Embaló é peça vital para o Senegal no conflito de Casamança?
Iancuba Dansó (Bissau)
12 de fevereiro de 2021
Bissau continua em silêncio sobre o seu alegado envolvimento no conflito entre o Exército senegalês e os independentistas do MFDC. Analistas guineenses pedem uma "maior neutralidade" no conflito que dura há décadas.
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Na capital da Guiné-Bissau, o conflito armado em Casamança é tema de debate.
Sabino Santos, editor do semanário "Última Hora", diz que o Executivo guineense não tem como fugir ao assunto.
"O Governo não tem nada de concreto que pode apresentar para provar aos guineenses de que não está metido no conflito do Senegal", afirma. O jornalista diz que, "nos últimos dias, fala-se mesmo no envolvimento dos militares guineenses". E isso, na sua opinião, "devia justificar o esclarecimento por parte do Governo da Guiné-Bissau".
No início do mês, os rebeldes de Casamança ameaçaram entrar na Guiné-Bissau caso sofressem ataques pelas tropas senegalesas a partir do território guineense, acusando as autoridades de Bissau de se terem aliado ao Senegal contra a região independentista.
Esta semana, o Exército senegalês anunciou ter capturado três bases dos independentistas contando com a colaboração da Guiné-Bissau, que teria cedido parte do seu território aos militares do país vizinho.
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O silêncio de Bissau
Apesar destas notícias, da parte do Executivo guineense, até agora não se ouviu uma única palavra sobre o assunto, embora se debata diariamente o tema nos órgãos de comunicação social do país.
A DW África contactou as autoridades guineenses, mas também não conseguiu obter um comentário sobre o assunto.
O Movimento das Forças Democráticas de Casamança (MFDC) luta há cerca de 40 anos pela independência daquela região sul do Senegal. Investigadores acreditam que "boa parte" dos guerrilheiros do MFDC tem raízes na Guiné-Bissau.
Em março de 2006, na era do então Presidente João Bernardo Vieira "Nino", os militares da Guiné-Bissau desencadearam uma operação, alegadamente para expulsar os independentistas do território guineense.
Sissoco, peça estratégica para o Senegal
Segundo o professor universitário e mestre em relações internacionais, Ismael Sanhá, o atual apoio do Senegal ao Presidente Umaro Sissoco Embaló é estratégico.
"Não foi por mero acaso que o Presidente Macky Sall [do Senegal] se empenhou para a eleição do general Umaro Sissoco Embaló, bem como de Adama Barow [da Gâmbia], para permitir, através deles, executar uma das estratégias da sua política interna", explica.
Mas o analista entende que "o Estado da Guiné-Bissau não devia ter alinhado com esta situação e devia manter a neutralidade", porque, segundo ele, "no dia em que o Senegal conseguir ter o controlo absoluto sobre essa região, vai sufocar as aspirações da Guiné-Bissau e impor a sua vontade".
Isso seria "nocivo para um país que vive em constantes sobressaltos", continua Sanhá.
"É por isso que a Guiné-Bissau sempre manteve a neutralidade no conflito de Casamança, por temer a hegemonia do Senegal", alerta.
O especialista prevê um conflito interminável: "O Senegal não vai conseguir os seus objetivos ao optar pelo conflito militar, ao invés do diálogo. O MFDC deixou de ser uma força homogénea e o Senegal vai enfrentar num confronto assimétrico".
Este é um dos mais antigos conflitos de África e já custou milhares de vidas humanas.
Casamança: Um conflito (quase) esquecido
A região de Casamança, no sul do Senegal, é um foco de conflito há 30 anos - embora oficialmente prevaleça a paz. Com uma nova operação militar, o Exército tem tomado medidas contra os refúgios dos grupos rebeldes.
Foto: John Wessels/AFP/Getty Images
Nova ofensiva do Exército
No início de fevereiro de 2021, soldados do Governo senegalês participaram numa operação para encontrar rebeldes em Casamança. A região no sudoeste do Senegal é palco de um conflito em ebulição desde os anos 80. Embora ultimamente a situação se mantenha relativamente calma, em janeiro deste ano o Governo lançou uma nova ofensiva contra os refúgios dos rebeldes.
Foto: John Wessels/AFP/Getty Images
Rebelião sangrenta
O círculo vicioso de violência começou em 1982, quando os líderes do Movimento das Forças Democráticas de Casamança (MFDC), que até então lutavam pacificamente pela independência da região, foram presos. Nos anos seguintes, o grupo radicalizou-se e, a partir de 1990, recebeu apoio militar vindo de território guineense. Também a vizinha Gâmbia é cada vez mais arrastada para o conflito.
Foto: John Wessels/AFP/Getty Images
Negociações falhadas
Houve várias tentativas de um cessar-fogo nos anos 90, que não duraram muito tempo, em parte porque o braço armado do MFDC continuou a fragmentar-se. Apesar de várias tentativas do fundador do MFDC, Augustin Diamacoune Senghore, para alcançar um acordo com o Governo do Senegal, só entre 1997 e 2001 centenas de pessoas foram mortas e milhares tiveram de fugir.
Foto: John Wessels/AFP/Getty Images
Momento histórico
Em abril de 2001, o então Presidente senegalês Abdoulaye Wade (à direita) viajou para Ziguinchor, em Casamança, um ano após a sua tomada de posse. O novo chefe de Estado queria negociar um caminho para a paz com o líder separatista Augustin Diamacoune Senghore (à esquerda), mas como o acordo contornava a questão da autonomia, volta a ser rejeitado pelos rebeldes.
Foto: Seyllou Diallo/AFP
Violência apesar do acordo de paz
Em 2004, o líder rebelde Augustin Diamacoune Senghore (à direita) e o ministro do Interior Ousmane Ngom (à esquerda) assinaram um tratado de paz duradouro. Embora o conflito político estivesse resolvido, alguns grupos de dissidentes do MFDC continuaram a lutar. E a violência em Casamança intensifica-se.
Foto: Seyllou/AFP/Getty Images
A paz torna-se uma questão eleitoral
Em 2012, o concorrente Macky Sall venceu as eleições presidenciais contra Abdoulaye Wade. Uma das suas promessas era trazer finalmente a paz a Casamança. Durante a campanha, Macky Sall enviou o popular músico senegalês Youssou Ndour a Casamança.
Foto: Seyllou/AFP/Getty Images
Violência latente
Apesar de todos os esforços de paz, a violência continuou nos anos seguintes. Mais recentemente, em 2018, 13 jovens foram mortos e vários ficaram feridos num massacre perto da capital regional de Ziguinchor. Até agora, muitas pessoas deslocadas não regressaram às suas casas por terem medo.
Foto: Seyllou/AFP/Getty Images
Quotidiano em Casamança
Apesar dos recorrentes surtos de violência, os habitantes de Ziguinchor, a principal cidade da região de Casamança, prosseguem a sua vida quotidiana. Com mais de 200.000 habitantes, Ziguinchor é o principal centro comercial de Casamança e uma base importante para o Exército senegalês.
Foto: John Wessels/AFP/Getty Images
Atrás dos rebeldes
Segundo informações oficiais, soldados do Exército já capturaram várias bases rebeldes, incluindo um bunker subterrâneo, durante a última operação militar que arrancou no início de fevereiro de 2021. Desta forma, o Governo espera acabar também com as atividades criminosas através das quais os grupos rebeldes se financiam.