Novo relatório sobre gastos militares na África subsaariana
Kersten Knipp | ac | cvt
20 de novembro de 2018
De acordo com um estudo do Instituto Internacional de Investigação sobre a Paz de Estocolmo (SIPRI), a dificuldade em acessar aos números oficiais leva a uma subestimação geral dos gastos com a compra de armas.
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Nan Tian, um dos autores do estudo, explica: "Nos últimos três anos, nenhum país da África subsaariana divulgou os seus gastos no relatório da ONU sobre compras para o setor militar. E nos últimos 10 anos, apenas cinco países o fizeram. Constatamos que 45 dos 47 países da África subsaariana relataram seus gastos militares no seu próprio país através do Ministério das Finanças ou por meio de um site de pesquisa e transparência. A transparência é, portanto, pouca, mas há que admitir que é melhor do que se presumia", afirma ainda Nan Tian, pequisador do SIPRI.
Angola é dos países africanos que mais gastam em armamento
Outra ilação do novo estudo: os números disponíveis mostram que os gastos são comparativamente altos, sendo os mais elevados no Sudão, na África do Sul, em Angola e na Nigéria. Em média, os países da região gastam 1,7% do seu Produto Interno Bruto (PIB) em investimentos militares. Note-se que, segundo o Banco Mundial, há países industrializados que gastaram muito menos: a Alemanha, por exemplo, gastou 1,2% em armamentos em 2017.
No entanto, há que dizer que os gastos militares nos países subsaarianos oscilam fortemente devido, principalmente, ao declínio no preço dos recursos naturais e aos conflitos armados na região. A queda nos preços do petróleo - que afeta países como a Nigéria ou Angola - causou uma baixa acentuada nos gastos militares. No total, os países gastaram 3,2 mil milhões de dólares a menos em 2017 do que há três anos.
SIPRI apresenta novo relatório sobre gastos militares na África subsaariana
Por outro lado, os conflitos armados fizeram aumentar os gastos militares. Na luta contra os extremistas islâmicos, o Mali, que está a ser ameaçado por uma divisão interna, aumentou seus gastos em 152%, para 275 milhões de dólares, entre 2014 e 2017.
Os pesquisadores do SIPRI observaram também que os custos financeiros e humanos dos conflitos na região estão a aumentar constantemente.
Tendência para aumento de transparência deve continuar, recomenda SIPRI
Os cientistas ligam essa tendência à cultura política de cada Estado, diz Nan Tian, um dos autores do estudo: "Onde falta democracia os líderes têm menos incentivos para buscar a aprovação dos cidadãos. E, portanto, esforçam-se menos em questões como transparência na prestação de contas e responsabilidade. Desta forma, há mais espaço para os líderes desses países alocarem recursos de maneiras que provavelmente não favorecem o interesse das pessoas."
Como a competição pelo poder nem sempre é liderada por meios civis, esses regimes dependeriam de meios militares para controlar a população e garantir o poder, o que os leva a esconder as informações sobre seus gastos militares do público. No entanto, no seu estudo, o SIPRI chega a uma conclusão geral positiva: o ténue aumento da transparência marca um começo na direção do desenvolvimento democrático geral - desde que a tendência continue.
Gonçalo Mabunda: a arte pacífica das armas
O artista moçambicano Gonçalo Mabunda transforma armas em objetos de arte para promover a paz no país. Mabunda recolhe as armas usadas em 16 anos de guerra civil para criar máscaras e cadeiras.
Foto: R. da Silva
Artista universal
Gonçalo Mabunda começou a trabalhar no meio artístico da capital moçambicana, Maputo em 1992. Na altura colaborava no Núcleo de Arte como assistente de galeria. Hoje expõe a sua arte em todo o mundo, tendo passado com as suas obras por cidades como Tóquio, Londres e Düsseldorf. Por onde passo,: “as pessoas quando vêem estes trabalhos ficam curiosas" e entusiasmadas, conta.
Foto: R. da Silva
Tronos irónicos
A oficina está cheia de restos de espingardas, AK-47, rockets e cadeiras feitas com recurso a estes artefatos. No seu site online, Mabunda diz que os tronos - uma das suas imagens de marca - funcionam como atributos do poder, símbolos tribais e peças tradicionais de arte étnica africana. São ainda um comentário irónico à experiência de violência que viveu em criança na guerra civil moçambicana.
Foto: R. da Silva
Recolha de material
Em 1995, o Conselho Cristão de Moçambique lançou o projecto "Transformar Armas em Enxadas". O projeto continua a ser um dos fornecedores do material de que o artista precisa para criar as suas peças. Mas hoje em dia, contou Mabunda à DW África "também consigo comprar artefactos de guerra já destruídos" na sucata.
Foto: R. da Silva
Arte com assistência
Gonçalo Mabunda precisa de assistentes para completar as suas obras. O material bélico desativado exige um tratamento especial para poder ser trabalhado artisticamente. Mabundo orienta os seus ajudantes. Mas acrescenta que também troca ideias com eles, criando uma obra conjunta. Algo que, na sua opinião, os políticos também deviam fazer.
Foto: R. da Silva
A cara da guerra
O artista conta que muitas pessoas ficam impressionadas com a capacidade de transformar em arte positiva material usado para semear a morte e a miséria. Como ainda acontece em Moçambique hoje. Mabunda não poupa críticas aos governantes: "Estamos perante uma situação em que apenas um grupinho de pessoas é que decide sobre como é que queremos viver.”
Foto: R. da Silva
A cara da guerra
A situação de conflito que o país atravessa novamente preocupa o artista: “Foram 16 anos de guerra e 22 de paz. Quem nasceu em 1992 vivia em liberdade. E agora nem sei explicar como voltámos a esta situação.” Talvez por isso as máscaras que produz com o material de guerra tenham um ar mais assustado do que assustador.
Foto: R. da Silva
As armas falam de paz
As armas também podem falar de paz. Pelo menos aquelas que passaram pelas mãos de Mabunda. As máscaras que cria exprimem o horror da matança. O percurso de Mabunda passou pela África do Sul, mais precisamente Durban, graças à ajuda do artista sul-africano, Andreies Botha. Aos 18 anos, Mabunda teve a possibilidade de ali fazer um curso de metal e bronze, como contou ao semanário português Expresso.
Foto: R. da Silva
Reconhecimento internacional
Nascido em 1975, Mabunda trabalha como artista a tempo inteiro desde 1997. Optando por reciclar material bélico criou um estilo muito próprio, hoje reconhecido em todo o mundo. Sobreposta à arte está a mensagem de promoção da paz, num país em que as armas que falam da guerra ainda não se calaram.