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Sociedade civil angolana exige transparência à Justiça

António Cascais
15 de julho de 2020

A possível extradição do ex-secretário dos Assuntos Económicos Carlos Panzo para Angola, para responder a acusações de corrupção garantirá um processo isento?

Wirtschaft und Finanzen
Foto: picture-alliance/K. Ohlenschläger

Carlos Panzo, antigo secretário para os Assuntos Económicos do Presidente da República de Angola João Lourenço, foi hoje ouvido pela Audiência Nacional espanhola, que tem de decidir sobre a sua extradição para Luanda.

Panzo está a ser investigado na sequência de uma denúncia de corrupção. Alegadamente terá recebido comissões no valor total de onze milhões de dólares da empresa brasileira Odebrecht, através de uma conta bancária na Suíça.

O antigo membro do Governo angolano foi inicialmente detido em Espanha, em setembro do ano passado, a pedido da Procuradoria-Geral da República angolana. Em entrevista à DW o jurista angolano e presidente do observatório para a Coesão Social e Justiça, Zola Bambi, diz que há o risco de este e muitos outros processos por corrupção em Angola acabarem por prescrever.

O jurista e ativista Zola Bambi Foto: privat

DW África: A Justiça angolana está à altura de julgar este e tantos outros casos de corrupção em andamento?

Zola Bambi (ZB): A máquina judicial é realmente deficiente. Primeiro, pela sua inexperiência. Mas sobretudo porque todos quantos trabalham no sistema trabalham na continuação da política antiga. Não conseguiram responsabilizar-se devidamente, na medida de analisarem a sua imparcialidade. É neste contexto que podemos dizer: a politização e a dependência política ainda influem grandemente. E isto tem um foco negativo no processo que se está a levar a cabo relativamente às questões de corrupção. Porque a impunidade continua a ser um elemento que ainda vicia esse trabalho.

DW África: Acha que poderá haver perigo de prescrição neste e noutros casos?

ZB: Certamente, porque existem manobras que vão ser usadas de forma inteligente. Os advogados de defesa usarão todos os meios legais ao seu dispor para fazerem com que o tempo jogue em seu favor. E vão dar prioridade à arraia miúda. Mas muitos continuarão a gozar de impunidade, mesmo sendo indiciados.

DW África: Os advogados alegam que ele não pode ser julgado em Angola por um crime pelo qual ele já foi ilibado na Suíça. Por isso, argumentam, as autoridades espanholas não deviam extraditá-lo. O que diz a essa posição?

ZB: Esse posicionamento é próprio da defesa e é legítimo para quem defende o seu mandante. Quanto ao processo na Suíça devemos considerar se tudo o que se pode considerar crime foi visto lá, ou se foi só parte dos elementos.

DW África: Acha que a imagem do Presidente João Lourenço poderá ficar beliscada ou danificada, uma vez que nomeou Carlos Panzo logo após ser eleito, em 2016, para secretário para os Assuntos Económicos?

ZB: Não só poderá sair danificado, como já está danificado por apostar nessa pessoa. Agora, ao permitir que seja responsabilizado, embora sempre na situação do acusado beneficiar ainda da presunção da inocência, João Lourenço demonstra que está a tentar retificar aquilo que talvez tenha sido uma decisão precipitada, não refletida e menos estruturada no momento em que indicou ao posto Carlos Panzo.

DW África: O próprio Presidente chegou a dizer que a Direção Nacional de Prevenção e Combate à Corrupção, tem mais de 600 processos envolvendo maioritariamente gestores públicos e atores públicos suspeitos de praticarem atos de corrupção e peculato. Quantidade existe. Mas quantidade significa também qualidade?

ZB: Neste momento, não. O que está em causa no processo de corrupção é que é necessário criar todas as condições de trabalho possíveis para aqueles que estão a levar a cabo este processo. E que se faça o processo com transparência, rigor, neutralidade e que haja interesse em combater realmente a corrupção e não politizar o processo. 

 

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