do que a ditadura do poder" para resolver estes conflitos. Porque, na sua opinião, as expetativas criadas com o Acordo de Maputo devem ser respeitadas e observadas.
“Não podemos ter medo de dizer que o Acordo de Maputo teve insuficiências nem podemos ter vergonha disso, mas a verdade é uma. O que saiu depois da assinatura é que essas pessoas acham-se não suficientemente acomodadas face às suas reivindicações”, completou Simango.
O edil aplaude os apoios externos dos parceiros de Moçambique, mas critica certas "contribuições armadas" que só levam a cultivar o ódio e a vingança.
Simango defende que o que o país precisa de cooperação técnica que ajude a encontrar os verdadeiros atores dos ataques na zona centro e norte, para se resolver de "uma forma firme" o clima de instabilidade ainda reinante.
Ciclone Idai causa mortes e destruição
Ciclone Idai faz mais de 200 mortos em Moçambique, no Zimbabué e no Malawi. Cerca de 90% da cidade moçambicana da Beira foi destruída com a passagem do ciclone Idai, segundo a Cruz Vermelha.
Foto: picture-alliance/AP/C. Haga
Ciclone Idai faz mais de 200 mortos
A passagem do ciclone Idai afetou mais de 1,5 milhões de pessoas em Moçambique, no Zimbabué e no Malawi, de acordo com a Organização das Nações Unidas (ONU). Mais de 200 pessoas morreram nos três países e milhares estão desalojadas. O levantamento do número de vítimas está por concluir, dado que há locais de difícil acesso devido à subida do nível dos rios.
Foto: picture-alliance/AP/C. Haga
Beira é a cidade mais atingida de Moçambique
Há pelo menos 84 mortos em Moçambique, segundo os últimos dados. Mas o Presidente Filipe Nyusi afirma que "tudo indica que poderemos registar mais de mil óbitos". A cidade da Beira foi a mais afetada. Os ventos e chuvas fortes deixaram a cidade parcialmente destruída, sem luz nem telecomunicações.
Foto: Getty Images/AFP/A. Barbier
Ciclone visto do espaço
Esta imagem de satélite feita pela NASA mostra a passagem do ciclone Idai pelos países africanos. "A situação é terrível, a magnitude da devastação é enorme", disse o líder da equipa de avaliação da Cruz Vermelha na Beira, Jamie LeSueur. "Enquanto o impacto físico do Idai começa a emergir, as consequências humanas ainda não estão claras", lê-se num comunicado.
Foto: NASA
Deslocados à procura de abrigo
Milhares de pessoas estão desalojadas na zona centro de Moçambique. O Presidente Filipe Nyusi, que sobrevoou a região, indicou que aldeias inteiras desapareceram nas enchentes e que há regiões totalmente incomunicáveis. "Vimos durante o voo corpos flutuando, um verdadeiro desastre humanitário de grandes proporções", assinalou o chefe de Estado.
Foto: DW/B. Chicotimba
Estrada de acesso à cidade da Beira fechada
Com as fortes chuvas, o nível dos rios subiu. Um deles, o rio Haluma, transbordou e cortou a estrada nacional 6, espinha dorsal do centro de Moçambique e única via de acesso à Beira. A cidade ficou isolada. Em entrevista à AFP, o ministro do Meio Ambiente de Moçambique, Celso Correia, afirmou que "este é o maior desastre natural ocorrido no país".
Foto: DW/A. Sebastião
Motoristas isolados na estrada
Isolados na estrada nacional 6, única via de acesso à Beira, moçambicanos aguardam até que a via seja desbloqueada. Formou-se uma longa fila de camiões e outros veículos. Os ventos fortes derrubaram postes.
Foto: DW/A. Sebastião
Noutras vias, mais destruição
A estrada número 260, que liga Chimoio a Mossurize, também não escapou à intempérie. A ponte sobre o rio Munhinga foi arrastada, isolando os dois distritos. Formaram-se enormes buracos nas rodovias, a isolar zonas de Moçambique e a dificultar o acesso às equipas de socorro.
Foto: DW/B. Chicotimba
A fúria das águas
A ponte sobre o rio Haluma, em Nhamatanda, zona central de Moçambique, ficou submersa. É mais uma zona afetada pelas cheias e pelo nível elevado dos rios. Uma camioneta que transportava dez pessoas foi arrastada ao passar pelo local. Seis pessoas morreram e quatro conseguiram salvar-se, penduradas em cima de um camião basculante.
Foto: DW/B. Chicotimba
População precisa de ajuda médica
Mais de cem salas de aulas ficaram destruídas nas regiões mais afectadas pelo ciclone e cheias nos distritos moçambicanos de Chinde, Maganja da Costa, Namacurra e Nicoadalá. Em visita à Zambézia, o Presidente Filipe Nyusi afirmou que, além de bens alimentares, a população necessita também, com prioridade, de assistência médica.
Foto: DW/M. Mueia
Ciclone Idai leva a cancelamento de voos
A passagem do fenómeno também afetou os transportes aéreos. O aeroporto da Beira ficou inoperante entre quinta-feira (14.03.) e domingo (17.03). Todos os voos domésticos foram suspensos. Dezenas de voos previstos para descolar do aeroporto internacional de Maputo, o maior de Moçambique, foram cancelados. O fecho dos aeroportos também dificultou a chegada de ajuda humanitária.
Foto: Getty Images/AFP/E. Josine
Depois de Moçambique, Zimbabué e Malawi
O ciclone Idai atingiu a Beira na quinta-feira (14.03), tendo seguido depois para oeste, em direção ao Zimbabué e ao Malawi, afetando mais milhares de pessoas, em particular nas zonas orientais da fronteira com Moçambique. Casas, escolas, empresas, hospitais e esquadras ficaram destruídas. Estradas e pontes desapareceram, o que dificulta os trabalhos de resgate.
Foto: picture-alliance/S. Jusa
Plantações devastadas pela força do ciclone
No Zimbabué, o número de mortos após a passagem do ciclone Idai chega a 82. O Presidente Emmerson Mnangagwa disse que a resposta do Governo está a ser coordenada pelo Departamento de Proteção Civil através dos comités de Proteção Civil nacional, provincial e de distrito, com o apoio de parceiros humanitários.
Foto: picture-alliance/S. Jusa
Ciclone Idai chega ao Malawi
Os distritos de Chikwawa e Nsanje, no Malawi, ficaram inundados com a passagem do ciclone Idai. Segundo o balanço mais recente do Departamento de Gestão de Riscos, no país foram registadas 56 mortes. Quase 1 milhão de pessoas foram afetadas pela passagem do ciclone. De acordo com a Federação Internacional da Cruz Vermelha, 80 mil viram as suas casas destruídas e estão sem onde se refugiar.
Foto: Getty Images/AFP/A. Gumulira
Cheias nos rios aumentam risco de doenças
A Organização Mundial da Saúde (OMS) já alertou as autoridades para a importância de se levar a cabo um levantamento dos estragos nos serviços de saúde, já que o agravamento das cheias nos próximos dias, devido à continuação de chuvas fortes, aumenta o risco do aparecimento de doenças transmissíveis pela água e pelo ar.